Em 17 eleições realizadas no Portugal democrático, incluindo as da Constituinte em 1975, a esquerda alcançou uma maior percentagem de votos por 12 vezes e a direita apenas cinco. O PS formou governo em 10 das 12 vezes em que a esquerda chegou à frente, tendo o PSD governado sete, duas delas com maioria de sinal contrário: no primeiro governo da AD, em 1979, e na primeira vitória de Cavaco Silva, em 1985.
O pior resultado percentual da soma dos partidos da esquerda com representação no parlamento registou-se nas legislativas de 1991, que deram a segunda maioria absoluta ao PSD de Cavaco Silva, uma eleição em que o PRD do general Ramalho Eanes desapareceu da Assembleia da República depois ter atingido os 18% em 1985.
A direita teve o seu pior resultado nas primeiras eleições após a ditadura, em 1975, para a Assembleia Constituinte, quando obteve 34%. E o maior desaire em legislativas foi em 2019, com as percentagens do PPD-PSD, CDS-PP, Chega e IL a somarem 34,6% e 86 deputados. O PSD, liderado por Rui Rio, alcançou 27,8%, o CDS-PP de Assunção Cristas registou 4,2% e o Chega de André Ventura e a IL de Carlos Guimarães Pinto tiveram 1,3% cada.
O PS de António Costa ganhou a eleição de 2019, com 36,3%, continuando a governar com o apoio parlamentar do PCP e do PEV (6,3% e 12 deputados), mas já sem o do BE (9,5% e 19 deputados). Nesse sufrágio, o Livre de Rui Tavares alcançou 1,1% e um deputado.
O maior desaire eleitoral da esquerda, com 37,9%, ocorreu em 1991, quando o PSD de Cavaco Silva alcançou a sua segunda maioria absoluta, com 50,6% e 135 deputados. Nessa eleição, a soma dos partidos da direita, neles incluído o PSN de Manuel Sérgio (o chamado partido dos reformados), atingiu 56,7% e 141 deputados. O PS era liderado por Jorge Sampaio, que viria a ser Presidente da República durante 10 anos, a coligação PCP-PEV pelo líder histórico dos comunistas, Álvaro Cunhal, e o PSR, que conseguiu 1,1% mas não elegeu qualquer deputado, por Francisco Louçã.
A soma aritmética dos resultados dos partidos à esquerda e à direita ganhou especial importância quando o PS de António Costa, depois de perder as eleições de 2015, rompeu com a tradição e decidiu governar com o apoio parlamentar do BE, PCP e PEV, dando origem a uma solução governativa que ficou conhecida como “Geringonça”.
Se, à direita, há muito que não havia obstáculos à formação de coligações desde que, em 1979, o PPD de Sá Carneiro se coligou com o CDS de Diogo Freitas do Amaral e com o PPM de Gonçalo Ribeiro Telles na formação da Aliança Democrática (AD), a esquerda só em 2015 deu esse passo para tornar mais fácil soluções de governo na sua área política.
Apesar de muitos dirigentes políticos considerarem que deixou de fazer sentido a divisão entre esquerda e direita saída da Revolução Francesa de 1789, em que os partidários do rei se sentavam à direita da presidência da Assembleia Nacional e os revolucionários à esquerda, a verdade é que a governabilidade no Portugal democrático tem sido garantida por um ou pelo outro lado do espetro político.
A novidade relativamente às legislativas de dia 10 é o crescimento do Chega, da família política da extrema-direita europeia, com o qual os outros partidos prometem não fazer qualquer acordo. Faltará saber se, com Chega ou sem ele, a maioria política penderá para a esquerda ou para a direita e que soluções de governabilidade irá permitir.
