Sem mencionar o nome do antigo governante, responsável à data pelo setor das pescas, a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa (PGDL) diz numa nota publicada hoje na sua página da internet que, “por considerar haver forte probabilidade de condenação em julgamento”, o juiz de instrução criminal do Funchal pronunciou (decidiu levar a julgamento) na quarta-feira o arguido, “confirmando todos os factos descritos" na acusação do Ministério Público (MP).
Contactado pela agência Lusa, Manuel António Correia refutou a acusação do MP e o despacho de pronúncia.
“Penso provar a minha inocência em julgamento porque é assim que me sinto. Em consciência, nunca pratiquei, nesta ou noutra situação, qualquer ato ilegal. Pelo contrário, agi sempre na convicção de estar a defender o interesse público”, frisou o ex-secretário regional do Ambiente e Recursos Naturais da Madeira, que ocupou o cargo entre 2000 e 2015.
O antigo governante da Região Autónoma da Madeira recorda que era normal a emissão das licenças de pesca às embarcações estrangeiras.
“Essas licenças eram habituais dar na Madeira e fora da Madeira para embarcações estrangeiras que tinham diversos efeitos positivos para o interesse público. Essas licenças que me foram pedidas pela cooperativa representativa do setor pesqueiro da Madeira serviam exatamente para beneficiar todo o setor pesqueiro da Madeira e, inclusive, para pagar dívidas à região”, sublinhou Manuel António Correia.
"Que fique bem claro que nunca tive qualquer benefício pessoal pela emissão destas licenças, nem o processo diz isso, mas antes, quem beneficiou foi o setor pesqueiro da região e a própria região", acrescentou o ex-secretário regional, que em 2015 disputou a liderança do PSD/Madeira contra Miguel Albuquerque, após a saída de Alberto João Jardim.
Na sua nota, a PGDL resume o alegado esquema utilizado pelo arguido.
“No essencial resultou indiciado que, em 2005 e 2006, o arguido, na qualidade de secretário regional responsável pelo setor das pescas, ciente de que a cooperativa de armadores da região estava a incumprir os seus compromissos financeiros por financiamento bancário, e que a região, por via do aval que tinha dado à mesma operação financeira, estava a arcar com os encargos de tal financiamento, decidiu-se a aceitar a proposta da dita cooperativa de vender licenças de pesca de atum rabil, espécie muito apreciada pelo mercado asiático, a sete embarcações japonesas e chinesas”, conta a PGDL.
O suposto esquema passava por, segundo o MP, “simular que tal pesca era efetuada a coberto de contratos de afretamento e fundamentadas na transferência de tecnologia, de modo a contornar os impedimentos da Política Comum das Pescas e a iludir as medidas europeias de proteção dos recursos haliêuticos [relativos às pescas], bem como as recomendações da ICCAT – Comissão Internacional para Conservação dos Tunídeos do Atlântico, às quais a EU [União Europeia] está vinculada”.
“Como tal, não foram pelas embarcações em causa cumpridas nenhuma das normas da ICCAT, designadamente e entre outras, tais embarcações não tinham os obrigatórios equipamentos de monitorização, não reportavam a localização nem comunicavam as capturas, factos que só por si eram suficientes para revogar tais licenças, sendo que as licenças supostamente concedidas apenas para o atum rabil foram na verdade emitidas para toda a espécie de tunídeos”, sustenta o MP, citado pela PGDL.
Além disso, em 23 de abril de 2006, a Marinha Portuguesa verificou que uma das embarcações japonesas, "apesar de só ter licença para pescar atum, tinha a bordo 9 toneladas de espadarte, 500 quilogramas de barbatanas de tubarão e 100 quilogramas de dourada, tudo sem evidência de escrituração no diário de pesca”, acrescenta a PGDL.
O inquérito esteve a cargo do Departamento de Investigação e Ação Penal do Funchal e da Polícia Judiciária, tendo o mesmo estado “suspenso por falta de autorização parlamentar para constituir o denunciado na qualidade de arguido”.
O processo segue agora para julgamento, com o antigo secretário regional da Madeira e responder pela prática de um crime de prevaricação e outro de abuso de poder, de titular de cargo político, ambos agravados.
C/ LUSA