Para que fosse possível cumprir com o desígnio, de navegar debaixo do gelo, foi necessário um intenso período de preparação e estudo, em que a guarnição quase que teve que “reaprender” a operar o navio, uma vez que a navegação submarina nas altas latitudes apresenta condições ambientais, sonoras e perigos à navegação, como a existência de Icebergs e gelo solto obrigando assim a adaptar muitos dos normais procedimentos e técnicas normalmente usadas pelos submarinos, quando a navegar em latitudes mais baixas.
Após largar, acompanhado pelo HDMS Ejnar Mikkelsen, o submarino iniciou trânsito para norte e no dia 29 de abril começou a escrever mais uma página, na já significativa história dos submarinos da classe “Tridente”, iniciando com a passagem pelo mítico paralelo 66º33’N, que marca a fronteira do Círculo Polar Ártico, algo que à semelhança da passagem do Equador, é uma marca relevante para todos os marinheiros, e esta marca ainda não tinha sido alcançada pelos submarinistas portugueses.
Ao alcançar a posição de início da primeira fase da missão, já com a placa de gelo à vista no horizonte e bastante perto da Marginal Ice Zone (MIZ), zona de mistura entre a placa de gelo e o mar aberto, caracterizada por ter diversos fragmentos de gelo solto à deriva, foi tempo de fechar a escotilha e entrar em imersão, para iniciar a aventura de navegar debaixo da placa do gelo Ártico, e confirmar todo o estudo e preparação dos últimos meses.
Passados alguns minutos do início do planeamento eram cada vez mais evidentes os sinais de que o navio se encontrava muito perto da placa de gelo. Desde as diferenças de temperatura, entre 0 e -2 ºC à superfície e de 2 a 5 ºC em cotas mais profundas, ao aumento significativo quer em tamanho, quer em quantidade, dos pedaços de gelo à deriva (possíveis de detetar nos diversos sensores de bordo, sonares ativos e passivos).
Umas das particularidades de navegar nesta zona, é inicialmente o aumento significativo do ruído ambiente na MIZ, devido à forte presença de vida marinha e ao gelo bater e partir, seguido de uma diminuição acentuada do ruído ambiente, passando ao silencio, sinal de que já nos encontrávamos mesmo debaixo da placa de gelo.
O “feito” inédito, do NRP Arpão se encontrar a navegar em imersão profunda com um teto de gelo, confirmado pelos sonares ativos e sonda, trouxe a todos os elementos da guarnição um sentimento de expectativa realizada, que justificava todo o tempo e a dedicação empenhados na preparação da missão estavam a começar a pagar os dividendos, ampliado ainda com a presença de SEXA ALM CEMA no Combat Information Center (CIC).
Depois de 39h 30min em imersão profunda sob o gelo, o navio cruzou novamente a MIZ para leste e regressou à superfície com o sentimento de missão cumprida, mas haveria ainda mais…
A OPERAÇÃO ÁRTICO 2024 contou com o apoio de Marinhas aliadas nomeadamente, a US NAVY, através do Artic Submarine Lab (ASL), e das Marinhas da Dinamarca e Canadá, fazendo jus às boas relações bilaterais entre a Marinha e os diversos parceiros internacionais, fortalecendo assim a coesão da Aliança Atlântica, no seu trabalho combinado e num momento de elevada instabilidade mundial, onde os valores da democracia e o respeito pelas regras Internacionais estão a ser colocadas em causa.
Com a conclusão desta missão o NRP Arpão tornou-se, se não no primeiro, num dos muito poucos submarinos convencionais a navegar debaixo do gelo, uma área normalmente reservada aos submarinos de propulsão nuclear. Permaneceu debaixo da placa de gelo num total de cerca de quatro (4) dias, tendo também explorado a operação na Marginal Ice Zone , com grande densidade de gelo solto, zona essa com elevado valor tácito, área em que nenhum outro submarino do ocidente se atreveu a operar, desde a II grande Guerra, com total sucesso.
Importa relembrar que no ano 2023 o Arpão navegou 212 dias, atravessou o Atlântico duas vezes, esteve presente em sítios tão longínquos como o Rio de Janeiro, no Brasil e a Cidade do Cabo, na África do Sul, e ainda terminou o ano operacional com uma patrulha no Mediterrâneo