“Isto é um processo surreal”, disse o vice-presidente da autarquia, Miguel Silva Gouveia, à agência Lusa, comentando assim as declarações da presidente da ARM, Nélia Sousa, de que esta empresa “nunca recebeu um euro” do município pelos serviços prestados na área da recolha e tratamento de resíduos.
O autarca explicou que “o que está em causa são os aumentos tarifários impostos pela ARM, sendo de 21% no fornecimento da água e passando de 23 para 79 euros por tonelada no caso dos resíduos”, o que representa um acréscimo de 3ME para 10ME (300%).
“O Funchal reclamou desses aumentos, que não fazem sentido e pediu em tribunal a sua impugnação, não reconhecendo o valor das tarifas”, disse.
O responsável assegurou que a autarquia “tem pago sempre o que reconheceu: os 24 cêntimos por metro cúbico de água e 23 euros por tonelada nos resíduos”, valores que vêm “desde 2014, no tempo de Miguel Albuquerque”, quando este presidia ao município do Funchal.
“Fomos reclamar [em tribunal] desse aumento porque teríamos de refletir esses montantes nos tarifários aos consumidores, mas não aumentámos nada”, sustentou.
Miguel Silva Gouveia salientou que existe neste processo “uma questão contabilística”, porque, no caso do fornecimento da água, a ARM tem emitido duas faturas (uma do valor reconhecido pela autarquia e outra com o valor contestado), mas foi “intransigente” para adotar o mesmo procedimento no que diz respeito aos resíduos.
Este pedido arrastou-se desde julho do ano passado, tendo a Câmara, em outubro, decidido, “para poder fazer a quitação, entregue os montantes ao tribunal, a título de consignação em depósito, dos valores que reconhece”.
“Contudo, o tribunal achou que não devia ficar com o dinheiro, reuniu as partes e chegámos a acordo (fevereiro de 2018): a CMF paga o que reconhece e a ARM passa a quitação desse valor”, adiantou.
O autarca realçou que mandou em março deste ano um ofício, solicitando que fossem passadas faturas em separado e a resposta da “ARM foi mandar para execução”.
O titular da pasta da Finanças do município funchalense salienta que “para fazer uma liquidação tem de ter documentos à luz da Lei das Finanças Locais”.
Se no caso da dívida da água a presidente da ARM reconheceu terem sido pagos mais de 10 milhões, no que se refere à dos resíduos a autarquia “vai pagar o que está no acordo”, assegurou.
“É completamente surreal acusar a CMF de não pagar nada, quando está em vias de ser pago com o trânsito em julgado do acordo em março, sendo preciso exarar os documentos para dar a quitação porque a ARM não quis passar as faturas em separado”, esclareceu.
Miguel Silva Gouveia censurou a ARM por ter “pegado num valor que o município não reconhecia e mandado para execução fiscal”, o que considera ser um “ultrapassar a autoridade dos tribunais”.
Recordou que o anterior presidente da câmara, Miguel Albuquerque, atual chefe do Governo Regional, “deixou uma dívida de 36 ME à ARM e esta empresa nunca o executou”.
No seu entender, utilizar a Autoridade Tributária (AT) para a execução de ”dívidas em contencioso é ilegítimo” e a situação passa para “um foro perigoso”.
“Se isto for por adiante, a AT substituir-se aos tribunais vou poder cobrar coercivamente as dívidas do Governo Regional (5ME de IRS) e à Empresa de Eletricidade da Madeira”, adiantou.
Miguel Silva Gouveia também sublinhou que se “porventura for dado provimento e a AT não recuar, a Câmara do Funchal corre o risco de ver as contas penhoradas em 15 ME”, o que “colocaria em risco todo o funcionamento da cidade”.
Concluiu que esta atitude representaria “uma leviandade grosseira” e seria “um ato de inconsciência do Governo Regional”, porque o seu presidente foi autarca durante 16 anos.
LUSA