Augusto Santos Silva falava na sessão solene de abertura do ano judicial, no Supremo Tribunal de Justiça, em Lisboa, numa intervenção que dedicou à "relação de cooperação institucional" e ao "acompanhamento parlamentar da atividade dos operadores" da justiça.
Esse acompanhamento tem como "instrumento fundamental" os relatórios "provindos do Conselho Superior da Magistratura, do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, do Tribunal de Contas, da provedora de Justiça, na sua capacidade própria e como responsável do Mecanismo Nacional de Prevenção, e do Conselho dos Julgados de Paz", disse.
Depois de se referir a vários relatórios recentes destas instituições, o presidente da Assembleia da República defendeu que o seu conteúdo permite contrariar "ideias feitas" sobre a justiça portuguesa e que é "indiscutível a sua relevância para os deputados e para a cidadania".
"É caso, até, para perguntar se não podemos avançar um pouco mais, quer no universo das entidades que apresentam esses relatórios, quer nos modos da sua apreciação", considerou.
Santos Silva mencionou que "hoje só o relatório da provedora de Justiça é obrigatoriamente objeto de debate parlamentar, em comissão e no plenário" e interrogou: "Seria possível e útil pôr em prática formas de apreciação parlamentar dos demais relatórios que incrementassem a sua visibilidade e permitissem mais direta interlocução a seu respeito?"
Quanto ao universo de entidades, apontou: "Por exemplo, hoje a Assembleia da República só recebe do Ministério Público o relatório bienal de execução da política criminal. Fará sentido que receba também, direta e formalmente, a síntese anual de atividades?".
O presidente da Assembleia da República enquadrou "o acompanhamento atento da atividade dos tribunais e demais operadores judiciais" como "uma das funções parlamentares mais importantes", com a ressalva do "respeito escrupuloso pelo princípio constitucional da separação e interdependência dos órgãos de soberania".
"Da parte da Assembleia da República, posso assegurar todo o empenho para que se desenvolva este diálogo fundado na análise regular e sistemática de atividades e resultados, porque creio ser evidente a sua utilidade quer para a função representativa, fiscalizadora e legislativa própria da Assembleia, quer para a missão de administrar a justiça em nome do povo, essa nobilíssima tarefa que a Constituição comete aos tribunais", acrescentou.
Santos Silva argumentou que os relatórios de atividade dos operadores judiciais, "regulares e sistemáticos", com "dados objetivos e fontes escrutináveis", são úteis para o debate público sobre o regime de diretos, liberdades e garantias, para a elaboração e avaliação das leis e para a fiscalização dos atos do Governo e da administração pública.
Além disso, segundo o ex-ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, "oferecem uma visão de conjunto sobre realidades que, além de dinâmicas, são complexas, não podendo ser reduzidas aos aspetos mais episódicos e superficiais, mesmo se estes aspetos, por qualquer elemento de espetacularidade ou inesperado, suscitarem o interesse dos média e da opinião pública".
"Aliás, se há área que é vítima da hegemonia comunicacional das emoções mais primárias e que requer a pedagogia cívica da necessidade de abordagens racionais e sistemáticas, essa área é, sem dúvida, a justiça", observou.
A partir dos relatórios recentes dos operadores judiciais, o presidente da Assembleia da República considerou que é preciso "melhorar substancialmente a maneira como o Estado e a administração respeitam os legítimos direitos das pessoas, singulares ou coletivas" em matéria de justiça administrativa e fiscal.
Além disso, alertou para "as dificuldades que ainda enfrentam os cidadãos como titulares de direitos sociais, ou como contribuintes, sendo ainda esconsas e pedregosas as veredas que levam, designadamente, à Segurança Social, para as pessoas que mais dela necessitam – em particular, desde logo, para os imigrantes".