Teresa Fonseca já não tem vagas para aceitar mais explicandos com dificuldades a Matemática. Também Maria Ribeiro está ocupada a ensinar Português das oito da manhã às 10 da noite. As duas professoras contaram à Lusa que, este ano, os seus horários ficaram completos “muito mais cedo” e têm “cada vez mais alunos em ‘online’”.
Não existem ainda dados nacionais sobre o impacto da pandemia na procura de explicações, mas estudos internacionais detetaram um crescimento e o investigador da Universidade de Aveiro, Alexandre Ventura, acredita que em Portugal não será diferente.
“Está a haver um acréscimo significativo. Todos os estudos internacionais, à exceção de um realizado na Austrália, apontam para um aumento da procura de explicações durante a pandemia para compensar o deficit de aprendizagens”, disse o investigador do Departamento de Educação e Psicologia da Universidade de Aveiro.
Para a Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap) este aumento “não é estranho” dadas as maiores dificuldades que alguns alunos sentiram com a "distância" do ensino”, contou o presidente da organização.
Segundo Jorge Ascensão, as explicações foram uma das soluções encontradas para tentar minorar as falhas das aulas à distãncia e os insuficientes apoios das escolas.
Nos últimos dois anos, em que mais de um milhão de alunos passou parte do tempo em ensino remoto, “faltaram condições para conseguir aprender em casa”: “Apesar de se conseguir, na maioria dos casos, estabelecer a ligação, em muitas situações não se estabeleceu a necessária conexão”, disse o presidente da Confap.
Nesta equação conta também o peso dos exames nacionais no acesso ao ensino superior, acrescentou Jorge Ascensão. A opinião é partilhada pela professora do Departamento de Psicologia e Educação da Universidade Portucalense, Andreia Gouveia.
A sua tese de doutoramento, realizada há cinco anos sobre o sucesso escolar tendo em conta apoios pedagógicos oferecidos pelas escolas e explicações privadas, revelou precisamente que nos anos de exames nacionais o recurso a explicações aumenta exponencialmente.
Em Portugal, mais de metade dos alunos do ensino secundário tem explicações, segundo um estudo de 2005, reforçado pelos dados do “O Estado da Educação 2016”, do Conselho Nacional de Educação.
Alexandre Ventura acrescentou que o mercado das explicações está em franco crescimento há vários anos.
No entanto, “não existem dados exatos”, sublinhou Andreia Gouveia, porque ao lado de um centro de explicações de porta aberta ou de um professor que declara a atividade ao fisco, há muitos outros a trabalhar na sombra.
Atualmente, há redes com centros de explicações espalhados por todo o país que competem com ‘sites’ onde se encontram milhares de docentes disponíveis para ensinar desde as tradicionais disciplinas de Matemática e Físico-Química a Japonês ou Ukelele.
Os recentes confinamentos levaram a que o “setor das explicações ‘online’ crescesse”, sublinhou Alexandre Ventura, que estuda este mercado há mais de uma década.
“Há explicadores que ajudam alunos de escolas de todo o país e até alguns que foram estudar para o estrangeiro”, acrescentou Andreia Gouveia.
Teresa Fonseca e Maria Ribeiro não têm jovens a estudar lá fora. Mas as duas explicadoras dizem ter agora mais alunos ‘online’. O negócio de bairro, que crescia através do “passa palavra”, transformou-se num serviço de âmbito nacional.
“Só tinha alunos de Lisboa, e a maioria vivia relativamente perto de minha casa. Agora tenho alunos desde o Porto ao Algarve”, disse Teresa Fonseca.
Estas professoras ensinam duas das disciplinas com maior procura. Além de Matemática e Português, Alexandre Ventura acrescenta ao lote Inglês e Físico-Química.
Alexandre Aventura lembra que o preço de uma explicação é muito variável, dependendo da notoriedade do professor, mas também do nível de abstração da disciplina.
“Se for um aluno a dar explicações pode pedir cinco euros, mas se for um professor universitário pode chegar aos 100 euros por hora”, disse, recordando que em Hong Kong já há verdadeiras “estrelas pop”, professores com cartazes espalhados na cidade que dão explicações em anfiteatros para centenas de alunos em simultâneo.
Mas, durante a pandemia, também surgiram projetos solidários como o “Nós ajudamos. Nós Explicamos”, em que alunos do 12.º ano e universitários apoiaram, de forma gratuita e ‘online’, cerca de 150 alunos do 1.º ano ao 9.º ano do ensino básico entre fevereiro e abril de 2021.