“A nossa organização tem um programa que se chama ‘Anjos Lusitanos’ para atender lusodescendentes e lusitanos que se encontram em situação de abandono em suas casas. São pessoas que vivem sozinhas em casa, que estão (praticamente) em ‘situação de rua’ (sem-abrigo), dentro do seu próprio lar”, disse o presidente de “Regala Una Sonrisa” (RUS).
Francisco Soares falava à Agência Lusa no âmbito de uma jornada noturna de ajuda aos sem-abrigo em Gato Negro e no bairro de Cátia, ambos na zona oeste de Caracas, que receberam alimentos cozinhados, roupa e atenção médica de parte daquela ONG.
Segundo o lusodescendente as situações com os portugueses “são muito complicadas: há avozinhos, anciãos, mães que os filhos emigraram e agora estão aqui sozinhas”.
“Precisamos de recursos. O dinheiro é poder e queremos ter o poder de ajudar muitas mais pessoas. Precisamos que se unam a nós, para ajudar quem precisa”, disse Francisco Soares, sublinhando que o lema da ONG é “mais ação e menos paleio”.
Por outro lado, explicou que para colaborar, “basta sair à rua e ajudar quem está a jantar do lixo”, precisando que há cada vez mais anciãos e jovens nessa situação.
“Na Venezuela, a brecha de desigualdades é cada vez mais profunda. Quem tinha (riqueza), tem muito mais agora, e quem não tinha, não tem nada agora (…) a pandemia (da covid-19) arrasou com as oportunidades educativas e os jovens não têm onde trabalhar, nem oportunidades para desenvolver-se e agora vivem na rua, vivem da reciclagem, de conseguir no lixo qualquer coisa para jantar”, disse Francisco Soares.
Segundo o lusodescendente, “a juventude está em risco e o futuro do país também, porque não há oportunidades para os jovens”.
Francisco Soares explicou à Lusa que “por sorte o consulado e a embaixada de Portugal estão conscientes e contribuem para que estas atividades se realizem”, mas insiste que os portugueses e lusodescendentes, que estão bem, devem ajudar as ONG que vão às ruas atender os que mais precisam.
“É doloroso, porque também há muitos portugueses nesta situação. Nós temos a sorte de ter ajuda do consulado, mas pedimos mais apoio da comunidade para ajudar os portugueses que estão em situação de rua, de abandono. Que os portugueses ponham a mão no coração para ajudar a quem está a ajudar os que mais precisam”, sublinhou Francisco Soares.
Sobre a jornada de atenção noturna, explicou que é um programa “que consiste em acompanhar as pessoas em situação de rua, não só para levar-lhes um prato de comida, mas também atenção médica, uma peça de roupa e encaminhá-las para a nossa sede onde podem receber ajuda terapêutica e ir a um centro de reabilitação”.
“A Venezuela é um país produtor de petróleo, mas vivemos numa desgraça, não apenas pelos governantes, mas também pela falta de responsabilidade das pessoas. Nós esquecemos, os governantes esquecem de que, quem vive na rua, é irmão, filho ou parente de alguém, e que precisa de atenção primária”, disse.
Francisco Soares sublinhou ainda que a responsabilidade não é só do Governo central, também das câmaras municipais e governações, que não têm programas para atender estas situações.
“Muitas pessoas estão nesta situação não apenas por problemas de adição ou por doença. Também porque precisam atenção psiquiátrica, porque ficaram sem casa. Muitas moram na rua não por ser más pessoas ou por descaro, mas por não terem onde ficar, nem como pagar um dia de quarto, e o Estado, as governações e as câmaras municipais não lhes dão nenhuma atenção”, frisou.
É uma situação que “é difícil de compreender, para quem vive no estrangeiro”, disse, precisando que na Venezuela cada quem tem que valer-se por si mesmo.
No entanto, destaca que os venezuelanos emigrados são muito sensíveis a estas situações e “com a ajuda direta” de alguns deles, desde a Florida (EUA), a Colômbia e em Portugal, a RUS tem conseguido ajudar alguns sem-abrigo.