“O Governo decidiu exonerar, com efeitos imediatos, todos os membros da Mesa da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa [SCML], agradecendo-lhes a disponibilidade para prestar funções em tão relevante instituição”, adiantou o Governo em comunicado, hoje divulgado pela Presidência do Conselho de Ministros.
A SCML era atualmente dirigida pela ex-ministra da Saúde socialista Ana Jorge, que exercia funções de provedora há cerca de um ano, sendo a restante Mesa da SCML constituída por uma vice-provedora e quatro vogais.
“Infelizmente, esta decisão tornou-se inevitável por a Mesa, agora cessante, se ter revelado incapaz de enfrentar os graves problemas financeiros e operacionais da instituição, o que poderá a curto prazo comprometer a fundamental tarefa de ação social que lhe compete”, justificou o executivo.
Segundo o Governo, “a preocupação com o rumo da SCML e a incapacidade da Mesa de tomar ações decisivas para o inverter têm vindo a ser públicas”.
O executivo elenca, por exemplo, a ausência de “medidas adequadas que se impunham para inverter rapidamente a situação financeira de extrema gravidade e os riscos de insustentabilidade da SCML” quando em junho do ano passado a administração detetou uma “iminente rutura de tesouraria”.
O executivo, em funções há cerca de um mês, acusa ainda a administração demitida de no último ano não ter apresentado “um plano estratégico ou de reestruturação”, nem “para fazer face às fortes quebras sentidas pela diminuição das receitas provenientes dos Jogos Sociais, principal fonte de rendimento da instituição”.
A notícia da exineração da Mesa da SCML foi inicialmente avançada pela SIC, após o jornal ‘Público’ ter noticiado já hoje que o executivo tinha pedido um plano de reestruturação urgente à administração da instituição.
O comunicado fala ainda em “receios fundados” sobre falta de “diligência necessária da atual Mesa para resolver eficaz e celeremente a exposição à atividade internacional ruinosa da SCML” e de multiplicação de alertas relativos à “redução significativa da atividade da ação social da SCML em território nacional”.
“Instada a prestar informação solicitada pela tutela, a Mesa cessante demonstrou incapacidade de o fazer em tempo”, acusa o Governo.
O comunicado aponta ainda que a capacidade de apoio social aos mais vulneráveis e a confiança da população na instituição, “os maiores ativos” da SCML, “estavam a ser comprometidos pela Mesa cessante, bem como a anterior, desde logo ao não garantirem que a respetiva gestão se pautava pelo grau de diligência, rigor e transparência que são devidos pelo interesse público”.
Os problemas financeiros da SCML levaram a provedora Ana Jorge, que tomou posse a 02 de maio de 2024, a anunciar a realização de uma auditoria forense às contas da Santa Casa Global, criada para gerir lotarias e jogos de apostas no mercado externo, tendo os resultados sido remetidos ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas, depois de terem sido encontrados indícios de irregularidades.
Numa audição no parlamento, Ana Jorge referiu que apenas havia documentação a comprovar uma autorização da tutela, então a cargo da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, para investimentos de cinco milhões de euros nos projetos de internacionalização da SCML, e que não havia “evidência” de pedidos e autorizações posteriores a autorizar o valor global de facto investido, na ordem dos 27 milhões de euros.
Após a ministra ter negado ter dado qualquer autorização para esses investimentos, o anterior provedor, Edmundo Martinho, disse que os investimentos para a internacionalização dos jogos sociais estavam aprovados em orçamento, não necessitando de autorização da tutela, e reiterou que a ministra estava informada.
Depois do envio de um relatório intercalar ainda no ano passado, em fevereiro a SCML tornou público que um relatório mais completo dos resultados da auditoria tinha sido enviado para o Ministério Público, com dados recolhidos até 31 de janeiro deste ano, mas sublinhou na altura que “a auditoria externa, da responsabilidade da BDO, “ainda não está totalmente concluída, devido a dificuldades na obtenção de documentação administrativa e financeira relativa a participadas” no Brasil.
Segundo noticiaram o Público e o Observador nessa altura, os resultados da auditoria imputavam ao anterior provedor Edmundo Martinho ilícitos e indícios de crime económico nos negócios da instituição no Brasil.
A SCML não quis comentar estas acusações, por o processo se encontrar em segredo de justiça, mas Edmundo Martinho acusou então a equipa de Ana Jorge de tentar desacreditar e denegrir a anterior administração e de construir falsas narrativas sobre o processo de internacionalização.
Lusa