"A Venezuela está sempre em mudança e não precisamente para melhor. Muitas coisas mudaram nos últimos meses. Ele vai encontrar um país onde agora as pessoas pensam para fazer coisas que antes pareciam insignificantes, como tomar um café, devido aos altos preços e à inflação que se agravou depois da reconversão monetária", explicou um português à agência Lusa.
Manuel Ferreira Santos, 50 anos, comerciante, percebe que nos últimos anos "a situação agravou-se aceleradamente na Venezuela e não apenas do ponto de vista político".
"Principalmente no económico e no social. Cada vez há mais pessoas a passar fome e, no caso de portugueses, a esconderem que estão a passar fome, porque têm vergonha que se saiba, porque emigraram para ter sucesso e alguns deles até tiveram, mas a crise acabou com as reservas, com a qualidade de vida e aumentou a insegurança", frisou.
Em Caracas, a partir de hoje, os dois secretários de Estado das Comunidades Portuguesas, José Luís Carneiro, e Rosa Valente de Matos, da Saúde, preveem iniciar a visita com uma reunião com os conselheiros das comunidades portuguesas e integrantes da Associação de Médicos Luso-venezuelanos (Assomeluve), organismo responsável pela Rede Portuguesa de Assistência Médica e Social.
A propósito da realidade que espera o governante português, a doméstica Isabel Martins, 62 anos, diz estar muito preocupada por "não ter sinais de que a crise mude rapidamente", mas também "porque muitos amigos, pessoas conhecidas e familiares foram embora (emigraram)".
"Só nós, os velhos, é que ficamos, porque não há hipóteses para recomeçar de novo, em Portugal ou noutro sítio. Estamos cuidando da casa, os negócios, e os filhos agora são os que emigram", disse.
Recorda que "é uma situação dolorosa", ao "reviver os tempos em emigrou de Portugal, mas noutras condições e noutros tempos".
"Quando emigrámos acreditávamos que era o melhor e pensávamos ajudar a família. Agora temos dúvidas se voltaremos a reencontra-nos com os filhos que estão sendo forçados, pelas circunstâncias, a emigrar", frisou Isabel Martins, que tem três filhos emigrados, o Carlos, no Chile, Marlene, em Espanha, e Juan, na Argentina.
Em quase todas as conversas com portugueses, predominam os assuntos económicos, inclusive entre alguns dos mais "acomodados", que de repente viram as suas poupanças "minimizadas" com a desvalorização local da moeda e até mesmo com "problemas em bancos portugueses".
"É preocupante, porque começámos a ver até inflação em dólares. As casas, os produtos, os serviços estão a ser cotados em dólares porque o bolívar está constantemente a desvalorizar-se, mas o que hoje custava 10 dólares, amanhã já tem outro preço, é uma espécie de corrida contra o tempo", explicou um luso-descendente.
Técnico em informática e comerciante, Miguel Freitas, diz precisar "de dois empregos" para poder manter a mulher e uma criança de três anos. Já pensou emigrar, mas não consegue "juntar algum dinheiro para não chegar a Portugal ou a outro país com as mãos a abanar".
Um pouco por todo o país, são conhecidos casos de famílias de portugueses, sobretudo idosos que dependem de ajuda económica dos filhos e familiares, que enfrentam dificuldades para conseguir medicamentos para a hipertensão ou a diabetes, que muitas vezes são escassos no país ou que chegam a preços proibitivos à Venezuela.
Além de Caracas, José Luís Carneiro e Rosa Valente de Matos manterão reuniões com portugueses nas cidades de Barcelona, Barquisimeto, Valência e Maracay.
Estão igualmente previstos encontros com as autoridades locais e embaixadores da União Europeia em Caracas.
Integram a comitiva portuguesa o secretário Regional de Educação da Madeira, Jorge Carvalho, que possui a tutela das comunidades madeirenses, o diretor-geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas, Júlio Vilela, e o vice-presidente do Instituto de Emprego e Formação Profissional, Paulo Feliciano.
LUSA