Este aviso é também feito por sindicatos e ordens que atribuem como um dos fatores para esta situação a saída de profissionais de saúde para o estrangeiro e para a reforma, no caso específico dos médicos.
O presidente da APHP, Óscar Gaspar, disse à Lusa que este é um problema que não afeta apenas Portugal, mas a Europa, gerando uma “grande preocupação”.
“Em toda a Europa há falta de médicos e falta de enfermeiros e também em Portugal temos essa questão. Às vezes há quem diga que é um problema de relação entre o público e o privado. Não é assim”, referiu Óscar Gaspar à agência Lusa, sublinhando que é um problema que afeta todo o sistema de saúde.
Para o presidente da APAH, este “é um desafio” que terá que se tentar resolver nos próximos anos: “É uma matéria de grande importância porque nós devemos ver o sistema a um prazo de cinco, 10 anos e, portanto, era muito importante que tivéssemos mais formação de profissionais de saúde” até porque “as necessidades vão ser claramente crescentes”.
As dificuldades são mais acentuadas em algumas especialidades, como Dermatologia, Anestesiologia ou Psiquiatria.
“É uma questão que foi detetada há uma série de anos e que tem vindo a agravar-se”, lamentou, alertando ainda que “há muitos médicos” à beira da reforma pelo que é preciso acautelar que haverá “formação suficiente” para as necessidades do país.
Contactado pela Lusa, o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM) referiu que o “pico das reformas” será atingido nos próximos três anos no SNS, com a aposentação de cerca de 1.200 médicos hospitalares e cerca de 1.000 médicos de família, a que se juntam as rescisões.
“O facto de esta geração estar muito bem preparada, a qualidade da nossa formação ser de excelência e haver muitas alternativas e muita necessidade de médicos em todos os países do norte da Europa faz com que haja, tal como em muitas outras profissões, uma verdadeira corrida aos nossos médicos”, salientou.
Como tal, disse, existe uma carência de especialistas devido
a “falta de investimento nos últimos anos”, mas também pelo facto de “não se valorizar o próprio estatuto de formador e de se ter tentado tapar o sol com a peneira, o que agrava a situação”.
Por parte dos hospitais privados, defendeu, “era essencial” que deixassem de “cometer o gravíssimo erro estratégico” de basear o seu trabalho em prestadores e aceitassem a proposta que o SIM fez há vários anos para um acordo de empresa para o setor.
“Lamentamos essa choraminguice e esperamos que negoceiem com os sindicatos médicos acordos de empresa que estabilizam e deem consistência e qualidade aos médicos”, disse Roque da Cunha.
O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, observou, por seu turno, que os hospitais privados têm muitos dos seus médicos, “para não dizer maioria”, a tempo parcial.
“Quando se diz que há falta de médicos é preciso haver uma justificação para a falta de médicos. Portanto, a questão que eu deixo em aberto é: qual é o tempo de espera para cirurgias e o tempo de espera para consultas, para poder perceber porque há falta de médicos no setor privado”, salientou.
Por outro lado, explicou, o setor privado atua consoantes as necessidades: “Quantos mais ‘clientes’ tiverem, mais aumentam a sua capacidade” e vice-versa.
O SNS não tem essa gestão “mais flexível” que permitiria ter “uma reserva estratégica” para responder a “várias ameaças” como pandemias, epidemias, catástrofes, como incêndios ou guerras.
Quanto aos recursos de enfermagem, a bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, afirmou que Portugal forma todos os anos cerca de 3.000 enfermeiros, o número necessário para o sistema de saúde. Contudo, há “um problema grave” há vários anos de contratação.
“No caso do SNS, porque não abrem contratações. Até na pandemia fizeram contratações de quatro meses, que é ridículo, e fugiram todos para outros países onde tinham perspetivas diferentes e vínculos duradouros”, explicou.
No setor privado, disse Ana Rita Cavaco, passa-se a mesma coisa. Apesar de haver mais alguns incentivos a nível salarial, não existem outros tipos de incentivos para os fixar.
“Tudo isso, os enfermeiros pesam na hora de decidir, se permanecem em Portugal, ou se vão trabalhar para o estrangeiro, porque hoje não emigram só os mais novos, emigra gente com 10 ou 20 anos de experiência profissional e muitos especialistas”, salientou.
Devido à formação dos enfermeiros em Portugal, disse: “há até países da Europa que estrategicamente deixaram de formar tanto no seu país porque sabem que podem vir buscá-los aqui”.