Em declarações à agência Lusa, Isabel Coimbra, médica intensivista e coordenadora da consulta de ‘follow up’, explicou hoje que o estudo visava “caracterizar a população de doentes com covid-19 internada nas unidades de cuidados intensivos” do serviço de medicina intensiva do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ), no Porto.
“Depois do internamento em cuidados intensivos, há a síndrome pós-cuidados intensivos que abrange sequelas físicas, psicológicas e funcionais que se podem prolongar por seis, 12 ou mais meses e que vão ter impacto na qualidade de vida e integração dos sobreviventes ao nível da família e do trabalho, quando estão em vida ativa profissional”, referiu.
O estudo retrospetivo incluiu “os primeiros doentes da primeira vaga” da pandemia da covid-19, isto é, doentes com covid-19 grave que estiveram internados mais de 24 horas nas unidades de cuidados intensivos entre 11 de março e 10 de junho de 2020 e que tiveram alta hospitalar até 15 de julho.
Dos 93 doentes que estiveram, durante esse período, internados no Hospital São João, participaram no estudo 45, uma vez que 23 morreram, 17 continuavam hospitalizados à época, sete estiveram menos de 24 horas internados e um deles recusou participar.
Recorrendo a duas escalas diferentes – WHODAS para determinar a funcionalidade e EuroQol para determinar a qualidade de vida – os clínicos propuseram-se nas consultas de seguimento realizadas entre 30 e 90 dias após a alta hospitalar a “aprofundar o que se passava” com os doentes.
No questionário EuroQol, 29 dos 45 doentes mostraram ter problemas “moderados a extremos” nas atividades diárias, na ansiedade e depressão, na dor e desconforto, na mobilidade e nos cuidados pessoais.
Já no questionário WHODAS, 37 dos 45 doentes revelaram ter alterações funcionais “moderadas a extremas” em permanecer de pé por longos períodos, em percorrer longas distâncias, em cuidar das responsabilidades domésticas, no trabalho e mostraram-se emocionalmente afetados pelos seus problemas de saúde.
“A avaliação dos sobreviventes de covid-19 demonstra que a mobilidade, dor, desconforto, ansiedade e depressão são os principais problemas que persistem um a três meses após a alta hospitalar”, afirmou a médica.
Segundo Isabel Coimbra, os dados obtidos permitiram ainda correlacionar os problemas identificados pelos doentes com o tempo que os mesmos estiveram internados e sujeitos a ventilação mecânica invasiva.
“Quanto maior for o internamento, quanto maior for o tempo de ventilação, mais tempo os doentes vão estar imobilizados e, estando imobilizados, há uma grande perda de massa muscular que vai ter repercussões na sua mobilidade, no facto de, por exemplo, não conseguir estar muito tempo de pé”, esclareceu.
À Lusa, a médica salientou, por isso, a necessidade de existir “um acompanhamento estruturado após a alta hospitalar”, considerando que tal poderá ter “um impacto significativo” na qualidade de vida destes doentes.
“Deve ser feito um investimento, que já é feito, mas deve ser incentivado para que as pessoas tenham medicina física e de reabilitação contínua também no domicílio”, afirmou, acrescentando também que o processo deverá ser “mais agilizado”.
“Isto é um processo intensivo também depois da alta hospitalar”, salientou.