No estudo, publicado na revista científica Global Change Biology, foram avaliados pela primeira vez, à escala global e com base em evidência cientifica publicada, os efeitos de diferentes impactos da ação humana em várias funções dos rios e ribeiros – como a capacidade de autodepuração, decomposição de matéria vegetal ou produção de organismos aquáticos – visando “compreender quais os impactos com efeitos mais fortes e quais as funções ecossistémicas mais sensíveis”, lê-se numa nota da UC hoje enviada à agência Lusa.
A maior parte dos impactos humanos avaliados “tiveram efeitos negativos no funcionamento dos rios e ribeiros, como a redução na sua capacidade de autodepuração (na sua capacidade de consumir nutrientes), cadeias alimentares simplificadas e menos produtivas”, sublinhou, citada no comunicado, Verónica Ferreira, do Departamento de Ciências da Vida da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC).
A investigadora, que fez parte do grupo de 10 cientistas do projeto, coordenado por Mário Brauns, do departamento de Ecologia Fluvial do Centro Helmholtz de Pesquisa Ambiental (Alemanha), observou ainda que a redução na capacidade de autodepuração de rios e ribeiros “é especialmente preocupante, já que altas concentrações de nutrientes na água são muitas vezes responsáveis por ‘blooms’ [florescimentos] nocivos de algas”.
Os resultados do estudo mostram, também, que os impactos humanos “afetam o funcionamento de rios e ribeiros, tanto quanto afetam a biodiversidade”.
“No entanto, a gestão destes ecossistemas não leva isso em conta, uma vez que a biomonitorização das linhas de água está centrada na avaliação de aspetos relacionados com a biodiversidade. É necessário incorporar a avaliação de funções ecossistémicas nos programas de biomonitorização para termos uma avaliação integrada da condição ecológica do ecossistema”, defendeu Verónica Ferreira.
O estudo considera as áreas localizadas entre o paralelo 35 (35º de latitude acima da linha do Equador), onde se incluem territórios dos estados norte-americanos da Califórnia, Texas ou Carolina do Sul e países como a Argélia e Tunísia (norte de África), Índia, China ou Japão, entre outros e o Paralelo 53, que atravessa territórios do centro-norte europeu como o Reino Unido, Irlanda, Países Baixos, Alemanha, Polónia e Bielorrússia ou o estado do Alasca, nos EUA, entre outros.
“É importante considerar o contexto regional dos rios e ribeiros, pois há cenários onde os impactos humanos podem ser especialmente gravosos, por exemplo, os efeitos de efluentes de estações de tratamento de águas residuais na produção primária são mais fortes a latitudes mais baixas do que a latitudes mais elevadas”, esclareceu Verónica Ferreira.
Por outro lado, a investigadora da FCTUC disse que é ainda necessário considerar “várias funções ecossistémicas na avaliação do funcionamento de rios e ribeiros, já que um dado impacto humano pode ter efeitos em algumas funções, mas não em outras”.
Outro dado do trabalho científico, que os autores do estudo classificaram de “surpreendente”, revelou que a eficiência com que os ribeiros retêm nitratos “é quase cinco vezes menor para ribeiros que drenam bacias agrícolas do que para ribeiros em bacias com baixa atividade agrícola”.
O estudo efetuou, igualmente, uma análise comparativa dos diferentes fatores de stress, ou seja, os fatores que têm o maior impacto em todas as funções ecológicas, concluindo os cientistas que “as águas residuais ocupam o primeiro lugar e são seguidas pela agricultura e urbanização, indicando que são áreas onde se deve tomar medidas urgentes”.
Os investigadores lembram que os rios e ribeiros “são a força vital” do nosso planeta, constituindo-se como “‘hotspots’ de biodiversidade e essenciais para a vida humana”.
“Fornecem água potável, oferecem proteção contra enchentes e são usados para irrigar áreas agrícolas. Mas as atividades humanas estão a causar fortes impactos nos ecossistemas de água doce e nas suas funções ecológicas através de ações como a regularização das linhas de água, agricultura ou descarga de águas residuais, o que leva a uma variedade de efeitos ecológicos adversos”, afirmaram os autores do estudo.