Numa votação realizada na terça-feira, mas cujo resultado foi anunciado apenas hoje de manhã, na abertura do terceiro dia da sessão plenária que decorre em Bruxelas – dado o processo de contagem de votos à distância ser mais moroso -, o acordo foi aprovado com 660 votos a favor, cinco contra e 32 abstenções, encerrando-se assim o longo processo de ‘divórcio’ entre UE e Londres.
O Acordo de Comércio e Cooperação pós-‘Brexit’ negociado entre o Reino Unido e a UE foi concluído em 24 de dezembro de 2020 e começou a ser aplicado provisoriamente em 01 de janeiro, com um prazo até à próxima sexta-feira, 30 de abril, para permitir a conclusão da sua revisão jurídico-linguística e aprovação pelo Parlamento Europeu.
A votação no hemiciclo teve lugar depois de, em 15 de abril, as comissões dos Negócios Estrangeiros e do Comércio do PE terem votado a favor do acordo comercial e de cooperação pós-Brexit, abrindo caminho para sua ratificação final.
As comissões haviam suspendido a votação em março, em protesto contra as alterações britânicas nos acordos comerciais na Irlanda do Norte, que Bruxelas diz violarem os termos do Acordo de Saída do ‘Brexit’, tendo por isso aberto um processo de infração a Londres.
No debate celebrado no hemiciclo de Bruxelas na terça-feira imediatamente antes da votação, a presidência portuguesa do Conselho da UE defendeu que o pleno respeito do protocolo sobre a Irlanda do Norte é “fundamental” para a estabilidade das relações entre União Europeia e Reino Unido no pós-‘Brexit’.
Intervindo no debate em representação do Conselho, a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, congratulou-se por, ao fim de “um período muito intensivo de quatro anos”, ter finalmente chegado o momento da aprovação formal de um acordo que, na sua opinião, “protege os interesses europeus e assegura a concorrência leal, bem como a cooperação contínua em áreas de interesse mútuo”.
“Isto permitir-nos-á entrar numa nova fase nas nossas relações com o Reino Unido”, um “velho amigo e aliado”, já a partir de maio, disse.
Contudo, a secretária de Estado assumiu ser “evidente que ainda existem questões por resolver a nível da plena implementação do Acordo de Saída” e apontou que “a presidência portuguesa tem acompanhado de perto a situação na Irlanda do Norte” e está “muito preocupada com o ressurgimento da violência sectária nos últimos meses”.
“A UE deve continuar empenhada no Acordo de Sexta-Feira Santa e com o povo da Irlanda do Norte. A implementação do Protocolo sobre a Irlanda e Irlanda do Norte é um passo fundamental para trazer estabilidade às relações entre a UE e o Reino Unido. Este deve ser um esforço conjunto, sem espaço para ações unilaterais”, advertiu então Ana Paula Zacarias.
“A falta de cumprimento do Acordo de Saída por parte do Reino Unido não é de facto aceitável. Mas sabemos que a Comissão tomou medidas legais e políticas para levar o Reino Unido a cumprir plenamente o acordo. Apoiamos este esforço da Comissão”, disse, acrescentando que Portugal também partilha “a análise da Comissão” de que a entrada em vigor definitiva do Acordo de Comércio e Cooperação ajudará a UE a defender as disposições do mesmo.
Na sua intervenção, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, sublinhou precisamente que o acordo agora ratificado pela assembleia “tem verdadeiros dentes” legais para garantir a defesa do interesse europeu e preservar a integridade do mercado único.
“Deixem-me ser muito clara: nós não queremos utilizar estas ferramentas [legais], mas não hesitaremos em utilizá-las se necessário”, advertiu.
Garantindo que compreende “alguma relutância” de muitos eurodeputados em ratificar o acordo pós-‘Brexit’ quando Londres desrespeita algumas disposições do Acordo de Saída que firmou com a UE, Von der Leyen disse partilhar “as preocupações relativamente a ações unilaterais do Reino Unido”, mas insistiu que o Acordo de Comércio e Cooperação é a melhor forma de acautelar os interesses de todas as partes.
“Essa é uma das razões por que a ratificação é tão importante: dá-nos as ferramentas de que precisamos para assegurar o respeito integral das obrigações com que ambas as partes se comprometeram”, designadamente ao nível da implementação do protocolo entre Irlanda e Irlanda do Norte, em torno do qual, apontou, prosseguem as discussões com Londres.
Depois desta votação no Parlamento, o acordo sobre as relações futuras entre UE e Reino Unido entrará em vigor de forma definitiva assim que o Conselho completar o procedimento de ratificação com a adoção do texto, o que Ana Paula Zacarias garantiu que ocorreria sem demoras, até ao final da semana e do prazo provisório.