Portugal “vai ter que alinhar” o seu sistema de exames com o novo modelo de flexibilização e perfil do aluno, defendeu hoje o diretor para a Educação da OCDE, numa conferência em Lisboa dedicada à autonomia e flexibilização curricular.
Andreas Schleicher disse, a propósito da experiência-piloto da flexibilização curricular que decorre este ano em centenas de escolas que se voluntariaram para o projeto, que há uma "tensão” nas salas de aula entre o novo perfil dos alunos e os exames nacionais no final do ano, entre o novo modelo que, segundo Schleicher, é a forma como os professores gostariam de dar as suas aulas, e a responsabilidade de ter alunos capazes de responder às provas que determinam o acesso ao ensino superior.
Nos slides de apresentação que iam passando durante a sua intervenção surge a questão, que o diretor da OCDE colocou como “o dilema: ensinar para o mundo de amanhã ou para o exame nacional?”.
Schleicher acabou por defender que devido à tensão existente entre os dois modelos de ensino “um dia, Portugal vai ter que alinhar o seu sistema de exames” com este novo perfil do aluno.
“O dilema” é, para Andreas Schleicher, um dos maiores problemas e desafios na educação em Portugal, mas o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, à entrada para a sessão da tarde, quando questionado pelos jornalistas sobre se a flexibilização e autonomia podiam vir a impor a revisão do regime de acesso ao ensino superior, o ministro disse que essa era “uma outra questão”.
“Hoje o que estamos aqui a trabalhar é na possibilidade de darmos aos nossos alunos a possibilidade de aprenderem e de aprenderem cada vez melhor”, disse, acrescentando depois que o acesso ao ensino superior “é uma questão importante” à qual o Ministério da Educação dá “resposta cabal” e “ferramentas para que cada vez mais alunos possam ter acesso ao ensino superior”, nomeadamente nos casos do ensino profissional e artístico, para que “ambos possam ser ensinos de corpo inteiro”.
“Acreditamos verdadeiramente que as ferramentas que damos dentro desta flexibilidade, mas também desta liberdade que significa a autonomia, que as escolas encontrarão a melhor forma de dar resposta não só às aprendizagens, mas também ao acesso ao ensino superior”, acrescentou Tiago Brandão Rodrigues.
Antes da sua apresentação, Schleicher defendeu em declarações aos jornalistas que “o desafio para Portugal é educar a próxima geração para o seu futuro, não para o nosso passado”.
“Isso significa dar mais espaço às escolas e aos professores para alargar as competências e conhecimento que os mais novos alcançam. Ao mesmo tempo dar mais espaço aos professores para desenharem ambientes inovadores de aprendizagem. Nesse sentido, penso que o que Portugal está a fazer é muito corajoso, mas não é único, muitos países da OCDE dão hoje às suas escolas um grande nível de autonomia no desenho do seu currículo”, disse, acrescentando que esta reforma “está muito alinhada” com o que se vê “nos sistemas mais avançados”.
Ainda sobre as tensões na sala de aula, Schleicher questionou perante o auditório o porquê de os alunos portugueses serem dos mais ansiosos em relação aos resultados escolares, “quando o sistema de ensino em Portugal nem é assim tão exigente”.
Para o responsável da OCDE a resposta está na “pressão artificial” que o próprio sistema cria aos alunos, com os exames e o trabalho em função de resultados, ou a possibilidade de retenção, uma realidade na qual Portugal ainda se destaca pela negativa em comparação com outros países.
O modelo de ensino de futuro passa por evoluir de “um modelo de organização industrial da escola” para um em que os alunos sejam ensinados para os problemas de amanhã, em que a memorização não seja o objetivo, mas sim o trabalho colaborativo, defendeu Schleicher.
Sobre o projeto-piloto em curso em Portugal, que abrange 235 escolas e mais de 50 mil alunos, Schleicher disse que o que as escolas mostram – o responsável visitou 12 abrangidas pela flexibilização – é que “pode ser feito, que pode ser bem feito e que pode ser feito num curto período de tempo”.
Questionado sobre a possibilidade de o projeto-piloto ser generalizado no próximo ano letivo a todas as escolas, o ministro não se comprometeu com metas, dizendo apenas que o Ministério da Educação está “a trabalhar para que essa implementação seja possível”, e que os desafios identificados pela OCDE serão usados para “fazer caminho” com as escolas para lhes dar novas “ferramentas de autonomia”.
LUSA