"É muito mais provável que Johnson ganhe do que perca”, afirma à Agência Lusa Tony Travers, politólogo da universidade London School of Economics (LSE).
Já Robert Ford, da Universidade de Manchester, admite que “a barragem pode rebentar” esta tarde, quando Johnson for sujeito a uma moção de censura [“vote of no confidence”] enquanto líder do Partido Conservador, após dezenas de deputados terem manifestado descontentamento.
Graham Brady, presidente do grupo parlamentar Conservador, também conhecido por Comité 1922, declarou esta manhã ter sido ultrapassado o patamar de 45 subscritores da moção para desencadear o processo.
A votação terá lugar na Câmara dos Comuns entre as 18:00 e 20:00 horas e o resultado será declarado pouco depois. O voto é secreto e o resultado é determinado por maioria simples, equivalente a 180 votos.
Esta é uma moção de censura interna no partido e não no Parlamento, pelo que só os 359 deputados conservadores podem participar.
Se Johnson ganhar, permanecerá como líder do partido e terá um ano de imunidade contra novas moções de censura, mas uma derrota abrirá caminho a uma eleição interna para encontrar um sucessor, na qual o atual primeiro-ministro não poderá concorrer.
A história é favorável ao primeiro-ministro conservador, pois outros antecessores sobreviveram a moções de censura: Margaret Thatcher em 1989 e 1990, John Major em 1995 e Theresa May em 2018.
Johnson tem também do seu lado, pelo menos teoricamente, entre 160 e 170 deputados que têm cargos ligados ao Governo, de acordo com uma estimativa do centro de estudos Institute for Government.
Este nível é próximo do necessário para ganhar, mas ainda assim o professor de Ciência Política na Universidade de Manchester, Robert Ford, sugeriu hoje na rede social Twitter que o número de votos contra Johnson poderá ser mais numeroso do que o previsto.
"Muitos deputados tiveram de engolir, e defender publicamente, uma série de disparates vergonhosos durante mais de seis meses. Eles sabem que o primeiro-ministro já não é popular. Eles sabem que ele não vai mudar. A barragem pode rebentar”, escreveu.
Nicholas Dickinson, politólogo na Universidade de Oxford, concorda com Tony Travers e defende que o resultado mais provável será uma vitória para Johnson.
"Muitos conservadores ainda são leais a Johnson, outros que não estão satisfeitos receiam o que poderá vir a seguir e temem o impacto de uma eleição de liderança fraturante”, vincou, em declarações à Lusa.
Porém, acrescentou, "uma vitória não significa que ele fica livre de problemas”, e a margem do triunfo poderá ter significado.
Margaret Thatcher e Theresa May ganharam desafios à liderança, com 54% dos votos em 1990 e 63% em 2018, respetivamente, mas ambas cederam à pressão para se demitirem poucos meses depois.
"Se mais de um terço (cerca de 120) dos deputados votarem contra o primeiro-ministro, corre-se o risco de a instabilidade continuar nos próximos meses”, explicou Tony Travers, professor de política na LSE, para quem é "evidente que uma minoria substancial de deputados conservadores perdeu a confiança em Boris Johnson”.
Os analistas políticos britânicos apontam para as duas eleições parlamentares parciais nas circunscrições de Wakefield e de Tiverton and Honiton, em 23 de junho, como o próximo grande teste para os conservadores, que poderá provocar novas tentativas para o derrubar antes das próximas eleições legislativas, previstas para 2024.
O professor da Universidade de Sheffield, Matthew Flinders, considera que a moção de censura mostra que a liderança de Johnson "está presa por um fio e que o partido parlamentar chegou ao limite em termos de poder apoiar um primeiro-ministro que agora é claramente visto como não sendo de confiança pela população”.
Sondagens recentes da empresa Opinium indicam que 56% dos britânicos estão insatisfeitos e querem que o chefe do Governo se demita, descontentamento refletido nos apupos na sexta-feira em Londres à entrada de uma cerimónia para celebrar os 70 anos de reinado da rainha Isabel II.
Ainda assim, Flinders não arrisca no prognóstico pedido pela Lusa.
“Tal como tudo o que tem a ver com Boris Johnson, nunca se sabe realmente o que vai acontecer. A minha perceção é que será uma decisão clara: ou os deputados conservadores vão apoiá-lo ou vão revoltar-se em massa e marcar o fim do mandato”, respondeu.
Independentemente de sobreviver à moção, Boris Johnson sai enfraquecido, afirma o diretor do centro de estudos UK in a Changing Europe, Anand Menon, porque a desunião dá aos partidos da oposição o argumento de que até os próprios deputados não acham que ele deve ser primeiro-ministro.
“Ele perdeu o brilho entre os apoiantes e as pessoas estão preocupadas que ele já não seja um ativo eleitoral”, resumiu à Lusa.
Sobre o resultado desta tarde, Menon acredita que está tudo em aberto num partido dividido entre a animosidade contra o exuberante líder conservador e aqueles que preferem estabilidade numa altura de crise económica e em plena guerra na Ucrânia.
“Quem quer que diga que sabe o que vai acontecer está a mentir. É impossível saber”, confessa.