“Embora a senhora deputada Mariana Mortágua não tivesse declarado, no seu registo de interesses das XII.ª e XIII.ª Legislaturas, que exercia as atividades de colunista do JN e de comentadora da SIC, esta irregularidade foi sanada quando, no final da XIV.ª Legislatura, em março de 2022, declarou todas as atividades exercidas nos três anos anteriores ao mandato e a exercer em acumulação com o mandato de deputada, que estavam em falta", pode ler-se no parecer.
O documento, a que a agência Lusa teve acesso, foi redigido pela social-democrata Márcia Passos, na sequência do pedido de esclarecimentos do Tribunal Constitucional (TC) à Assembleia da República sobre as obrigações declarativas da deputada do BE Mariana Mortágua.
Em declarações aos jornalistas no final da reunião da Comissão da Transparência e Estatuto dos Deputados, que decorreu hoje no parlamento, à porta fechada, a presidente da comissão, a socialista Alexandra Leitão, explicou que o parecer foi aprovado por todos os partidos, à exceção do Chega, que optou pela abstenção.
“Nele se conclui que, um, as atividades de comentário televisivo e de colunista de jornal não traduzem nenhuma incompatibilidade nem nenhum impedimento com a função de deputado e, dois, que as obrigações declarativas foram cumpridas pela senhora deputada no final da XIV e da XV legislaturas, sanando a irregularidade ocorrida nas XII e XIII legislaturas”, referiu.
Segundo Alexandra Leitão, uma vez que a comissão tem um relatório de 13 fevereiro de 2020, “onde pela primeira vez se pronuncia expressamente pela circunstância de o comentário televisivo ser incompatível com a exclusividade e tendo-se apurado que antes disso houve vários casos de deputados que estiveram em exclusividade fazendo comentário sem que isso tivesse merecido reparo da comissão, considera-se que há uma alteração a partir daí”.
A presidente da comissão adiantou ainda que, relativamente ao período posterior a este relatório, Mariana Mortágua “repôs os abonos” que recebeu entre 01 de outubro de 2021 e 28 de fevereiro de 2022.
Alexandra Leitão afirmou que aquilo que se apurou foi que, antes do referido relatório, “situações análogas” à de Mariana Mortágua “não mereceram reparo” e que só a partir desse documento se adotou “essa interpretação mais restritiva”.
“É na sequência desse apuramento que o parecer é escrito. Não há aqui nem recuos nem avanços de nenhum partido”, enfatizou.
Assim, segundo a presidente da comissão, a alteração do parecer hoje aprovado em relação à versão inicial – que tinha sido noticiada por alguns órgãos de comunicação social – é feita devido a “factos posteriores que foram esse levantamento” de outros casos e não na “sequência de recuos ou avanços de ninguém”.
Também em declarações aos jornalistas, a deputada relatora Márcia Passos reiterou que não há qualquer recuo, mas sim “alguns avanços” que decorrem precisamente do levantamento que foi feito por parte dos serviços.
“Levantou-se a questão de saber qual era o entendimento anterior [ao relatório de fevereiro de 2020] porque a lei é a mesma, e, portanto, sendo a lei a mesma à partida estaríamos no mesmo panorama”, afirmou.
De acordo com a relatora do parecer, “desse levantamento resultaram factos novos e resultaram evidências de que antes de 13 de fevereiro de 2020 existiam vários deputados que estavam no regime de exclusividade, que tinham declarado que estavam no regime de exclusividade, e que ao mesmo tempo eram comentadores televisivos”, o que não “tinha merecido qualquer reparo por parte da comissão”.
“Isso naturalmente teria de ser vertido no parecer porque é um dado novo”, justificou, acrescentando que a análise comparativa permite “concluir que há duas formas de agir ou há dois entendimentos por parte da comissão da transparência, antes de 13 de fevereiro de 2020 e depois, e é isto que o parecer reflete”.
Em 08 de junho, Alexandra Leitão revelou que o Tribunal Constitucional (TC) pediu esclarecimentos à Assembleia da República sobre as obrigações declarativas da deputada do BE, confirmando igualmente que também tinha dado entrada um pedido de esclarecimento por parte do Ministério Público relativo à mesma parlamentar.
Há cerca de duas semanas, esta comissão adiou, após longa discussão, a votação deste parecer, que não foi tornado público.
No entanto, de acordo com a CNN e o jornal ‘online’ Observador, o projeto de parecer inicial da deputada do PSD admitia que Mariana Mortágua poderia ter de pagar retroativos ao parlamento, relativos ao período em que fez comentários na SIC entre 2015 e 2019, enquanto estava em exclusividade.