"A evolução da pandemia continua a ter um impacto sobre a avaliação de riscos para a estabilidade financeira. A incerteza na vertente sanitária e a acumulação de algumas vulnerabilidades podem-se traduzir na materialização de riscos no médio-prazo", pode ler-se no documento hoje divulgado.
Segundo o relatório, "os efeitos da pandemia não estão ultrapassados, nem integralmente materializados, sendo ainda incerta a sua extensão total".
"Adicionalmente, as medidas de mitigação do impacto da pandemia e de apoio à atividade económica originaram um recurso acrescido a dívida, tanto pública como privada. Como a experiência passada demonstrou, a acumulação de dívida constitui uma vulnerabilidade que potencia a materialização de riscos de crédito e de mercado para os setores residentes", alerta a instituição liderada por Mário Centeno.
O Banco de Portugal também aborda a questão do "aumento significativo da inflação" a nível mundial, "também associada à pandemia", que segundo a instituição reflete, entre outras coisas, "a recuperação desfasada da oferta face à procura em setores e atividades relevantes".
Apesar de ter vindo a ser avaliado como temporário pelo Banco Central Europeu (BCE), "a revelar-se mais persistente do que o esperado", com o aumento da inflação "existe o risco de gerar volatilidade excessiva nos mercados financeiros e de assumir uma natureza mais estrutural nas expetativas dos agentes económicos".
Neste caso, poderá condicionar "as suas decisões de despesa e de poupança, podendo, em última instância, condicionar a condução da política monetária".
O Banco de Portugal elenca, assim, quatro "vulnerabilidades e riscos para a estabilidade financeira no médio prazo".
A primeira é a "reavaliação dos prémios de risco, em resultado do aumento de incerteza por parte dos investidores quanto à evolução da inflação e à reação das autoridades monetárias".
Seguem-se as "alterações nas condições de financiamento nos mercados internacionais, com impacto nos preços do mercado imobiliário residencial e no custo de financiamento do soberano e dos restantes setores institucionais".
O BdP aponta também para "perturbações da atividade das sociedades não financeiras [empresas] com impacto no incumprimento e materialização do risco de crédito, em particular nos setores mais afetados pela pandemia".
Finalmente, o banco central adverte para a possível "subida do rácio de endividamento dos particulares em relação ao rendimento disponível, sobretudo decorrente do crescimento do crédito à habitação, que afetaria a resiliência financeira dos particulares a variações do desemprego e consequentes quebras de rendimento".
Já especificamente para o setor bancário, o supervisor alerta para a "deterioração da qualidade dos ativos e materialização do risco de crédito", salientando a "importância de um adequado registo de imparidades para crédito".
O BdP avisa ainda para a possível "materialização do risco de mercado decorrente de um aumento das taxas de juro de longo prazo, com impacto na desvalorização dos ativos financeiros em carteira, com destaque para a dívida pública".
Também a "reduzida rendibilidade, num quadro de taxas de juro baixas, expansão limitada do mercado de crédito doméstico e concorrência acrescida em segmentos mais rentáveis" é apontada pelo BdP.
Por fim, e ainda relativamente à banca, a instituição liderada por Mário Centeno refere os "desafios associados ao processo de digitalização da atividade bancária, incluindo a vertente da cibersegurança, e a transição para uma economia sustentável".
"Para além da ponderação dos riscos, os bancos deverão, em permanência, considerar nos seus processos de decisão o inevitável regresso às normas prudenciais que vigoravam e/ou estavam previstas antes da crise pandémica", refere ainda o BdP.
O Banco de Portugal avisa ainda que no contexto de recuperação económica "poderá tomar medidas macroprudenciais dirigidas à mitigação da potencial acumulação de risco sistémico em alguns setores".