“Desde o primeiro momento que André Ventura foi absolutamente irresponsável nas suas declarações. Vir dizer que, de facto, se houvesse mais disparos haveria mais ordem no país ou que quem matou este cidadão devia receber uma medalha é não respeitar, sequer, a própria dor do agente, que certamente não quererá lidar para o resto da sua vida com o estigma de ter matado alguém”, defendeu Inês Sousa Real, em Espinho, no distrito de Aveiro, à margem de uma visita a um gatil.
Para a líder do PAN – que comentava as declarações do presidente do Chega, André Ventura, e do líder parlamentar deste partido, Pedro Pinto, sobre a morte de Odair Moniz, cidadão cabo-verdiano que morreu depois de ter sido baleado por um agente da PSP na Amadora -, “há que haver bom senso e responsabilidade nas palavras”.
“A par da responsabilidade criminal, que também ela tem que ser apurada, porque o Chega tem ido longe demais. E não podemos continuar a permitir tudo ao Chega por achar que se lida com a extrema-direita e com o populismo sendo tolerantes com quem é, claramente, intolerante”, salientou.
Inês Sousa Real considerou, assim, que “o Chega está, neste momento, a incendiar uma situação já de si bastante acicatada”.
Esta semana, André Ventura defendeu que o agente da PSP que baleou Odair Moniz deveria ser condecorado e Pedro Pinto afirmou, num espaço de debate na RTP, que se as forças de segurança “disparassem mais a matar, o país estava mais na ordem”.
O líder do Chega não só não condenou as declarações de Pedro Pinto, como as sustentou com a liberdade de expressão, afirmando que o líder parlamentar “quis transmitir” que “a polícia não pode ter medo de usar as suas armas” e “isso às vezes implica matar”.
Ainda sobre a morte de Odair Moniz, a porta-voz do PAN considerou “ser fundamental” que haja uma investigação ao que aconteceu.
“Mas também temos a perceção de que colocar um agente de apenas 20 anos sozinho numa missão não é a forma mais adequada de agir. O incidente, qualquer que seja o resultado da investigação, denota a falha naquilo que deve ser um processo e que deve ser na valorização e preservação e segurança de todos, a começar pelos agentes e a terminar pelos cidadãos”, disse.
E continuou: “Não pretendemos diabolizar as forças de segurança. Sabemos que possam existir, às vezes, abusos policiais e que os mesmos devem ser combatidos e erradicados em sede da instituição, mas isso não deve fazer-nos descredibilizar ou desacreditar a instituição. Por outro lado, não podemos ignorar que há mortes que não têm tido justificação e a violência policial também existe.”
Inês Sousa Real aproveitou ainda para criticar novamente o Governo (PSD/DS-PP) de Luís Montenegro por não ter inscrito verbas para a proteção animal no Orçamento do Estado para 2025, salientando que o PAN vai propor que tal seja feito na discussão do documento na especialidade.
“Para 2025, tendo em conta que o Governo veio dizer que foi um lapso e que vai tentar dar uma demão naquilo que foi claramente uma omissão e uma opção política, mas, tendo em conta a justificação dada, vamos propor até um aumento desta verba [No Orçamento do Estado para 2024 constavam 13,3 milhões de euros”, afirmou, considerando “a inflação e o aumento do custo de vida para as instituições e também autarquias”.
Odair Moniz, cidadão cabo-verdiano de 43 anos e morador no Bairro do Zambujal, na Amadora, foi baleado por um agente da PSP na madrugada de segunda-feira, no Bairro da Cova da Moura, no mesmo concelho, e morreu pouco depois, no Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa.
Segundo a PSP, o homem pôs-se “em fuga” de carro depois de ver uma viatura policial e despistou-se na Cova da Moura, onde, ao ser abordado pelos agentes, “terá resistido à detenção e tentado agredi-los com recurso a arma branca”.
A associação SOS Racismo e o movimento Vida Justa contestaram a versão policial e exigiram uma investigação “séria e isenta” para apurar responsabilidades, considerando que está em causa “uma cultura de impunidade” nas polícias.
A Inspeção-Geral da Administração Interna e a PSP abriram inquéritos, e o agente que baleou o homem foi constituído arguido.
Desde a noite de segunda-feira registaram-se desacatos no Zambujal e, desde terça-feira, noutros bairros da Área Metropolitana de Lisboa, onde foram queimados autocarros, automóveis e caixotes do lixo. Sete pessoas ficaram feridas, uma das quais com gravidade.
Lusa