Todos os anos, milhares de animais são abandonados: Em 2021, os Centros de Recolha Oficiais (CRO) receberam 43.603 animais errantes e, no ano passado, foram apanhados na rua ou entregues nos centros 41.994 animais, segundo dados do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
A ligeira diminuição de 2022 esconde um aumento de mais de dez mil animais quando se comparada com a realidade vivenciada nos CRO em 2020 e existem casos regionais que contrariam a tendência nacional, como Lisboa ou Torres Vedras.
A Lusa analisou a evolução de 10 cidades aleatórias e em duas houve um aumento de animais recolhidos entre 2021 e 2022: Em Torres Vedras subiu de 672 para 877 no ano passado e em Lisboa passou de 945 para 1.166 animais, segundo dados do ICNF.
Nas restantes houve sempre uma diminuição, com Sintra a ter apenas menos um animal recolhido em 2020 (num universo de 886) ou Santo Tirso que passou de 1.505 animais recolhidos para 947.
As estatísticas apontam uma redução nacional de 3,9% entre 2021 e 2022, escondendo realidades locais como a de Lisboa, onde os animais recolhidos têm vindo a aumentar.
Em declarações à Lusa, a responsável pela Casa dos Animais de Lisboa (CAL), Sofia Baptista, admitiu que a tendência de aumento poderá continuar: “Desde o ano passado, e sobretudo este ano, temos sentido um aumento do número de pedidos para recebermos os animais”, disse a médica veterinária e chefe de divisão da CAL.
A responsável explicou que entre os pedidos de ajuda há casos de famílias que foram despejadas e outras com dificuldades económicas: “Nós sentimos muitas vezes que os detentores até querem ficar com os animais” até porque “cada vez mais as famílias são pessoas e animais”.
A CAL promove a captura e tratamento dos animais, executa ações para reduzir o abandono e fomenta a adoção responsável. Nestas missões, conta com a ajuda de organizações como a Animalife, que desde 2011 luta contra o abandono.
O presidente da Animalife, Rodrigo Livreiro, admitiu estar preocupado com a atual conjuntura económica, que está a agravar a vida das famílias mais carenciadas e poderá levar a um aumento de casos de abandono.
Só no primeiro semestre do ano, a Animalife recebeu "mais de quatro mil pedidos de ajuda", revelou Rodrigo Livreiro, explicando que muitos são sobre a obrigatoriedade da identificação eletrónica dos gatos, mas também há quem procure ajuda para comprar comida para os animais ou para outros procedimentos veterinários.
“Parte destas famílias luta diariamente em condições extremamente difíceis”, explicou Rodrigo Livreiro, sublinhando que a associação tenta minimizar o impacto financeiro de ter um animal de estimação oferecendo consultas veterinárias e alimentação a pessoas em situação de especial vulnerabilidade, como idosos, sem-abrigo, ou vítimas de violência.
Na associação, o animal é visto como fazendo parte da família e por isso a atenção tanto é dada ao animal como ao dono, a quem também é oferecido acompanhamento especializado, já que a Animalife criou um Departamento de Desenvolvimento Social-Animal.
Este departamento é composto por uma equipa multidisciplinar de profissionais de Serviço Social e Medico-Veterinario, para encontrar soluções que visem um acompanhamento quer ao nível social como animal, nomeadamente, para vacinar e identificar eletronicamente os animais, como ajudar nas dificuldades habitacionais ou encaminhar para gabinetes de empregabilidade ou marcações relacionadas com a saúde física e mental das famílias.
A Animalife apoia atualmente 700 famílias com cerca de 1.500 animais, tendo realizado só este ano 1.094 atendimentos sociais e 756 atendimentos profiláticos, acrescentou o presidente.
Na cidade de Lisboa, já celebraram protocolos com a maioria das juntas de freguesia e, esta semana, foi a vez da Junta de Freguesia do Lumiar aderir ao projeto.
À Lusa, o presidente da Junta do Lumiar, Ricardo Mexia, contou que já tinham recebido pedidos de munícipes para ter um serviço deste tipo: “Sabemos que, infelizmente, muitas pessoas não conseguem proporcionar a melhor saúde aos seus animais de estimação porque não têm condições económicas para o fazer”.
O autarca reconheceu que os animais de estimação “são, muitas vezes, um suporte importante para as pessoas”.