A Ribeira Seca recebeu ontem o bispo do Funchal, Nuno Brás, cerca de um mês após este ter revogado a suspensão ‘a divinis’ do padre da paróquia, Martins Júnior, decretada em julho de 1977.
A visita culmina igualmente um período de quase meio século, durante o qual a igreja não teve visita alguma do seu "pastor diocesano", o bispo do Funchal.
A paróquia tinha sido retirada a Martins Júnior, em 1974, pelo então bispo do Funchal, Francisco Santana, que decretou mais tarde a proibição de o padre administrar sacramentos (suspensão ‘a divinis’), situação mantida pelos seus sucessores na diocese do Funchal — os bispos Teodoro de Faria e António Carrilho –, mas revogada no passado mês de junho, por Nuno Brás, que tomou posse em fevereiro.
Ontem, o novo bispo do Funchal foi "recebido apoteoticamente" pelo povo de Ribeira Seca, que entoava "bem se desejou e esperou por este dia", em que o responsável da diocese visitasse a paróquia.
"Sempre que passava na via rápida, olhava para Ribeira Seca e pensava: ‘Deus me dê a graça de um dia poder celebrar com aqueles cristãos’, e hoje é esse dia. Quero saudar-vos a todos, cristãos da Ribeira Seca", disse o bispo, na eucaristia da Festa do Santíssimo Sacramento, que celebrou na igreja, construída pelos paroquianos.
O padre Martins Júnior lembrou, por seu lado, tinham transcorrido 50 anos, sem que o templo, "feito com suor, com a força e o sacrifício desta comunidade" recebesse o seu pastor diocesano — "não por sua culpa” –, como "um pai, como um amigo, como um irmão e não como um juiz".
O bispo do Funchal assinou, no passado dia 16 de junho, o decreto de remissão da pena de suspensão ‘a divinis’ do padre José Martins Júnior, nomeando-o em simultâneo administrador da Paróquia da Ribeira Seca, pelo período de dois anos, "com todos os direitos e deveres previstos no Código de Direito Canónico".
Martins Júnior ficou conhecido pela sua militância social e política, tendo sido eleito, pela antiga União Democrática Popular (UDP), primeiro, e pelo PS, depois, como presidente da Câmara do Machico e deputado regional. Criou ainda associações como a União das Bordadeiras e a Cooperativa Povo Unido, mobilizando o apoio da população local.
Nascido em 1938, Martins Júnior, formado em Humanidades, Filosofia e Teologia, foi ordenado padre em 15 de agosto de 1962, na Igreja Matriz de Machico e, sete anos mais tarde, nomeado pároco da Ribeira Seca.
Em 1975, presidiu a Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Machico e, em 1976, foi eleito deputado à Assembleia Legislativa Regional, como independente, nas listas da UDP, lugar que acabou por ceder a um operário da construção civil. Em 1980, recandidatou-se e foi eleito deputado.
Em 1985, a igreja da Ribeira Seca foi tomada de assalto pela polícia, a pedido do Governo Regional e da diocese.
Nas autárquicas de 1989, foi eleito presidente da Câmara de Machico, tendo cumprido o segundo mandato até 1998.
Em 1995, recebeu do Presidente da República Mário Soares as insígnias de comendador.
Em 1997, foi eleito deputado independente, nas listas do PS, à Assembleia Legislativa Regional, onde permaneceu até 2007.
Em julho de 2009 teve de responder no tribunal da comarca de Santa Cruz, num processo interposto pelo Governo Regional, pela acusação de "exercício ilegal de sacerdócio", de que viria a ser absolvido.
Em 2010, a diocese do Funchal proibiu a visita da imagem peregrina de Fátima à igreja da Ribeira Seca, por entender que a paróquia estava "indevidamente ocupada", por um padre suspenso.
O padre Martins Júnior nunca deixou de exercer o sacerdócio "em consonância com o povo de Deus da Ribeira Seca", como sempre afirmou.
C/Lusa