O Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais afirmou hoje que o país não “pode perder um minuto” dos oito meses que Bruxelas concedeu para recuperar as “ajudas indevidas” no âmbito da do regime III da Zona Franca da Madeira.
“Não podemos perder um minuto relativamente aos oito meses que temos pela frente para executar a decisão da Comissão Europeia. [Serão] Quatro meses para apresentar um plano à Comissão Europeia e quatro meses para executar esse plano e recuperar os benefícios que foram indevidamente concedidos”, afirmou António Mendonça Mendes que esteve hoje a ser ouvido na Comissão de Orçamento e Finanças.
Durante a audição, realizada na sequência de um requerimento do Bloco de Esquerda (BE), a que se juntou um requerimento oral do PS, o secretário de Estado adiantou que vai encarregar a diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) para coordenar um grupo para, em articulação com a Autoridade Tributária e Assuntos Fiscais da Madeira (AT-RAM), fazer o “plano de recuperação das infrações que possam ter origem nas desconformidades” identificadas por Bruxelas.
Na sequência de uma investigação aprofundada lançada já em 2018, o executivo comunitário anunciou em 04 de dezembro ter concluído que “a implementação do Regime III da Zona Franca da Madeira em Portugal não está em linha com as decisões de ajudas de Estado da Comissão”.
Perante este desfecho, Portugal terá de “determinar o montante a ser recuperado de cada beneficiário individual” e “identificar, entre os beneficiários, aqueles que não respeitaram as condições estabelecidas nas decisões de auxílios estatais da Comissão de 2007 e de 2013, que aprovaram o regime III [da ZFM]”, ou seja, a criação de emprego na região e uma ligação entre os lucros e uma atividade efetiva e materialmente realizada na Madeira.
Bruxelas deu a Portugal oito meses (e não os habituais quatro) para a execução da decisão de recuperação das ajudas.
Durante a audição, António Mendonça Mendes mencionou a competência regionalizada dos serviços fiscais da Madeira, a quem cabe acompanhar os contribuintes, exceto aqueles que têm perfil para entrar no raio de acompanhamento pela Unidade de Grandes Contribuintes (UCG).
A UCG acompanha 24 destes contribuintes, competindo-lhe por isso, fazer as inspeções a este universo, bem como eventuais correções e liquidações.
Já a parte relativa à justiça tributária, nomeadamente reclamações ou impugnações, é da competência da AT-RAM.
Na prática isto significa que, na sequência de uma liquidação efetuada pela UGC, o contribuinte se quiser reclamar sobre a decisão desta Unidade, fá-lo junto da AT-RAM.
Durante a audição, o secretário de Estado vincou não ter “do ponto de vista institucional” nenhuma evidencia que a AT da RAM merece menos crédito do que a AT nacional.
“Quero deixar bem claro que sobre essa matéria, do ponto de vista institucional não tenho nenhuma reserva”, precisou.
António Mendonça Mendes adiantou que a UGC iniciou em 2018 um total de 29 ações inspetivas a empresas da ZFM acompanhadas por esta Unidade, admitindo que as empresas relativamente às quais foram efetuadas correções estarão entre as primeiras que agora serão verificadas no âmbito da investigação da Comissão Europeia.
Durante a audição, a deputada do BE Mariana Mortágua referiu que a investigação da CE “foi demolidora” em relação a alguns aspetos do regime da ZFM, sendo mais uma a validar as dúvidas que o seu partido tem colocado sobre o regime.
João Paulo Correia, do PS, salientou, por sue lado, o prior que se poderia fazer seria ignorar ou desvalorizar a auditoria de Bruxelas, sublinhando que qualquer renovação do regime “não pode assentar nos mesmos pressupostos”, tendo de haver “mecanismos de garantia” de que as regras do regime são cumpridas.
Em resposta, Mendonça Mendes referiu que Governo vai enviar uma proposta à Assembleia da República para prorrogar o regime IV da ZFM (que é o que atualmente vigora e não aquele sobre o qual recaiu a investigação de Bruxelas) por um ano, até dezembro de 2021, reafirmando que vai aproveitar a iniciativa legislativa desta prorrogação para introduzir alterações à lei que clarifiquem o regime e evitem utilizações abusivas.
Mendonça Mendes disse ainda, em resposta aos deputados, que apesar das utilizações indevidas dos benefícios fiscais, não se podem ignorar os cerca de três mil postos de trabalho da ZFM e a receita fiscal aí gerada e que corresponde a cerca de 20% da receita da Região Autónoma da Madeira.
O problema, referiu, não está na ZFM, mas na utilização indevida de alguns dos benefícios fiscais que o regime contempla.
Durante a audição, o governante manifestou-se favorável a uma proposta do PAN sobre a realização de uma análise do custo-benefício dos benefícios fiscais da ZFM, considerando ser esta “uma boa altura” para o fazer.