O Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decidiu ontem levar a julgamento os 19 militares acusados no processo do 127.º curso de Comandos, no qual morreram os recrutas Dylan da Silva e Hugo Abreu.
“Nesta fase processual, os indícios são muito fortes para não pronunciar os arguidos (não levar a julgamento). Por isso pronuncio-os”, disse a juíza de instrução criminal (JIC) Isabel Sesifredo, durante a leitura da decisão instrutória, na qual estiveram presentes os arguidos fardados.
Dylan da Silva e Hugo Abreu, ambos com 20 anos à data dos factos, morreram enquanto vários outros instruendos sofreram lesões graves e tiveram de ser internados, na sequência de uma prova do 127.º curso de Comandos, que decorreu na região de Alcochete, distrito de Setúbal, a 4 de setembro de 2016.
A juíza Isabel Sesifredo considerou estarem em causa crimes estritamente militares, pois foram cometidos em contexto militar e contra militares, ao contrário do que pediam os advogados dos arguidos, que defenderam tratar-se de crimes ‘civis’, o que a concretizar-se, os respetivos constituintes teriam um enquadramento legal mais vantajoso.
Os advogados apresentaram durante a fase de instrução requerimentos a pedirem a nulidade da acusação do Ministério Público (MP), mas a JIC negou provimento a todos eles, justificando que “é flagrante que a acusação “tem todos os requisitos, é minuciosa e pormenorizada em relação aos factos” e que, por isso, “não há que declarar qualquer nulidade”.
A leitura da decisão instrutória estava agendada inicialmente para 6 de março, mas a juíza de instrução criminal Isabel Sesifredo, responsável pela instrução – fase facultativa que visa decidir levar ou não os arguidos a julgamento – remarcou a sessão para as 11:00 de segunda-feira “devido à extensão do processo”, disse anteriormente à agência Lusa fonte judicial.
Nas alegações finais desta fase instrutória, a procuradora do MP, Cândida Vilar, manteve, na íntegra, o despacho de acusação por si proferido, razão pela qual pediu à juíza que levasse todos aos militares a julgamento.
“Trata-se de crimes cometidos por militares contra militares durante uma prova do curso de Comandos. [Os arguidos] Abusaram dos deveres funcionais e da disciplina militar. Provocaram graves lesões físicas e neurológicas nos ofendidos e, em duas situações, a morte de dois subordinados”, sustentou, a 1 de fevereiro, a procuradora, nas suas alegações finais.
Cândida Vilar defendeu na ocasião que “há indícios suficientes para pronunciar [levar a julgamento] todos os arguidos”, e deu “por reproduzida” toda a acusação.
As defesas das famílias de Dylan da Silva e de Hugo Abreu acusaram, por seu lado, os militares e arguidos de “falharem” no dever de proteção dos instruendos, pedindo julgamento para todos, como o MP.
Já os advogados pediram à juíza que os 19 militares arguidos não sigam para julgamento, considerando a acusação elaborada pela procuradora Cândida Vilar imparcial, com vícios, erros, omissão de factos essenciais, uma “narrativa perigosa” ou “desgarrada” e sem indícios que a sustentem.
Em junho do ano passado, o Ministério Público acusou 19 militares no processo relativo à morte de dois recrutas dos Comandos e internamento de outros, considerando que os arguidos atuaram com "manifesto desprezo pelas consequências gravosas que provocaram nos ofendidos".
Da lista dos 19 acusados de abuso de autoridade e de ofensa à integridade física, no processo desencadeado pela morte dos recrutas Hugo Abreu e Dylan Silva e pelo internamento de outros, constam oito oficiais do Exército, oito sargentos e três praças, todos do Regimento de Comandos.
"Os princípios e valores pelos quais se regem os arguidos revelam desrespeito pela vida, dignidade e liberdade da pessoa humana, tratando os ofendidos como pessoas descartáveis", indica a acusação assinada pela procuradora Cândida Vilar.
A acusação refere que, ao sujeitarem os ofendidos a essa "penosidade física e psicológica" durante a recruta efetuada em setembro de 2016, todos os arguidos sabiam que "excediam os limites" permitidos pela Constituição e pelo Estatuto dos Militares da Forças Armadas e "colocaram em risco a vida e a saúde dos ofendidos, o que aconteceu logo no primeiro dia de formação.
LUSA