Eleições gerais – Resultados
1975 (Constituinte) – Esquerda 55,3% e 152 deputados – Direita 34% e 97 mandatos
PS 37,9% (116 deputados)
PPD 26,4% (81)
PCP 12,5% (30)
CDS 7,6% (16)
MDP 4,1% (5)
UDP 0,8% (1)
ADIM Macau 0,003 (1)
1976 (Legislativas) Esquerda 51% e 148 deputados – Direita com 40,3% e 115 deputados
PS 34,9% (107)
PPD 24,3% (73)
CDS 16,0% (42)
PCP 14,4% (40)
UDP 1,7% (1)
1979 – Direita 45,2% e 128 deputados – Esquerda 48,3% e 122 deputados
AD 45,2% (128)
PS 27,3% (74)
APU 18,8% (47)
UDP 2,2%% (1)
1980 – Direita 47,6% e 134 deputados – Esquerda 45,9% e 116 deputados
AD 47,6% (134)
FRS 27,8% (74)
APU 16,7% (41)
UDP 1,4% (1)
1983 Esquerda 54,2% e 145 deputados – Direita 39,7% e 105 deputados
PS 36,1% (101)
PPD/PSD 27,2% (75)
APU 18,1% (44)
CDS 12,5% (30)
1985 – Esquerda com PRD 54,1% e 140 deputados – Direita 39,9% e 110 deputados
PPD/PSD 29,9% (88)
PS 20,7% (57)
PRD 17,9% (45)
APU 15,5% (38)
CDS 10% (22)
1987 Direita 54,6% e 152 deputados – Esquerda com PRD com 39,2% e 98 deputados
PPD/PSD 50,2% (148)
PS 22,2% (60)
CDU 12,1% (31)
PRD 4,9% (7)
CDS 4,4% (4)
1991 Direita com PSN 56,7 % e 141 deputados – Esquerda 37,9% e 89 deputados *
PPD/PSD 50,6% (135)
PS 29,1% (72)
CDU 8,8% (17)
CDS 4,4% (5)
PSN 1,7% (1)
* A partir destas eleições a Assembleia da República passou a contar com 230 deputados, menos 20 do que nos sufrágios anteriores.
1995 – Esquerda com 52,4% e 127 deputados – Direita com 43,1% e 103 deputados
PS 43,8% (112)
PPD/PSD 34,1% (88)
CDS-PP 9% (15)
CDU 8,6% (15)
1999 – Esquerda com 55,4% e 134 deputados – Direita com 40,6 e 96 deputados
PS 44,0% (115)
PPD/PSD 32,3% (81)
CDU 9% (17)
CDS-PP 8,3% (15)
BE 2,4% (2)
2002 – Direita com 48,9% e 119 deputados – Esquerda com 47,5% e 111 deputados
PPD/PSD 40,2% (105)
PS 37,8% (96)
CDS-PP 8,7% (14)
CDU 6,9% (12)
BE 2,8% (3)
2005 – Esquerda com 58,8% e 143 deputados – Direita com 36,0 e 87 deputados
PS 45,0% (121)
PPD/PSD 28,8% (75)
CDU 7,5% (14)
CDS 7,2% (12)
BE 6,3% (8)
2009 Esquerda com 54,1% e 128 deputados – Direita 39,5% e 102 deputados
PS 36,5% (97)
PPD/PSD 29,1% (81)
CDS-PP 10,4% (21)
BE 9,8% (16)
CDU 7,8% (15)
2011 Direita com 48,3% e 132 deputados – Esquerda com 41,1% e 98 deputados
PPD-PSD 38,6% (108)
PS 28,0% (74)
CDS-PP 11,7% (24)
CDU 7,9% (16)
BE 5,2% (8)
2015 Esquerda com 50,7% e 122 deputados, PAN 1 deputado e Direita 38,5% e 107 deputados
PaF (PSD+CDS-PP) 38,5% (107)
PS 32,3% (86)
BE 10,2% (19)
CDU 8,2% (17)
PAN 1,4% (1)
2019 – Esquerda com 53,2% e 140 deputados – PAN 4 deputados – Direita com IL com 34,6% e 86 deputados
PS 36,3% (108)
PPD/PSD 27,8% (79)
BE 9,5% (19)
CDU 6,3% (12)
CDS-PP 4,2% (5)
PAN 3,3% (4)
Chega 1,3% (1)
IL 1,3% (1)
Livre 1,1% (1)
2022 – Esquerda com 51,4% e 132 deputados – PAN com 1,6% e 1 deputado – Direita com Chega e IL e CDS (que ficou fora do parlamento) 42,8% e 97 deputados
PS 41,4% (120)
PPD/PSD 29,1% (77)
Chega 7,2% (12)
IL 4,9% (8)
BE 4,4% (5)
CDU 4,3% (6)
CDS 1,6% (pela primeira vez não elegeu deputados)
PAN 1,6% (1)
Livre 1,3% (1)
Lusa