“Atualmente não temos nenhum sistema vulcânico que esteja fora do normal. De quando em vez, temos alguns incrementos da atividade sísmica. Normalmente, esse é o indicador que tem revelado algumas alterações, momentaneamente, em alguns sistemas”, avançou, em declarações à Lusa, o presidente do CIVISA, Rui Marques.
De acordo com o responsável, apesar da atual acalmia, o cenário a que se assiste na ilha de La Palma, nas Canárias, onde o vulcão Cumbre Vieja entrou em erupção no domingo, pode vir a ocorrer nos Açores, onde existem 26 sistemas vulcânicos ativos, oito dos quais submarinos, espalhados por todas oito das nove ilhas do arquipélago, com exceção de Santa Maria.
“Temos toda essa diversidade de centros eruptivos, desde o vulcanismo fissural até ao vulcanismo central muito explosivo. Só na ilha de São Miguel temos este espetro todo”, adiantou Rui Marques.
O vulcão dos Capelinhos, na ilha do Faial, que entrou em erupção em 1957, é o que está mais presente na memória dos açorianos, pela destruição que provocou e pela vaga de emigração que gerou.
A última erupção vulcânica registada na região ocorreu, no entanto, em 1998, ao largo da ilha Terceira, junto à freguesia da Serreta. Foi uma erupção submarina e não provocou estragos.
A atividade sismovulcânica nos Açores é monitorizada por uma equipa de cerca de cinco dezenas de investigadores, do CIVISA e do Instituto de Investigação em Vulcanologia e Avaliação de Riscos (IVAR), com base em três redes: uma sísmica, uma geoquímica de gases e uma de GNSS (sistema de navegação por satélite).
“Há sempre espaço para melhorarmos, porque a tecnologia está sempre a evoluir, mas temos essas redes implementadas nos Açores. Temos uma boa rede sísmica, que cobre a totalidade do arquipélago, temos uma rede GNSS que cobre os sistemas vulcânicos ativos principais e temos algumas estações de gases em zonas em que sabemos que há desgasificação”, salientou o presidente do CIVISA.
Para além da monitorização da sismicidade, as estações nas zonas de desgasificação permitem perceber se há “alterações no sistema hidrotermal” e a rede GNSS permite medir “se há empolamento ou deflação dos sistemas vulcânicas”.
Nos Açores chega a ocorrer mais do que uma crise sísmica, por ano, mas este elemento isolado, por norma, não é suficiente para identificar a entrada em erupção de um vulcão.
“O facto de uma só rede ter alguma indicação de estar a sair fora daquilo que é o normal não quer dizer que se vá ter uma erupção no dia a seguir ou na semana a seguir. Muitas vezes é necessário que tenhamos várias redes a dar-nos diferença naquilo que é o comportamento normal”, apontou Rui Marques.
Na ilha de La Palma, por exemplo, a rede de GNSS detetou uma “deformação da ilha no sentido vertical”, depois de um “incremento significativo da atividade sísmica”.
A última crise sísmica de maior dimensão, com milhares de eventos, prolongados por vários meses, ocorreu no final de 2019 “a cerca de 30 a 35 quilómetros a oeste da ilha do Faial”.
“Nessa altura tivemos um incremento da sismicidade, mas não foi acompanhado por alterações ao nível de deformação, nem ao nível de desgasificação”, revelou o geólogo.
Já este ano, em julho, o CIVISA registou um “pequeno incremento da atividade sísmica”, a cerca de 8 quilómetros a sul do concelho da Povoação, na ilha de São Miguel, mas durou apenas “alguns dias”.
Rui Marques admite que o mediatismo em redor da erupção do vulcão em La Palma possa provocar alguma curiosidade na população, mas, por norma, considera que estes fenómenos não geram grande preocupação na sociedade açoriana.
“Acho que, embora os Açores sejam um arquipélago de origem vulcânica, pelo facto de as erupções não serem muito recorrentes, as pessoas a acabam por não pensar muito no assunto. Acabam por pensar muito mais em sismos, porque é algo que acontece todos os anos”, justificou.
O investigador defende que há até “uma habituação da população açoriana à sismicidade, que acaba por ser de baixa magnitude”, não gerando, por isso, “grande alarmismo”.
O último sismo que provocou estragos na região ocorreu também há mais de duas décadas, em 1998, afetando as ilhas do Faial, Pico e São Jorge.
“Temos milhares de sismos registados, centenas de sismos sentidos, mas não temos um sismo destruidor depois do sismo de 1998”, afirmou Rui Marques.
É quando estes fenómenos se repetem num curto espaço de tempo que “começa a haver alguma preocupação por parte da população”.
O presidente do CIVISA recorda que, em 2005, algumas pessoas em Vila Franca do Campo, na ilha de São Miguel, chegaram a dormir várias noites na rua, “com medo que pudesse haver um sismo de maior magnitude”, depois de se terem registado “várias dezenas em poucas semanas”.