Apontando a “falha” de Portugal em cumprir integralmente o acórdão proferido pelo próprio Tribunal de Justiça, que dera razão a Bruxelas sobre esta matéria em 2016, a Comissão Europeia volta a apresentar queixa, sugerindo agora a imposição de uma multa de valor fixo de 1,8 milhões de euros e de uma sanção pecuniária diária de quase 7.500 euro “se não houver pleno cumprimento por parte do Estado-membro na data em que o Tribunal emitir o seu segundo acórdão”.
Em 02 de junho de 2016, o Tribunal de Justiça da UE deu razão aos argumentos do executivo comunitário, considerando que Portugal não garantiu a independência da ANA -Aeroportos de Portugal enquanto coordenadora do processo de atribuição de faixas horárias (‘slots’) nos aeroportos de Lisboa, Porto, Madeira e Faro.
“Mais de dois anos depois, a questão permanece por resolver e as autoridades portuguesas não adotaram as medidas nacionais para assegurar o estatuto de independência do coordenador” da atribuição das ‘slots’, argumenta a Comissão Europeia.
Na primeira queixa apresentada, a Comissão alegava que a entidade gestora de um aeroporto pode ter interesse em que as faixas horárias sejam atribuídas a uma determinada transportadora aérea, mesmo que não haja participação direta ou indireta no capital da mesma.
Segundo o executivo comunitário, o interesse pode resultar, por exemplo, de contratos de locação de espaço no aeroporto, celebrados entre uma determinada transportadora aérea e a entidade gestora, ou da pretensão desta última de que o aeroporto em questão se torne um aeroporto central de uma determinada transportadora aérea.
O coordenador atribui as faixas horárias às transportadoras aéreas e assegura, em cooperação com a entidade gestora do aeroporto, que as atividades das transportadoras aéreas sejam conformes às faixas horárias que lhes foram atribuídas.
O Estado-Membro, por seu turno, é responsável por separar funcionalmente o coordenador das faixas horárias de qualquer parte interessada, e disso, o sistema de financiamento do coordenador deve garantir a sua independência.
No seu acórdão de 2016, o tribunal deu razão a Bruxelas ao concluir que Portugal “não garantiu a independência do coordenador do processo de atribuição de faixas horárias, separando-o a nível funcional de qualquer parte interessada, e não assegurou que o sistema de financiamento das atividades do coordenador seja de molde a garantir o seu estatuto de independência".
"Por conseguinte, há que concluir que a ANA, enquanto entidade gestora de aeroportos em Portugal, deve ser considerada ‘parte interessada’, na aceção do regulamento", estipulou o tribunal no seu acórdão de há dois anos.
O acórdão considerou ainda que a ANA também é parte interessada no que respeita ao financiamento, uma vez que a Divisão de Coordenação Nacional de Slots (DCNS), criada dentro da estrutura da sociedade comercial gestoras dos aeroportos, não tem recursos próprios.
"O sistema de financiamento das atividades do coordenador (a DCNS) não é de molde a garantir a independência do mesmo, conforme exigida no regulamento", conclui o tribunal.
Hoje, a Comissão aponta que “Portugal não apresentou as garantias necessárias relativas à independência funcional e financeira do coordenador das faixas horárias”, desrespeitando assim o acórdão do Tribunal de Justiça, e solicitou então “a imposição de uma quantia fixa correspondente a 1.849.000 euros”, propondo ainda “uma sanção pecuniária diária de 7.452 euros se o Estado-Membro não executar o acórdão na sua integralidade até à data em que o Tribunal emitir o seu segundo acórdão”.
A Comissão precisa que, “no caso de Portugal não executar integralmente o acórdão e de o Tribunal de Justiça da UE dar razão à Comissão, a sanção pecuniária diária deverá ser paga a partir da data da segunda apreciação pelo Tribunal ou em data posterior determinada pelo Tribunal, até a execução integral ser concluída”, sendo que “o montante final da sanção pecuniária diária será estabelecido pelo Tribunal”.
De acordo com os tratados, “o cálculo da sanção pecuniária compulsória deve ter em conta a gravidade da infração, atendendo à importância das regras violadas, ao impacto da infração sobre os interesses gerais e particulares, à sua duração e à dimensão do Estado-Membro, a fim de garantir que a própria sanção tenha um efeito dissuasor”.
C/ LUSA