"Meu caro amigo, me perdoe, por favor, essa demora", disse Marcelo Rebelo de Sousa, dirigindo-se ao compositor, cantor e escritor brasileiro, citando versos de uma canção sua.
O chefe de Estado português discursava na cerimónia de entrega do Prémio Camões a Chico Buarque, no Palácio de Queluz, em Sintra, na presença do Presidente do Brasil, Lula da Silva, e do primeiro-ministro português, António Costa.
"Saudando a decisão do júri do Prémio Camões e as razões da sua decisão, suspeito que por uma vez ninguém precisaria da fundamentação dessa decisão, de tal forma ela se impõe como evidência, acima de tudo poética, mas também romanesca", considerou Marcelo Rebelo de Sousa.
A entrega do Prémio Camões de 2019 a Chico Buarque acontece a simbolicamente na véspera da Revolução dos Cravos em Portugal e quatro anos depois de a sua atribuição ter sido anunciada, em 21 de maio de 2019.
O então Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, mostrou-se reticente em assinar o diploma do prémio, o que levou Chico Buarque a afirmar: "A não assinatura do Bolsonaro no diploma é para mim um segundo Prémio Camões".
"Dir-se-á que quatro anos é uma longa espera para concretizar, não importa chorar o leite derramado, o prémio respeita a 2019, é entregue pessoalmente em 2023, mas ninguém cuidará de saber a que ano diz respeito. Diz respeito a todos os anos", sustentou Marcelo Rebelo de Sousa.
Segundo o Presidente português, a espera para entregar este prémio a Chico Buarque foi "como os admiradores esperam por aqueles que admiram, como os amigos esperam uns pelos outros".
O Prémio Camões de literatura em língua portuguesa foi instituído por Portugal e pelo Brasil em 1988, com o objetivo de distinguir um autor "cuja obra contribua para a projeção e reconhecimento do património literário e cultural da língua comum".
Francisco Buarque de Hollanda, nascido em 19 de junho de 1944 no Rio de Janeiro, compôs centenas de canções, cerca de 500, e gravou perto de 40 álbuns, em 58 anos de carreira. A sua primeira composição gravada foi "Marcha para um dia de sol", em 1964, e a mais recente "Que tal um samba", em 2022.
Musicou e escreveu também peças de teatro, sozinho ou em coautoria, como "Roda viva" e "Gota d’Água".
O seu primeiro romance, "Estorvo", foi publicado em 1991, a que se seguiram "Benjamim", "Budapeste", "Leite Derramado", "O irmão alemão" e "Essa gente". O seu livro mais recente é "Anos de chumbo e outros contos", publicado em 2021.