Numa das pontas da aldeia da Boavista, na direção para Santiago da Guarda, cuja população lida com as chamas desde as 14:00, parte da população preparava-se às 16:00 para o avançar do fogo na direção daquela parte da localidade.
“Isto está medonho”, avisava uma senhora reformada, junto ao seu cão, que parecia assustado com toda a situação.
No entanto, no espaço de minutos, aquilo que já era uma situação de apreensão, rapidamente escalou com o vento a ganhar força e a empurrar as chamas para junto das habitações.
Uma coluna de fumo indiferenciada deu lugar a chamas de metros de altura que escalavam as copas de sobreiros e pinheiros a grande velocidade.
Deixou-se de ver o céu, o fumo tornou-se denso, cinzas e faúlhas voavam por todo o lado e tudo ficou em tons de sépia, só se ouvindo um intensificar do crepitar da madeira a arder, cada vez mais próximo das casas.
Com o cenário a mudar drasticamente, ouviam-se crianças aos gritos, uma família apressava-se para entrar no carro e sair da aldeia quando as chamas se aproximavam da sua habitação – "para que lado vou?", perguntava o condutor -, um homem ligava a um amigo para pedir ajuda, que a casa do seu irmão estava “quase a arder”, pessoas tentavam convencer uma idosa a abandonar a sua moradia.
Mais à frente, jovens corriam com baldes para apagar o que era possível de apagar, num ambiente que se tornava quase irrespirável e queimava os olhos.
Por entre o caos, surgiu uma corça, desnorteada, na estrada, que vagueava pela aldeia, ora parando, a olhar para os lados, ora a fugir desenfreada, sem rumo.
A tarde de hoje na Boavista tem sido marcada por este vai e vem do fogo, que ora abranda ora avança com força em direção a habitações da localidade.
Às 14:30, na entrada da aldeia junto ao IC8, estrada que liga Pombal a Ansião, Lúcia Lopes subia ao terraço da sua habitação para tentar avistar as chamas.
Nada se via, apenas se ouvia o som da madeira e o cacarejar das galinhas de Lúcia, que parece que “pressentiam” a chegada do fogo.
“A gente não pode entrar em pânico, mas é difícil ao ver as chamas a aproximarem-se”, contava à agência Lusa a moradora daquela localidade.
Lúcia Lopes, com uma empresa de máquinas agrícolas, andava com a família a correr com mangueiras e tanques para ver se salvava o seu ganha-pão, mas também de mais sete trabalhadores.
No espaço de meia hora, as chamas ainda se aproximaram da casa, mas a ação de bombeiros e populares manteve a habitação fora de perigo.
Passados 15 minutos, o vento mudou para oeste e os bombeiros desmobilizaram daquele ponto.
Já na ponta ocidental da aldeia, outra equipa de operacionais preparava-se para enfrentar as chamas, enquanto um militar da GNR avisava a população de que havia falta de meios e que deveriam refugiar-se nas suas casas. Não daria para evacuações.
Também aqui, o vento voltou a trocar as voltas às populações e bombeiros. Quando parecia continuar a ir para oeste, virou-se para norte e avançou em direção a algumas casas, sem que a agência Lusa tenha registado alguma ardida ou afetada.
Num instante, as chamas agigantaram-se e pessoas que molhavam os seus terrenos foram obrigadas a recuar.
“Fujam, fujam”, avisava uma mulher.
Nesta tarde, pela Boavista, coberta de um intenso fumo, não houve descanso possível.
“É tão difícil para a gente. Sentimo-nos impotentes”, desabafou Lúcia Lopes.