“Do ponto de vista psicológico, a sobrecarga desta época pode ser considerada muito elevada. Vários jogadores têm manifestado essa perspetiva”, diz à agência Lusa a investigadora e docente no Instituto Politécnico de Setúbal Liliana Pitacho.
A especialista em saúde mental neste campo lembra que, em competição, o organismo de um futebolista “funciona quase como uma máquina altamente sincronizada”, com ”grande alteração a nível hormonal, de neurotransmissores, algumas enzimas no corpo que servem para aumentar a performance e maximizar a condição física para aquele momento”.
“Estamos a falar de situações como o aumento do nível de adrenalina, cortisol, endomorfinas. Isto precisa de ser metabolizado pelo corpo. São positivas, no momento da competição, mas deve haver um momento seguinte, de repouso, para que o organismo as possa metabolizar”, refere.
Liliana Pitacho explica que quando os atletas são colocados “de três em três dias em elevados níveis de competição”, aumentando-lhes os níveis de cortisol no sangue, a endomorfina, o organismo “não tem tempo suficiente para metabolizar”, criando sobrecarga.
“Pode gerar situações de maiores níveis de ansiedade, desproporcional, fora dos períodos de competição, à fadiga mental, que pode conduzir a ‘burnout’ e depressão. Em termos comportamentais, também se alteram padrões. Ao falarmos de fadiga emocional e fadiga psicológica, há recursos que ficam diminuídos, como a concentração, a capacidade de tomada de decisão”, avisa.
Dadas estas questões, os atletas ficam mais suscetíveis a lesões físicas como situações “de fadiga emocional, mas também ‘burnout’ e situações de caráter depressivo”, não falando do impacto de estar de fora durante uma lesão, por exemplo.
“Já assistimos a atletas falarem da fadiga mental para se retirarem. A continuar a este ritmo, e percebo que se tornou um negócio, jogos com muita frequência geram um bom equilíbrio para clubes e federações, mas a grande questão é que este cansaço mental pode ser real, e os atletas já estão a perceber isso”, atira.
As famílias têm, então, “um peso relevante”, até pelo efeito químico que as rotinas, o descanso e o tempo fora do trabalho têm na “predisposição para a competição”.
“A ausência de laços, o afastamento repetitivo e muito próximo dos entes próximos, seja família ou amigos, leva a uma alteração química, a redução da oxitocina, a hormona do vínculo”, acrescenta.
Assim, muitas vezes é esquecido “que a parte mental vai afetar a física”, sem conseguir desvincular-se uma da outra. Por exemplo, afirma, níveis elevados de cortisol levam não só a maior ansiedade ou stress, mas também “maior rigidez muscular”.
Por outro lado, lembra à Lusa o nutricionista do FC Porto Mário Fernandes, também a nutrição “tem um impacto muito importante na recuperação”.
Aumentando a sobrecarga, alerta, muitas vezes os jogadores estão a braços com apenas três dias de recuperação, obrigando a que a alimentação e a suplementação “seja o mais otimizada possível”, até pelas muitas componentes de alta intensidade, como ‘sprints’, mudanças de direção e saltos, que o futebol acarreta.
Assim, são de maior importância os ‘bons e velhos’ hidratos de carbono, necessários para “repor as reservas de glicogénio muscular, a energia que os jogadores utilizam durante um jogo”.
Esta energia “esgota-se quase totalmente em muitas fibras musculares”, um fator exacerbado pelo aumentar de jogos, e aí o consumo alimentar a seguir a jogos tem de ser muito forte neste tipo de alimentos.
Os batidos e a suplementação também fazem parte da ‘dieta’, forte em frutas e hortícolas, bem como concentrados de fruta, o “efeito positivo” da creatina, não só na recuperação muscular “como também para repor o glicogénio”, o ómega 3 ou a vitamina C.
“Nos próximos anos, pode haver algo mais a fazer, principalmente a nível de suplementação. Saem cada vez mais suplementos novos, focados na recuperação do atleta. A nutrição acaba por se adaptar, e a presença do nutricionista é cada vez mais uma realidade”, lembra.
Nesse campo, com épocas de “sobrecarga nunca antes vista, sobretudo para jogadores internacionais”, também a hidratação ganha outro peso, sobretudo por afetar a performance.
“Temos estratégias para monitorizar isto, principalmente através do controlo do peso dos atletas. Sabemos que têm redução do peso após o jogo, procurámos que recuperem o peso ideal depois”, remata.
Lusa