"Temos que desmistificar um pouco o que é um plano de evacuação. Não vão chegar aqui (Venezuela), no dia de amanhã, 500, 1000 aviões ou uns barcos, para retirar as pessoas. Isso não funciona assim. É importante que a comunidade saiba disso. Não podemos criar expectativas diferentes", disse o conselheiro, em entrevista à agência Lusa.
Conselheiro pela Venezuela, Fernando Campos pede às autoridades portuguesas que divulguem mais pormenores para que "as pessoas entendam que não é um plano específico para a Venezuela e que não vai chegar aqui um grupo comando para retirar as pessoas".
O governo português reiterou há duas semanas que o plano de contingência para retirar emigrantes existe. Calcula-se que vivam na Venezuela cerca de meio milhão de portugueses, dos quais perto de 80 por cento oriundos da Madeira, mas este número já inclui os lusodescendentes. O número de inscritos nos consulados é 180.514.
As manifestações a favor e contra o Presidente Nicolás Maduro intensificaram-se desde 01 de abril e segundo dados oficiais pelo menos 56 pessoas já morreram desde então em vários confrontos entre as forças do regime e os apoiantes da oposição.
"Todos os governo do mundo e o português especificamente, que tem muitos emigrantes, têm que estar sempre preparados para, perante uma situação de comoção grave poder retirar as pessoas. Aqueles cidadãos que peçam para ser retirados", explicou o conselheiro, salientando que, na Venezuela há um milhão de portugueses de três gerações e que não é possível pensar que podem ser retirados de um dia para o outro.
No entanto, "as autoridades têm que estar efetivamente preparadas para, numa situação de comoção, retirar os seus nacionais, aquelas pessoas que queiram" sair, disse Fernando Campos, salientando que, na sua opinião, a grande maioria dos portugueses não quer ir deixar o país.
"Os de primeira geração são pessoas que têm pelo menos 30 anos a viver no país, são gente que já formou família e a grande maioria tem netos, têm as suas casas, os seus negócios, não vão deixar tudo para trás, não vão embora", explicou.
Por outro lado, Fernando Campos insiste que não é possível comparar a situação dos portugueses no país com o período da descolonização e a fuga de África.
"Enquanto há outras comunidades, na Venezuela, que talvez estejam a vender para ir embora, os portugueses estão a comprar para investir e para continuar a trabalhar em negócios novos e isso quer dizer que estamos aqui para ficar", afirmou.
A falta de bens, a crise política e a polarização do discurso, com manifestações sucessivas têm agravado a situação económica e social da Venezuela, um país em que tem aumentado a violência nas ruas.
"Quando ouvimos o Presidente da República (Nicolás Maduro) dizer que estão a armar umas milícias, que são civis", é possível agravar ainda mais a crise social no país, em que existem setores da sociedade que também se estão a "armar para se defenderem da situação de insegurança", criando uma "situação de pré-guerra civil", frisou.
Hoje as ruas das principais cidades venezuelanas têm várias manifestações, com protestos pró e antigovernamentais, mas Fernando Campos considera que essas ações de rua são o modo como "as pessoas têm que ter alguma maneira de protestar e exigir os seus direitos".
No entanto, "os protestos devem ser muito bem organizados" porque bloquear a economia do país "não resolverá a situação" e o país "não pode parar, tem que continuar a trabalhar", explicou o conselheiro.
Quanto à falta de bens alimentares, Fernando Campos considera que a maior parte dos portugueses "não está a passar fome" porque trabalha no setor alimentar, mas a situação é mais complexa noutros serviços.
"Preocupa-me um bocado mais o tema da falta de medicamentos que afeta não os sítios longe de Caracas, mas também as grandes cidades, tratamentos correntes, como hipertensos, Alzheimer, cancros. A grande maioria dos portugueses está a trazer os medicamentos de fora a um custo realmente importante e a saúde das pessoas está a começar a ser afetada", disse.
"O que podemos pedir, sobretudo às autoridades portuguesas, é que continuem muito atentos à situação na Venezuela, respeitando a diplomacia e a não-ingerência" entre estados soberanos, concluiu o conselheiro.