A decisão instrutória determina se os arguidos são ou não pronunciados para ir a julgamento.
Em 04 de outubro de 2018, o Ministério Público acusou a vice-presidente da Câmara do Funchal, Idalina Perestrelo, responsável pelos pelouros do Ambiente Urbano, Espaços Verdes e Públicos, e o chefe da Divisão de Jardins e Espaços Verdes, Francisco Andrade, de 13 crimes de homicídio por negligência e 49 de ofensas à integridade física involuntária ou negligente. Ambos requereram a abertura de inquérito.
Também o então presidente da autarquia, Paulo Cafôfo, foi constituído arguido, mas o Ministério Público acabou por optar pelo arquivamento no seu caso, justificando a decisão com o facto de ter delegado as competências sobre os espaços verdes noutros elementos da equipa.
Em 15 de agosto de 2017, um carvalho de grande dimensões, com cerca de 150 anos, abateu-se sobre a multidão que aguardava a passagem da procissão no Largo da Fonte, na freguesia do Monte, nos arredores do Funchal, no Dia da Assunção de Nossa Senhora, também conhecido por Dia de Nossa Senhora do Monte, padroeira da Região Autónoma da Madeira.
Hoje, em sede de alegações na fase de debate instrutório, cinco dos mandatários dos assistentes (vítimas do incidente) insistiram em que o então presidente do município também deve ser levado a julgamento, apontando, entre outros aspetos, que era o responsável pela Proteção Civil Municipal, uma competência que não pode ser delegada.
O advogado José Prada argumentou que Paulo Cafôfo foi alertado para o problema da situação das árvores no largo do Monte, por vários meios, e considerou que houve “uma clara omissão do dever de proteção” por parte de Cafôfo, atual deputado regional e líder do PS/Madeira.
Além disso, referiu, a delegação de competências “não o esvazia dos seus poderes”, pelo que “a responsabilidade criminal deve ser imputada aos três arguidos”.
Brício Aráujo, mandatário do ex-autarca do Funchal, destacou que “todas as diligências vieram justificar o despacho de arquivamento” proferido, visto que Paulo Cafôfo delegou as responsabilidades em “pessoas competentes”, não podendo ser punido no âmbito criminal.
O defensor salientou que “nunca foi transmitida qualquer nota de perigo” ao então autarca, nem “havia perceção de risco” em relação àquele carvalho. As queixas efetuadas, referiu, relacionavam-se com os plátanos que também existem no largo, pelo que “não havia razão este para chamar a si os poderes que tinha delegado”.
Sofia Branco, advogada do chefe de divisão Francisco Andrade, enfatizou que o arguido “não cometeu qualquer crime” e que o Ministério Público não conseguiu fazer prova dos factos constantes da acusação que “permita levá-lo a julgamento”:
“Todos lamentamos, mas nada poderia ter sido feito para evitar a queda do carvalho”, disse, opinando que neste tipo de situações “há que encontrar um culpado” e o “estigma foi colocado em Francisco Andrade”.
Sofia Branco contestou vários pontos da acusação, desvalorizando, entre outros, os perfis e os conhecimentos técnicos e científicos dos peritos ouvidos; apontando contradições transmitidas nos seus depoimentos e relatórios; e mencionando situações de “total ausência de rigor”, em que a procuradora do Ministério Público “foi induzida em erro”.
Segundo a advogada, nenhuma testemunha “referiu em tribunal que o cabo de aço que sustentava a árvore tivesse implicação na queda” e “não foram os fungos que fizeram a árvore cair”. A causa, disse, “não está especificada na acusação”.
“Não existiu qualquer dever de incumprimento de cuidado por parte do arguido”, vincou, acrescentando que este é conhecido pela sua competência e que “não foi possível estabelecer o nexo de causalidade” entre a sua atuação e o resultado da queda do carvalho.
Daniel Pegado, que representou a vice-presidente da Câmara do Funchal, Idalina Perestrelo, corroborou a argumentação da sua colega, manifestando “solidariedade para com a família das vítimas”, e sustentou “não haver matéria para acusar nenhum dos arguidos”.
“Não é relatada causa decisiva [para a queda da árvore] nem nexo de causalidade”, insistiu, reforçando que “não houve alerta” para o perigo daquele carvalho.
Além disso, declarou, quando a vice-presidente teve conhecimento de algumas queixas com os plátanos também existentes no largo do Monte “acionou os serviços”, deu “um despacho imediato” e foi solicitado um parecer ao Instituto das Florestas e Conservação da Natureza.
A fase de instrução deste processo começou em 04 de outubro de 2019 à porta fechada, tendo sido, entretanto, suspenso devido à pandemia da covid-19.