“Ao fim de 14 meses, o Governo formaliza e inicia na prática o processo negocial, enviando uma proposta sobre a grelha salarial e a dedicação plena (…), mas nós achamos, na primeira leitura, que não faz qualquer sentido propor um aumento salarial, mantendo os 1,6%”, disse à agência Lusa o secretário-geral do SIM, Jorge Roque da Cunha.
No dia em que os médicos cumprem o terceiro e último dia da greve convocada pelo SIM e na véspera da reunião negocial com o Ministério da Saúde, Roque da Cunha disse que vai apresentar uma contraposta, garantido que não irá “demorar tanto tempo como o Governo” demorou a apresentar a sua.
“Naturalmente que mantemos o espírito negocial, mas infelizmente [mantêm-se] as razões desta greve, que fizemos tudo para evitar, e que se consubstancia num valor muito expressivo de adesão, de cerca de 93% dos colegas na Medicina Geral e Familiar nos primeiros dois dias e cerca de 91% nos cuidados hospitalares”.
Por isso, disse, também se mantém o apelo ao primeiro-ministro e ao ministro das Finanças para porem em prática “o que proclamam politicamente: Investir no Serviço Nacional de Saúde”.
“No ano passado foram cobrados 11,8 mil milhões de euros a mais do que aquilo que se fez em relação a 2021. Além disso, temos o PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] que também são muitos milhões de euros que vêm para o nosso país e, portanto, a bem do bom senso, nós apelamos fortemente para que o Ministério da Saúde e o Governo alterem esta proposta inicial porque de outra forma as razões do descontentamento continuarão e as razões para os médicos não continuarem no Serviço Nacional de Saúde também”, alertou.
Recordando as palavras do ministro da Saúde de que um processo negocial é como “o tango”, em que é preciso haver duas pessoas, o sindicalista comentou que, “nesta fase, o doutor Pizarro está mais interessado na rumba”, aludindo à contratação de médicos cubanos, que disse lamentar “profundamente”.
Questionado sobre o aumento que consideraria justo, afirmou que, “a bem do bom senso”, deveria ter em conta a perda de poder de compra dos médicos nos últimos 10 anos, de 20%.
“Naturalmente esperamos que isso aconteça, porque se não acontecer, aquilo que não se gasta hoje acaba por depois o Estado ser obrigado a gastar com os prestadores de serviço, além dos problemas de saúde que são agravados nas pessoas, quer em termos de mortes, quer de incapacidades e, portanto, cá estaremos para negociar", sublinhou.
Disse ainda que as 2.000 rescisões que ocorreram nos últimos dois anos, a que se juntarão os cerca de 1.100 médicos que se irão reformar nos próximos anos, fazem com que haja “grandes dúvidas em relação a esta proposta”.
“Iremos apresentar a nossa contraproposta, mas se assim se mantiver naturalmente irá continuar a haver muita dificuldade a contratar médicos, irão continuar a aumentar o número de portugueses sem médico de família e irão aumentar os tempos de espera para as cirurgias e para as consultas hospitalares e sem dúvida, irão aumentar o número de portugueses que vão precisar de seguros de saúde”, assinalou.
A presidente da Federação Nacional dos Médicos, Joana Bordalo e Sá, criticou por seu turno que a proposta tenha sido enviada às 02:59 de hoje, “com pouco mais de 24 de antecedência da reunião”, afirmando que demonstra “falta de competência” e que o ministro da Saúde continua a tratar os médicos, os utentes e os doentes “com uma enorme falta de respeito”.
“Parece que a ideia é que ninguém a leia”, disse Joana Bordalo e Sá, referindo que a FNAM precisa de algum tempo para analisar a proposta, pelo que não quis fazer comentários, afirmando apenas que “o Ministério da Saúde precisou de 15 meses para concluir uma proposta”.
A presidente da FNAM adiantou que a greve marcada para os dias 01 e 02 de agosto se mantém, assim como a concentração agendada para terça-feira em frente ao Ministério da Saúde.