“Na Venezuela não há o risco de uma guerra civil, como alguns querem acreditar ou são levados a acreditar. Porquê? Porque 90% da população quer uma mudança”, assegurou o presidente da Assembleia Nacional (parlamento venezuelano), numa entrevista telefónica ao jornal espanhol, realizada após os protestos de quarta-feira que pretenderam aumentar a pressão sobre o regime de Nicolás Maduro.
Guaidó advertiu, no entanto, para “o risco de violência”, denunciando que o regime de Maduro tem tido o apoio de forças especiais da polícia e de unidades “paramilitares”.
“Existe risco de violência? Hoje existe. Têm matado dezenas de jovens em uma semana. Mais de 140 em 2017”, afirmou Guaidó, que desde que se autoproclamou recebeu o reconhecimento imediato dos Estados Unidos, ao qual se juntaram, nos últimos dias, mais de 60 países, de acordo com o El País.
A crise política na Venezuela agravou-se em 23 de janeiro, quando Juan Guaidó se autoproclamou Presidente da República interino e declarou que assumia os poderes executivos de Nicolás Maduro.
Após a sua autoproclamação, Guaidó, de 35 anos, prometeu formar um governo de transição e organizar eleições livres. Também anunciou uma amnistia aos militares e funcionários públicos que “colaborarem com a restituição da democracia”.
Nicolás Maduro, de 56 anos, chefe de Estado desde 2013, recusou o desafio de Guaidó e denunciou a iniciativa do presidente do parlamento, no qual a oposição tem maioria, como uma tentativa de golpe de Estado liderada pelos Estados Unidos da América.
Na entrevista ao El País, o presidente da Assembleia Nacional aproveitou para reiterar o seu apelo às forças armadas para que não reconheçam Maduro como Presidente.
“Estou convencido de que, em algum momento, como aconteceu em Cotiza [uma paróquia de Caracas onde na semana passada 27 militares se revoltaram contra Maduro], a manifestação de descontentamento das forças armadas será total e nessa ocasião deverão ficar ao lado da Constituição. Não apenas porque estamos a oferecer amnistia e garantias (…) Eles têm um papel também na reconstrução do país”, prosseguiu.
Num artigo de opinião que escreveu para o jornal The New York Times, publicado na quarta-feira, Guaidó referiu que tem mantido “reuniões secretas” com membros das forças armadas e das forças de segurança para tentar obter apoio para derrubar Nicolás Maduro.
“A retirada do apoio militar a Maduro é crucial para permitir uma mudança de governo e a maioria dos que estão ao serviço concordam que as recentes dificuldades do país são insustentáveis", escreveu o opositor.
Questionado ainda pelo El País se descartava o cenário de uma intervenção internacional, o opositor respondeu que essa situação foi “vendida como um tema dos Estados Unidos”.
“É verdade que pedimos, por exemplo, proteção de ativos, pedimos apoio humanitário. Quando esta quinta-feira, o Parlamento Europeu (PE) se pronunciar, vamos solicitar formalmente à Europa não só a proteção dos ativos da Venezuela, mas também o apoio para ajuda humanitária e recursos para projetos”, referiu.
“Estamos a exercer funções numa ditadura. Podemos dizer que começou a transição? Estamos numa zona desconhecida, mas devemos avançar para consolidar”, acrescentou.
O PE reconheceu hoje de manhã Juan Guaidó como o “Presidente interino legítimo” da Venezuela e exortou a União Europeia (UE) e os seus Estados-membros a assumirem uma posição semelhante, enquanto não for possível convocar eleições presidenciais.
A UE fez um ultimato a Maduro para convocar eleições nos próximos dias, prazo que Espanha, Portugal, França, Alemanha e Reino Unido indicaram, na semana passada, ser de oito dias, findo o qual o bloco comunitário reconhece a autoridade de Juan Guaidó e da Assembleia Nacional para liderar o processo eleitoral.
Na reação, Maduro disse ser a favor de eleições legislativas antecipadas para acabar com a crise política do país, mas recusou a hipótese de um novo escrutínio presidencial.
A repressão dos protestos antigovernamentais da última semana provocou pelo menos 40 mortos, de acordo com dados das Nações Unidas.
Esta crise política soma-se a uma grave crise económica e social que levou 2,3 milhões de pessoas a fugirem do país desde 2015, segundo dados da ONU.
Na Venezuela, antiga colónia espanhola, residem cerca de 300.000 portugueses ou lusodescendentes.
LUSA