Paulo Núncio, que está esta tarde a ser ouvido pela segunda vez na comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa sobre as transferências para paraísos fiscais durante o período em que foi secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, começou por referir que "as estatísticas da zona franca da Madeira foram publicadas todos os anos no Portal das Finanças, como previa a lei, de 2011 a 2015".
Em resposta ao deputado socialista Eurico Brilhante Dias, o antigo governante afirmou que as dúvidas que levantou sobre a publicação ou não publicação das transferências para ‘offshores’ "foram exclusivamente relacionadas com os dados da zona franca da Madeira, porque estes dados não incluíam os dados atualizados", acrescentando que, na altura, "pediu à AT (Autoridade Tributária) que atualizasse os dados para o ano corrente, uma vez que eles já estavam disponíveis".
Quando questionado sobre se considera que havia conflito de interesses quanto às decisões que tomou relativamente à zona franca da Madeira, uma vez que na sua atividade profissional como advogado na área fiscal ajudou na criação de mais de 100 empresas naquele território de tributação especial, Paulo Núncio respondeu: "Definitivamente não."
O antigo secretário de Estado argumentou que teve "muito cuidado" quando apresentou a lista de incompatibilidades ao então ministro das Finanças Vítor Gaspar quando assumiu funções e que essa lista "ia muito para além do que a lei estabelecia".
De acordo com Paulo Núncio, a sua lista de incompatibilidades incluía as empresas que eram clientes do escritório de que fazia parte e a quem regularmente prestava serviços, as empresas que eram clientes do escritório mas a quem não prestava serviços e também "uma cláusula final" com todas as sociedades a que prestou serviços no passado.
O deputado Eurico Brilhante Dias questionou Paulo Núncio especificamente sobre se a empresa de petróleos da Venezuela estava na lista de incompatibilidades apresentada e o ex-governante confirmou: "Incluí. Incluí todas as sociedades a quem tinha prestado serviços e dos escritórios por onde passei", afirmou.
Depois, quando questionado pelo mesmo deputado socialista sobre se sabia que a empresa de petróleos da Venezuela fazia transferências para paraísos fiscais, Paulo Núncio refutou: "Não, não tive conhecimento de nenhuma transferência".
O antigo secretário de Estado garantiu ainda que nunca esteve envolvido em qualquer operação de transferência de dinheiro para paraísos fiscais.
"Na minha atividade profissional nunca estive envolvido nesse tipo de esquemas ou de estruturas e, objetivamente, não tenho conhecimento dessas situações", reiterou.
Entre 2011 e 2015, quando o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais era Paulo Núncio, não foram publicadas as estatísticas da Autoridade Tributária (AT) com os valores das transferências para ‘offshores’, uma publicação que tinha passado a ser feita regularmente desde 2010, por despacho do então secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sérgio Vasques (último governo de José Sócrates).
As estatísticas só voltaram a ser publicadas no Portal das Finanças por decisão do atual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade, sendo que o Ministério das Finanças detetou que houve 20 declarações de operações transfronteiriças (os modelos 38, enviadas pelos bancos ao Fisco) que "não foram objeto de qualquer tratamento pela Autoridade Tributária".
Em causa estavam quase 10.000 milhões de euros que foram transferidos para ‘offshores’ sem o tratamento pela Autoridade Tributária e Aduaneira entre 2011 e 2014.