O fotógrafo americano Jackson Nichols passou mais de duas décadas a fotografar a vida da comunidade portuguesa na Califórnia, tendo já publicado um livro sobre touradas e outro sobre as festas do Espírito Santo.
Nichols tem neste momento uma exposição na PhotoCentral Gallery, em Hayward, com o título "A Fina Arte das Touradas Portuguesas Sem Sangue", mas cresceu sem qualquer ligação a Portugal.
O americano, de 66 anos, nasceu na Bay Area, perto de São Francisco, e trabalhou como designer gráfico. Começou a fotografar durante a universidade, em 1974, e descobriu a comunidade portuguesa anos mais tarde, através da sua mulher, que é neta de uma madeirense chegada à Califórnia em 1920.
"A minha esposa estava a tirar um mestrado em antropologia cultural. A sua tese era sobre identidade étnica através de rituais, focada na tradição e cultura dos luso-americanos, e na pesquisa citava as festas do Espírito Santo", disse Nichols à agencia Lusa.
No verão de 1980, a mulher pediu-lhe que fotografasse uma das festas da comunidade açoriana no Vale de São Joaquim, para ilustrar a sua tese.
"Achei fascinante. Foi como ir a Portugal durante uma tarde. Eram coloridas, cheias de tradição e iconografia, muito fotogénicas. As pessoas eram calorosas e acolhedoras. A experiência comunitária das sopas era algo que nunca tinha vivido", acrescenta.
Nichols viu nas festas "uma celebração da cultura portuguesa e da fé católica que, ao mesmo tempo, honra o patriotismo para com os EUA."
Depois de a mulher terminar a tese, Nichols continuou a frequentar e fotografar as festas, que acontecem todos os anos, um pouco por todo o estado, entre o final da primavera e o verão.
"Fui aperfeiçoando o meu conhecimento sobre a cultura e o evento. Fiz muitos amigos. Comecei a ser mais conhecido e de confiança. As minhas fotos são mais focadas nas pessoas do que nos eventos, por isso é importante. Não consigo explicar, mas sinto-me confortável na comunidade portuguesa. É parte da minha vida", diz.
Em 2009, o americano foi a 16 festas no norte da Califórnia para terminar um livro sobre o tema.
A obra foi publicada no mesmo ano, numa edição pessoal, com o título o livro "Holy Ghost: Portuguese Festas in the Spirit of Saint Isabel" (“Espirito Santo: Festas Portuguesas no Espírito de Santa Isabel”, em português).
Um dos objetivos da obra, diz Nichols, é preservar algo que está a desaparecer, com o fim da imigração portuguesa em massa para o estado.
"Tinha medo de que, com a evolução demográfica da Califórnia, a comunidade portuguesa acabasse por desaparecer e, com ela, estas festas. Queria documentá-las antes que acabassem", explica.
Nichols fotografou a sua primeira tourada em 2007, durante a celebração do dia de Nossa Senhora de Fátima na cidade de Thornton, que reúne todos os anos cerca de dez mil portugueses e luso-americanos.
"Não estava muito interessado na tourada, mas decidi ir de qualquer forma", lembra.
Uma vez no recinto, conheceu o fotógrafo José Enes, que o convidou a ir para a trincheira e fotografar consigo.
"Colocou-me mesmo no centro da ação. Quando o matador saiu e lutou contra o touro, emocionei-me quase até as lágrimas. Era como um lindo bailado. Fiquei viciado a partir desse momento", diz.
Uma das coisas que o surpreenderam foi que estas touradas não magoam o animal, uma vez que são usada bandarilhas com velcro e um tapete de velcro nas costas do touro, como é explicado na apresentação da exposição.
"As pessoas acham que as minhas fotografias de touradas são feitas em Espanha. Ficam chocadas quando lhes digo que foram feitas a uma hora de distância de São Francisco. A maioria não sabe da sua existência", garante.
Nos anos seguintes, o fotógrafo centrou o seu trabalho nos forcados.
"Primeiro, pensei que eram loucos. Não havia outra razão para fazer aquilo. Mas depois fotografei-os e entrevistei-os durante três anos", diz.
Esse trabalho foi publicado no seu segundo livro, com o título "Forcado", que foi lançado em 2012.
Para esta última exposição, Nichols expandiu o trabalho com dois novos livros: além de "Forcado", está também à venda "Matador" e "Cavaleiro".
Nichols continua a fotografar a preto e branco, como as suas referências Edward Weston e Ansell Adams, e em formato analógico, imprimindo todas as suas fotografias em casa.
O americano quer agora levar a exposição a outros locais e já tem uma ideia para um novo projeto: os ganadeiros do Vale Central da Califórnia.
"Sem eles, as touradas não existiam. Há uma história para contar ai. Quando falo com editoras, dizem-me sempre que é um ‘livro pequeno, sobre um tema obscuro’, mas para mim é uma história que vale a pena contar de qualquer forma", conclui.
C/ LUSA