"De tempos a tempos ele vem aqui, a Machico. É boa pessoa, sim", disse à agência Lusa Fátima Vítor, natural daquela cidade, afirmando que conhece o novo cardeal, nomeado pelo Papa no domingo, "desde pequeno", bem como "toda a sua família".
Este é, de resto, um conhecimento comum à maioria da população da cidade de Machico, sobretudo a que vive e circula nas zonas centrais, como a praça em frente da igreja matriz e o largo do Senhor dos Milagres, onde é raro encontrar uma pessoa que não saiba do percurso de José Tolentino Mendonça e da sua família.
O cardeal, que toma posse a 05 de outubro, nasceu ali em 1965 e pouco depois a família mudou-se para Angola, tendo vivido a infância no Lobito, onde o pai era pescador.
A revolução de 1974 e consequente independência de Angola trouxe-os de volta à Madeira, indo a família morar no forte de São João Baptista, na ponta este da baía de Machico, que durante anos foi residência de um grupo de retornados de África.
José Tolentino Mendonça ingressou no seminário, no Funchal, aos 11 anos, iniciando assim um percurso que o fez sacerdote, mas também poeta e professor, humanista e homem de cultura, conforme realça João Henrique Silva, antigo professor e seu amigo.
"Eu destacaria grandes qualidades humanas no sentido da capacidade de estar com os outros, na atenção, a atenção dada às pessoas e a cada qual que está diante dele", disse à agência Lusa, vincando a "enorme sensibilidade" do novo cardeal para "perceber e compreender o outro" e assim "fazer passar na palavra, no diálogo, algo que nos toca".
João Henrique Silva recebeu, por isso, a notícia da nomeação de José Tolentino Mendonça com "muita satisfação", sublinhando que a escolha do Papa Francisco foi de "grande acerto".
"De vez em quando há notícias no contexto da Igreja que nos enchem de grande esperança para o futuro e que nos fazem, porventura, acreditar no sentido das coisas e na missão evangelizadora da Igreja", disse.
José Tolentino Mendonça, arquivista e bibliotecário da Santa Sé, é o sexto cardeal português do século XXI e era vice-reitor da Universidade Católica quando foi convidado por Francisco para pregar o retiro de Quaresma da Cúria Romana, em 2018, ano em que foi ordenado bispo, no Mosteiro dos Jerónimos.
"Ficamos surpresos pela ascensão meteórica de D. Tolentino", afirmou à agência Lusa o presidente da Câmara Municipal de Machico, Ricardo Franco, sublinhando que o município recebeu a notícia da nomeação "com muita alegria, muita satisfação, muito orgulho também".
"É um cidadão de Machico, nasceu cá, é um filho da terra, é um filho de gente humilde, filho de pescadores, e isso diz muito bem aquilo que representa muitas vezes, até não só para a sua família, mas para a população em geral, ter alguém de origens muito humildes e chegar a um estatuto tão elevado dentro da Igreja", afirmou.
Ricardo Franco indicou que a autarquia vai apresentar um voto de congratulação pela decisão do Papa e, num "futuro próximo", vai equacionar um outro género de homenagem, que poderá passar pela atribuição do nome do cardeal a uma rua ou praça da cidade.
"D. Tolentino encarna a paz, a sabedoria, a inteligência, é alguém que nos diz muito, é de facto um grande representante de Machico, da Madeira e de Portugal no Vaticano", declarou, vincando que é uma "figura incontornável", simultaneamente "homem do povo" e "grande humanista".
No poema escrito na parede do edifício, na cidade de Machico, José Tolentino Mendonça diz que por ali "os pescadores cruzam ainda linhas, um "gesto masculino de apagar a dor", e, por outro lado, recorda o tempo em que as bordadeiras se sentavam à porta e "ficavam sempre a sorrir" nas fotografias dos estrangeiros.
"Conheço-o desde pequeno, tenho muito boa impressão dele, muito boa pessoa", sublinhou Fátima Vítor. E foi-se embora a dizer que concorda com a opinião geral: o cardeal José Tolentino Mendonça não esqueceu a sua terra, nem a sua origem.
O Papa Francisco anunciou no domingo, após o ‘Angelus’, que o arcebispo português Tolentino de Mendonça vai ser criado cardeal em 05 de outubro.
O também bibliotecário do Vaticano junta-se aos outros atuais cardeais portugueses José Saraiva Martins, Manuel Monteiro de Castro, Manuel Clemente e António Marto, os dois últimos com direito de voto num eventual conclave para a eleição do Papa, tal como sucederá com Tolentino Mendonça.
O consistório para a criação dos novos cardeais está agendado para 05 de outubro.
C/ LUSA