Sem hesitar em chamar aos marroquinos "escória" ou em propor concursos de caricaturas do profeta Maomé, Wilders, de 60 anos, construiu a sua carreira numa cruzada contra o que chama "invasão islâmica" do Ocidente.
Nem os problemas com o sistema judicial neerlandês, que o considerou culpado de insultar os marroquinos, ou as ameaças de morte contra ele, que o mantiveram sob proteção policial desde 2004, o desencorajaram.
A sondagem à boca das urnas das eleições gerais realizadas hoje nos Países Baixos, aponta que o Partido da Liberdade (PVV) de Wilders conquistou 35 lugares na câmara baixa do Parlamento, com 150 assentos, mais que o dobro dos 17 que conquistou nas últimas eleições. A aliança de esquerda de Frans Timmermans está em segundo lugar, com 26 assentos, enquanto o partido liberal de direita VVD, conquistou 23 lugares.
Mais de 13,3 milhões de cidadãos foram chamados a eleger, entre 26 partidos, os grupos que formarão a próxima coligação governamental nos Países Baixos, onde começará uma nova era após 13 anos de mandatos liberais de Mark Rutte.
Wilders, que participou hoje na sua sexta eleição, depois de não ter conseguido causar impacto em diversas ocasiões, tentou suavizar desta vez parte da sua retórica populista, concentrando-se em outras preocupações dos eleitores. De qualquer forma, acabou por exceder as expectativas, de acordo com uma análise da agência France-Presse (AFP).
Há “problemas mais importantes do que combater a enxurrada de requerentes de asilo e imigrantes”, frisou, durante um dos últimos debates eleitorais, acrescentando que estava pronto a pôr de lado as suas opiniões sobre o Islão para governar.
Se a imigração continuou a ser um tema central da campanha, os neerlandeses estão ainda mais preocupados em “saber se ainda têm dinheiro nas carteiras”, insistiu.
Durante a campanha, prometeu concentrar-se mais na “segurança e cuidados de saúde” do que na sua oposição ao Islão.
O líder do PVV garantiu aos jornalistas em Haia, depois de votar, que será o primeiro-ministro de "todos nos Países Baixos, independentemente da sua religião, origem, sexo ou qualquer outra coisa".
Mas o manifesto do PVV manteve o tom xenófobo que é a sua ‘marca registada’.
As medidas anti-imigração propostas incluem o restabelecimento do controlo de fronteiras, a detenção e deportação de imigrantes ilegais, devolver requerentes de asilo sírios e a reintrodução de autorizações de trabalho para trabalhadores intra-UE.
Quanto ao Islão, o manifesto do PVV diz: “Os Países Baixos não são um país islâmico. Não há escolas islâmicas, o Corão e mesquitas”.
Wilders, que participou hoje na sua sexta eleição, pretende proibir em edifícios governamentais o uso de lenços para cobrir a cabeça, como os usados pelas mulheres muçulmanas.
Em termos de política externa, e uma abordagem “Países Baixos em primeiro lugar”, esta inclui o encerramento da sua representação em Ramallah e o reforço dos laços com Israel, em particular a mudança da sua embaixada para Jerusalém.
Um “referendo vinculativo” sobre um ‘Nexit’ (a saída dos Países Baixos da UE) também consta do programa, bem como um “fim imediato” da ajuda ao desenvolvimento.
Nascido em 1963 em Venlo, perto da fronteira alemã, Wilders cresceu numa família católica com o seu irmão e duas irmãs. A sua mãe era de origem indonésia, facto que o político raramente menciona.
Wilders desenvolveu um interesse pela política na década de 1980, de acordo com revelações do seu irmão mais velho, numa entrevista à revista alemã Der Spiegel.
"Ele não era claramente de esquerda nem de direita na altura, nem xenófobo. Mas era fascinado pelo jogo político, pela luta pelo poder e pela influência", frisou Paul Wilders.
O seu ódio pelo Islão parece ter-se desenvolvido lentamente. Passou algum tempo em Israel, num ‘kibutz’, testemunhando em primeira mão as tensões com os palestinianos. Também ficou chocado com os assassinatos do líder de extrema-direita Pim Fortuyn em 2002 e do cineasta radical anti-islâmico Theo van Gogh, em 2004.
Wilders entrou na política em 1998, dentro do partido liberal de direita VVD, do qual saiu em 2006 para fundar o seu PVV.
A sua maior vitória eleitoral até o momento foi em 2010, quando conquistou 24 assentos. Em 2017, tornou-se o segundo partido no Parlamento, depois o terceiro em 2021.
Alguns veem Geert Wilders como uma figura isolada. É casado com uma húngara, mas não tem filhos e a sua segurança limita o seu contacto com o mundo exterior.
Mas, aproveitando a rejeição dos neerlandeses aos seus líderes políticos, Wilders conseguiu empurrar o discurso político nos Países Baixos ainda mais para a direita.