Svetlana Mihashvili, 42 anos, vivia no centro da cidade de Odessa, uma cidade costeira ucraniana, nas margens do Mar Negro, e assim que ouviu os primeiros bombardeamentos juntou-se à irmã e fugiram para perto dos pais, no campo.
“Pensávamos que ficávamos apenas por uns dias e que rapidamente a situação passava, mas depois percebemos que Odessa poderia ser uma das primeiras cidades a ser atacada e foi aí que decidimos fugir com os nossos filhos”, contou à Lusa.
Svetlana fugiu para a Moldova com o filho de 9 anos, a irmã, o cunhado – nos primeiros dias da guerra ainda não havia restrições à circulação dos homens – e o sobrinho de seis meses.
As primeiras noites em Chisinau, a capital moldova, foram passadas num hotel, depois ficaram em casa de uns amigos, mas assim que arranjaram trabalho junto da agência das Nações Unidas para os Refugiados (UNHCR, na sigla em inglês) procuraram uma habitação para “não incomodar”.
“Sinto falta de casa e lamento por todas as pessoas que estão a sofrer e a morrer e estou preocupada com os meus pais, que ficaram lá, e com os meus outros familiares, mas também estou muito contente por poder ser útil porque nos primeiros dias depois de chegar sentia-me um pouco culpada por deixar as outras pessoas para trás e não as ajudar”, contou.
Disse que assim que conseguiu a oportunidade de trabalhar para a UNHCR passou a sentir-se muito melhor, mas admitiu também que é um trabalho “muito difícil”, no contacto com tanta “gente aflita e angustiada” e em ter de lidar com “as histórias terríveis” que trazem para contar.
Svetlana dá apoio num centro de acolhimento para refugiados na cidade de Chisinau e é lá que contou à Lusa alguns dos casos que já testemunhou, como o de uma mulher mais velha que nos primeiros dias no centro ficava sentada, imóvel, a um canto.
“Depois de alguns dias, ela já estava melhor e começou a contar a sua história e que lhe tinha morrido o neto, sendo que umas vezes tinha três anos, noutras tinha cinco. Ela estava muito confusa e angustiada e é sempre difícil ouvir estas histórias”, admitiu.
“Hoje tivemos um homem que se sentou na cadeira e simplesmente começou a chorar. É tão doloroso ver estas pessoas, as suas lágrimas e ouvir as suas histórias”, reconheceu.
Admitiu também a dificuldade em reconhecer a sua história nas histórias dos outros e de como também ela precisaria de apoio psicológico para lidar com o trauma, mas disse imediatamente que agora não tem tempo para isso, está ocupada a trabalhar e quando chega a casa há crianças para cuidar.
“Trabalhar ajuda-me a não pensar nos meus problemas o dia todo, a não ouvir as notícias o dia todo. Estou ocupada a ajudar e isso ajuda-me a distrair-me dos meus problemas”, apontou.
O centro de acolhimento onde Svetlana dá apoio tem capacidade para cerca de 250 pessoas e é um dos 103 espalhados por toda a Moldova para acolhimento de refugiados, apesar de praticamente 90% dos ucranianos que permanecem na Moldova serem acolhidos por famílias ou terem meios para alugar uma casa.
No total, entre 3 mil a 3.500 pessoas estão atualmente nestes centros, onde recebem três refeições quentes por dia, têm acesso a cuidados médicos ou assistência específica para mães e crianças, e onde podem ficar para lá das 72 horas inicialmente definidas.
Francesca Boneli, uma das responsáveis da UNCHR no local, explicou que o trabalho desta agência das Nações Unidas se divide em várias fases, desde o apoio dado nas fronteiras ao acolhimento nos centros, acrescentando que uma terceira componente passa pelo apoio financeiro que é dado diretamente aos refugiados.
Através de um registo que pode ser feito presencialmente ou ‘online’, cada refugiado tem direito a um montante mensal de 120 dólares (110 euros) que é dado em cartão. No caso de uma família composta por uma mãe e dois filhos, por exemplo, significa dizer que recebe 360 dólares (331 euros) por mês para gastar como quiser, o que é encarado também como uma forma de apoiar a economia local, já que o cartão só funciona na Moldova.
Atualmente, cerca de 12 mil pessoas beneficiam deste valor pago em cartão.
Segundo o coordenador da ajuda humanitária europeia de emergência, Yorgos Kapranis, este programa tem uma duração de seis meses e está a ser financiado através dos 8 milhões de euros que a Comissão Europeia destinou para programas na Moldova de apoio a civis que fugiram da guerra na Ucrânia.
O valor global serve não só para financiar o programa dos cartões, mas também para assistência alimentar, acesso a água potável, assistência médica, apoio psicológico, abrigos ou proteção.
Nas declarações aos jornalistas, Yorgos Kapranis aproveitou também para alertar para o “impacto severo” da guerra na saúde mental das pessoas refugiadas.
“Elas não esperavam estes ataques tão rápidos e testemunhar um nível tão elevado de violência tão abruptamente”, apontou o responsável, sublinhando que a maioria são mulheres, crianças e pessoas idosas.
Svetlana também não estava à espera de ter de deixar os pais e abandonar a Ucrânia e até há bem pouco tempo acreditava que iria ficar na Moldova pouco tempo e que a guerra iria terminar rapidamente, pelo que não valia a pena fugir para muito longe.
Mas agora que não vê o fim ao conflito, as prioridades mudaram e os planos para o futuro são outros: “Penso sair do país se isso for melhor para o meu filho".