Durante uma entrevista promovida pelo Clube de Jornalistas, em parceria com a agência Lusa e a Escola Superior de Comunicação Social, no âmbito dos 50 anos das comemorações do 25 de Abril e dos 40 anos do clube, Tiago Rodrigues, nascido em 1977, falou da forma como vê a Revolução dos Cravos e como lida com esse passado, atendendo a que todo o seu teatro joga com a memória e com muito do que não viveu diretamente.
“Cresço rodeado de pessoas que me contam o que é viver em ditadura, que me falam da importância de ter sido conquistada a democracia, da sorte de ter nascido e crescido em democracia, portanto, de alguma forma, a minha educação e os meus valores hoje estão muito ensopados em gratidão por aqueles que se sacrificaram, que se bateram para eu poder estar aqui a vontade a falar convosco sem termos problemas com isso, ou se tivermos é porque ainda há uns resíduos, mas à partida ninguém nos vai dizer que isto não pode ser visto, lido, ouvido, seja por quem for, e esse é só um dos direitos conquistados em Abril de 74 e cuja conquista é um prática diária”, afirmou.
O dramaturgo e encenador afirmou que a sua prática diária de defesa dos valores da liberdade, como se estivessem “permanentemente em perigo”, é também uma forma de “agradecer a todos os que se bateram”.
“Muito do meu compromisso político tem a ver com pensar o que eu posso ter e outros antes não puderam, para que eu tenha essa oportunidade hoje”.
Assinalando que provavelmente seria impensável alguém estar à frente do Festival de Avignon durante a ditadura, e que seria impensável ter o percurso que teve, se não fosse “o 25 de Abril graças àqueles que se bateram e perderam muito, que se sacrificaram muito, que sofreram” para que pudesse ter o que hoje o “enche de alegria”, Tiago Rodrigues sublinha que uma parte dessa alegria é bater-se “como se esse percurso estivesse em risco, como se aquilo que foi conquistado por outros tivesse de ser conquistado de novo”.
“Porque tem, diariamente, essa é a minha convicção, diariamente a prática da liberdade de expressão é uma prática que conquista o direito à liberdade de expressão, diariamente. E se não a praticarmos, se não dissermos ‘beleza de matar fascistas’ como uma provocação num título, amanhã não podemos dizer, e quando não pudermos dizer, houve qualquer coisa que eu não fiz por aqueles que se bateram para eu poder ter um título imbecil, insólito, insultuoso talvez, mas um título que só é possível porque outros se bateram para que esse título existisse”, frisou
Para Tiago Rodrigues, que assumiu em setembro a direção do festival de teatro de Avignon, em França, essa prática é o seu “gesto de gratidão”, é a sua “forma de dizer obrigada”, é a sua “forma de abraçar o Salgueiro Maia”.