"Já mudou e, graças a isso, temos cada dia mais pessoas interessadas em falar a língua portuguesa, porque, de facto, o preconceito era um dos fatores que obstaculizavam a divulgação da língua. As pessoas achavam mesmo que não valia a pena aprender português, porque era uma língua de segunda [categoria]", disse Digna Tovar à agência Lusa.
Digna Tovar, venezuelana que há 18 anos é professora de português na Universidade Central da Venezuela, falava à margem do início das atividades que durante uma semana vão assinalar o 25.º aniversário daquele departamento.
"25 anos diz-se muito rápido, mas tem sido uma luta (…). O preconceito contra a língua portuguesa era muito forte. Lembro-me que me perguntavam se ia aprender português para falar com os padeiros", declarou.
Digna Tovar referiu que na Venezuela os comerciantes, donos de padarias, de sapatarias, de mercearias e supermercados são portugueses e contra eles havia muito preconceito.
"Eu dizia ‘vou estudar português porque gosto da língua, porque o meu marido é português’", explicou, acrescentando de imediato que o conheceu "um ano antes de iniciar os estudos de português” e que ele foi a sua “motivação principal".
Digna Tovar ganhou uma bolsa de estudos do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua e fez uma pós-graduação de um ano em Português como Língua Estrangeira no Porto.
"Os portugueses são pessoas muito esforçadas. Essa é uma qualidade que é inata (…). Em Portugal encontrei um mundo diferente dessa imagem que tínhamos de Portugal, de um país provinciano, pequeno, pobre e de pessoas praticamente analfabetas. Encontrei profissionais muito qualificados, um país em desenvolvimento. Para mim a melhor demonstração de que aquela imagem era ingrata, foi ir lá, conviver com eles, durante um ano inteiro. Foi o ano mais lindo da minha vida", garantiu
A professora adiantou que o Departamento de Português da Universidade Central da Venezuela está a passar por "um momento complicado, difícil, dada a situação de crise” neste país e nas suas instituições de ensino superior.
"No entanto, depois de 25 anos, o Departamento de Português está a ser revisitado, revisto, estamos a reinventar coisas, a explorar coisas novas, porque já vivemos muitas experiências positivas. Temos tido imenso apoio do instituto Camões, da Embaixada de Portugal, eles têm sido os nossos aliados e têm-se empenhado em formar não só lusodescendentes, mas também venezuelanos puros como eu", destacou.
Sobre os estudantes, considerou que “querem aprender” e “sabem que há imenso trabalho, que há imensas oportunidades com o português neste momento".
"O nosso departamento também sabe disso e está a fazer um trabalho de divulgação, promoção, de motivação dos estudantes a aprenderem bem a língua portuguesa e a ensinarem o que aprendem. As perspetivas são de continuar a ensinar a língua portuguesa, aprofundar o nosso conhecimento e reativar a Cátedra Fernando Pessoa, que funciona na Escola de Letras da Universidade Central da Venezuela", declarou.
Digna Tovar acrescentou que este departamento da Universidade Central Venezuelana tem projetado a língua portuguesa para fora da instituição, exemplificando com um projeto que permite a estudantes hispano falantes trocarem experiências em português.
"Há um intercâmbio de aprendizagem, uma troca em língua portuguesa sobre a Argentina e a Venezuela. Estudantes hispano falantes cujo vínculo é o português”, realçou.
Realçando que o Departamento de Português da universidade está "ao dispor de toda a comunidade portuguesa", a docente acrescentou que o que deseja é ver que “a língua portuguesa seja cada dia mais estudada e falada nesta Venezuela que precisa tanto de profissionais que queiram ajudar e cooperar com o desenvolvimento”.
Do programa de celebração do 25.º aniversário do Departamento de Português da Universidade Central Venezuela fazem parte, entre outras iniciativas, uma conferência sobre "Portugal hoje", um concerto de fado, uma mesa redonda sobre erros e dificuldades mais comuns na aula de português como língua estrangeira e uma conversa sobre “Ensaio sobre a Cegueira”, de José Saramago.
LUSA