Numa sessão plenária extraordinária em Bruxelas, e após um debate que contou com uma intervenção por videoconferência do Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, o Parlamento Europeu adotou uma resolução sobre a invasão em curso, com 637 votos a favor, 26 abstenções e apenas 13 votos contra, dois dos quais da delegação do PCP, composta por João Pimenta Lopes e Sandra Pereira.
Em declarações à imprensa após a votação, João Pimenta Lopes explicou que “o voto foi contra tendo em conta o enquadramento de uma resolução que, no lugar de procurar abrir caminho ao diálogo, instiga uma escalada de tensões numa situação já ela própria de grande tensão”.
“Entendemos que têm que ser percorridos os caminhos necessários na defesa da paz para criar as condições para uma via negocial, uma solução política deste conflito, um cessar-fogo cuja necessidade o PCP já anteriormente afirmou, e rejeitar o caminho que potencie o continuar de uma escalada de confrontação que nos trouxe a esta situação, e que a própria resolução, tal como está construída, instiga”, argumentou.
Segundo o deputado comunista, o texto adotado instiga essa escalada em vários pontos, designadamente “no apelo ao aprofundamento das sanções, no apelo à aprofundamento da militarização da UE e de mobilização de forças militares da NATO no continente europeu, na instigação a essa capacidade operacional, ao fim e ao cabo na criação de um contexto de uma escalada de tensões que depois naturalmente tem repercussões, que é contrário à absoluta necessidade do desanuviamento”.
João Pimenta Lopes disse ainda que não se pode “ignorar o percurso” até aqui nos últimos anos, “no qual os Estados Unidos, a NATO e a UE tiveram também uma responsabilidade”.
Já o Bloco de Esquerda aprovou a resolução, ainda que votando contra – nos votos das emendas e votos separados – “os parágrafos que a direita quis incluir na resolução no sentido de uma escalada militar numa região altamente sensível”, assim como “emendas da direita muito genéricas sobre alargamento da NATO”, explicou o deputado José Gusmão.
“Todas as propostas que conduzem a uma escalada militar na Ucrânia nós não acompanhámos porque pensamos que a resolução deve estar centrada na obtenção de um cessar-fogo imediato”, disse, congratulando-se por, no seu entender, ter sido isso que acabou por acontecer.
“Em todo o caso, essas formulações ficaram bastante diluídas, pois se nós tivemos que fazer compromissos, também a direita teve que fazer” e o discurso “dos mais guerreiros” na ala direita do parlamento “não ficou consagrado”, disse.
A resolução adotada teve como um dos subscritores o deputado socialista Pedro Marques, vice-presidente da bancada do S&D para as Relações Exteriores, e único deputado português a intervir no plenário, onde saudou o facto de a Europa se unir face a “uma agressão bárbara a um Estado livre” e “contra o regresso ao mundo da guerra fria”, numa altura em que a Ucrânia é palco de “uma guerra que não é já apenas uma miragem”.
“Sim, armamos a Ucrânia. Sim, infligimos sanções sem paralelo a Putin e aos oligarcas. Isolamos a Rússia de Putin do mundo livre. Exortamos a coragem sem fim dos ucranianos, e o exemplo dos milhares que Putin prendeu por gritarem pelo fim da guerra […] Sairemos mais fortes e unidos da crise que nos queria dividir”, afirmou, na sua intervenção.
Entretanto, a delegação do PS emitiu um comunicado a lamentar que os dois deputados do PCP tenham optado por votar contra esta resolução, “juntando-se a uma ínfima minoria que se recusa, apesar de todas as evidências, a condenar, sem ambiguidades, a guerra de agressão iniciada por Putin e a sua intolerável ambição imperialista contra uma nação soberana e independente”.
“O Partido Socialista não pode deixar de lamentar que, mais uma vez, o PCP se coloque do lado errado da História”, lê-se na nota.
Também presente na sessão, o social-democrata Paulo Rangel sublinhou, em declarações aos jornalistas, que “o Parlamento Europeu obviamente tinha que ter uma condenação desta agressão”, saudando que a resolução também envie “sinais” importantes, desde logo “de solidariedade com o povo ucraniano, mas também de abertura a um processo de adesão”
“E além disso há um conjunto de exposições muito relevantes no que tem a ver com a própria preparação da UE para o futuro que aí vem”, em áreas como a energia, política de defesa e segurança e política externa, “ou seja, há um conjunto de mudanças que este novo contexto geopolítico vem trazer e que também de uma forma ou outra também está refletida” no texto adotado, disse.
O deputado Francisco Guerreiro, da bancada dos Verdes, relevou que votou favoravelmente a resolução, “como é óbvio”, embora advertindo que não se pode “cair na vertente militarista”, algo que considera estar salvaguardado, pois o apoio militar da UE é através da aquisição e fornecimento de armas, e, “numa altura especial, efetivamente tem que ser dado esse apoio” à Ucrânia, pois não serão colocadas tropas no terreno.
A Rússia lançou na quinta-feira de madrugada uma ofensiva militar na Ucrânia, com forças terrestres e bombardeamento de alvos em várias cidades, que já mataram mais de 350 civis, incluindo crianças, segundo Kiev. A ONU deu conta de mais de 100 mil deslocados e mais de 660 mil refugiados na Polónia, Hungria, Moldova e Roménia.
O Presidente russo, Vladimir Putin, disse que a "operação militar especial" na Ucrânia visa desmilitarizar o país vizinho e que era a única maneira de a Rússia se defender, precisando o Kremlin que a ofensiva durará o tempo necessário.
O ataque foi condenado pela generalidade da comunidade internacional e a União Europeia e os Estados Unidos, entre outros, responderam com o envio de armas e munições para a Ucrânia e o reforço de sanções para isolar ainda mais Moscovo.
Lusa