“Não podemos pensar esse alargamento [a leste] sem repensar a engenharia da nossa união, nomeadamente ao nível financeiro e orçamental”, disse Santos Silva, durante uma intervenção no almoço-debate sobre “Portugal e o futuro das instituições europeias”, organizado pelo International Club of Portugal, hoje em Lisboa.
Para o ex-chefe da diplomacia portuguesa, o processo de alargamento da UE a leste, incluindo a integração da Ucrânia, traz muitas vantagens para a comunidade, mas deve ser pensado com “muita racionalidade”, já que implica sérias consequências para a própria ideia de Europa.
“Este tema pode ser visto como árido. Não contesto. Mas não é afastado das pessoas e dos países”, argumentou Santos Silva, dizendo que, na sua análise, se iria colocar no papel de parlamentar.
“E nessa análise, concluo que o alargamento é vantajoso e necessário”, defendeu Santos Silva, lembrando que, em momentos anteriores, outros alargamentos da UE e da NATO foram “estratégias fundamentais para a estabilidade e para o triunfo de uma transição pacífica no interior da Europa”, em particular no final da Guerra Fria.
“Se este processo de alargamento é incontestável e vantajoso, também vai criar um novo equilíbrio intraeuropeu”, explicou a segunda figura do Estado português, lembrando que, no passado, a inclusão de novos países implicou “uma nova natureza das políticas de coesão, que eram de natureza regional e passaram a ter um novo alcance”, bem como “um reequilíbrio na ideia de Estado de Direito”.
Para Santos Silva, por tudo isto, o novo alargamento da UE obriga os dirigentes europeus a não se deixarem “levar apenas pelas emoções, mantendo a racionalidade”, para não perder de vista os objetivos maiores do projeto europeu, que devem ser preservados a todo o custo.
“Devemos honrar os países candidatos, desde logo a Ucrânia, aplicando-lhes os critérios de Copenhaga”, disse o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, referindo-se às condições de entrada para a comunidade agora composta por 27 países.
“Esses critérios, em termos políticos, implicam uma conformação política democrática, o respeito pelas minorias e pela independência dos tribunais e pela liberdade de imprensa; ao nível económico, implica ser uma economia de mercado; e ao nível burocrático, implica ter capacidade de incorporar toda a complexidade da máquina europeia”, explicou Santos Silva.
Na sua intervenção no almoço-debate, o presidente da Assembleia da República lembrou ainda um outro fator essencial, no momento de garantir a adesão de novos membros para a comunidade europeia: as garantias de capacidade orçamental da UE.
Santos Silva antecipou que o alargamento da UE a Leste vai revelar, “de forma cada vez mais notória, a diversidade na comunidade, com a chegada de países como a Moldova ou a Ucrânia”, obrigando os cofres europeus a prepararem-se para os riscos de uma Europa a várias velocidades.
Por outro lado, Santos Silva disse ainda ser necessário olhar com atenção para as propostas de reforma, recentemente apresentadas em Bruxelas, para reforçar os poderes do Parlamento Europeu.
“Essas propostas parecem ser mais democráticas do que as regras em vigor. Mas é bom que nos lembremos que, por vezes, as aparências iludem”, disse Santos Silva, aconselhando uma reflexão cuidada sobre essas reformas, referindo-se à ideia de escolha direta do presidente da Comissão Europeia; a constituição de listas transnacionais para o Parlamento Europeu; a possibilidade de esse Parlamento ter poder de iniciativa legislativa ou a possibilidade ter uma decisão fundamental em matéria orçamental.
“Devemos fazer estas reflexões com racionalidade”, concluiu Santos Silva, dizendo que os países não se devem precipitar em decisões pouco acauteladas.