Um ex-funcionário da Conservatória do Registo Comercial e Automóvel do Funchal começou hoje a ser julgado no tribunal de Instância Central da Comarca da Madeira, acusado de desviar verbas daquele serviço na ordem dos dois milhões de euros.
Este antigo funcionário público, António Manuel Góis, conhecido por ser responsável pelo clube de futebol da Ponta do Sol e por ter exercido o cargo de presidente da Câmara Municipal desta localidade, após a detenção do titular do cargo, António Lobo, em 2004, é acusado de um crime de peculato e 143 crimes de falsificação de documentos como cheques e outros elementos de contabilidade da conservatória.
Neste processo é arguida também a mãe de António Manuel Góis, que está acusada pelo Ministério Público do crime de branqueamento.
Nesta primeira audiência do julgamento, os dois arguidos remeteram-se ao silêncio, tendo o coletivo presidido por Teresa Miranda, coadjuvada por Elsa Serrão e Filipe Câmara, começado a ouvir três funcionárias da mesma conservatória que se constituíram assistentes no processo.
Segundo a acusação, o desvio das verbas ocorreu entre 2002 e fevereiro de 2010, altura em que o arguido era o ajudante principal da conservatória, sendo responsável pela contabilidade, registo de receitas, depósitos e movimento de contas e cheques.
Também refere que foi responsável pelo falseamento da contabilidade, da manipulação dos livros de emolumentos, notas de receitas e encargos e operações contabilísticas.
Um cheque sem provisão de 20 mil euros levantou as suspeitas, tendo a investigação considerado que o dinheiro desviado ao longo dos anos foi usado, entre outros fins, para o pagamento de ordenados e prémios a jogadores e técnicos do clube.
As duas funcionárias que se constituíram assistentes no processo explicaram ao tribunal que o arguido era o homem de "confiança" dos conservadores e quem tinha a responsabilidade de "fazer os depósitos nos bancos".
Foram questionadas sobre os procedimentos do serviço da conservatória do Funchal.
Uma delas referiu que, tendo em conta o dinheiro arrecadado nas conservatórias, que classificou de "os ovos de ouro do Ministério da Justiça", o arguido terá lesado "num montante muito superior" a 2 milhões de euros os cofres da Região Autónoma da Madeira e também os seus colegas.
A assistente mencionou que os funcionários das conservatórias têm direito, além do ordenado fixo, a uma retribuição pelos emolumentos, tendo-lhe sido exigida a restituição de cerca de 8.000 euros que, alegadamente, terá recebido indevidamente, no âmbito deste processo.
Mas, sublinhou que "se tiver que pagar", no final das contas ainda teria "muito mais a receber", porque o apuramento e a contabilidade desses valores eram sempre feitos pelo arguido.
A outra assistente que prestou depoimento adiantou que lhe foi pedido cerca de 7.000 euros, mas também "não pagou nada".
O bom ambiente de trabalho vivido na conservatória, as boas relações com o arguido como "superior hierárquico", não levaram as duas funcionárias a desconfiar em Manuel António Góis.
"Nunca demonstrou indícios do contrário. Nunca teve nenhuma conduta [que levasse a suspeitar] e foi para mim um grande choque, porque tinha-o como amigo e em elevada consideração. Nunca pensei que fizesse o que fez", disse uma delas.
O julgamento têm as próximas sessões agendadas para os dias 3, 10, 11 e 12 de outubro.
LUSA