Segundo uma nota daquele tribunal superior, o TC, em sessão de julgamento da 3ª Secção no passado dia 10, apreciou "um recurso de constitucionalidade tendo por objeto a norma incriminatória do artigo 387º do Código Penal (na versão da Lei 69/2014, de 29 de agosto) relativa a "maus-tratos de animal de companhia", tendo sido considerada inconstitucional por todos os cinco juízes, sendo, "consequentemente, desaplicada no caso concreto".
"Três juízes consideraram que a norma legal ofendia, conjuntamente, os artigos 27º e 18º número 2, da Constituição, "por falta de identificação do bem jurídico objeto da tutela penal", refere o TC.
Os restantes dois juízes entenderam que a norma desrespeitada era o nº1 do artigo 29º da Lei Fundamental, "por insuficiente determinação das condutas proibidas pela norma legal", adianta a nota do TC.
Em análise esteve o recurso de um arguido condenado, em 1ª instância, numa pena de 16 meses de prisão efetiva pela prática de quatro crimes de maus-tratos a animais de companhia agravados, e na pena acessória de privação do direito de detenção de animais de companhia pelo período máximo de cinco anos.
O arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, que lhe concedeu provimento parcial, suspendendo a execução da pena de prisão aplicada e mantendo, na parte restante, a decisão da 1ª instância.
O arguido recorreu e pediu a fiscalização concreta da constitucionalidade pelo TC dos artigos 387º e seguintes do Código Penal, alegando não ser possível identificar na norma incriminadora dos maus-tratos a animais um bem jurídico.
Alegou assim que a punição do maltrato aos animais assenta em valorações de clara inconstitucionalidade por violação dos artigos 18º, 27º e 62º da Constituição e que "só os valores constitucionalmente protegidos podem ser punidos com privação de liberdade".
Considerou o arguido haver uma punição dos maus-tratos sobre os animais por se "considerar que tal conduta é contrária ao sentimento moral público, sem a previa identificação e determinação do bem jurídico constante do normativo punitivo", o que à luz sistema jurídico constitucional diz ser "inviável e inadmissível".
"As varias teses, nomeadamente relativas aos maus-tratos a animais e os bens jurídicos ambientais, ao animais como titulares de direitos subjacentes, a penalização dos maus-tratos a animais como meio de proteger as pessoas e o seu património, os sentimentos humanas de amor ou compaixão, o bem-estar do animal como o bem jurídico protegido ou ainda a do bem jurídico composto, todas elas merecem críticas e na verdade nenhuma delas é demonstrativa da existência do bem jurídico subjacente, e da sua essencialidade, pelo que qualquer incriminação está ferida de nulidade, por chocar, de frente, com a matriz que emana do artigo 18º da Constituição", alegou ainda o recorrente.
Alegou também que o artigo 389º do Código Penal abrange apenas os animais de companhia, ou seja, aqueles que se encontrem detidos ou destinados a ser detidos pelo homem, designadamente no seu lar, para seu entretenimento e companhia.
"Na verdade, só há um caminho, o da reposição da legalidade e da justiça, devendo ser retirados do Código Penal (CP), os artigos 387º e seguintes do CP", alegou o arguido, solicitando que o TC declarasse a inconstitucionalidade desses artigos.
Por seu lado, o Ministério Público (MP) contra-alegou, pronunciando-se pela negação de provimento ao recurso.
Tudo considerado, o TC deliberou que se mostra "inevitável concluir pela inexistência de fundamento constitucional para a criminalização dos maus-tratos a animais de companhia, previstos e punidos no artigo 387º do Código Penal".
"Não exprime este juízo de inconstitucionalidade uma visão segundo a qual a Constituição sempre se oporá, por incontornáveis razões estruturais, à criminalização de uma conduta como essa. Exprime simplesmente uma visão segundo a qual essa criminalização não encontra suporte bastante na vigente redação da Constituição, que é aquela que se impõe ao TC como parâmetro de avaliação das normas aprovadas pelo legislador", ressalvam os juízes do TC na decisão proferida.
Assim, o TC decidiu julgar inconstitucional a norma incriminatória contida no artigo 387º do CP, por violação, conjugadamente, dos artigos 27 e 18 nº 2 da Constituição e, em consequência, conceder provi