Numa videoconferência sobre “As mudanças na relação estratégica Europa – China”, organizada pelo Instituto da Defesa Nacional, admitiram que um segundo mandato de Trump poderá ser ainda mais dramático do que o primeiro (2017-2021).
Martin Hála disse que um dos maiores contributos do atual Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi ter feito Washington regressar à política de alianças, depois de Trump ter lidado sozinho com países como a República Popular da China (RPC).
“Os Estados Unidos da América [EUA] já não têm o poder de gerir sozinhos as relações com a RPC”, afirmou, citando as mudanças dramáticas no equilíbrio militar ocorridas na última década como uma das razões.
Jorge Tavares da Silva destacou o ambiente em que poderá decorrer a eleição presidencial nos EUA, com a guerra russa contra a Ucrânia e o conflito no Médio Oriente.
Caso seja eleito, um apoio de Trump à Rússia minaria a relação dos EUA com a União Europeia (UE) e uma eventual vitória russa na guerra criaria dificuldades na integração europeia da Ucrânia.
“Será muito dramático para a União Europeia e também, obviamente, para o mundo”, defendeu.
Outra preocupação nas relações entre a UE e a RPC é a questão de Taiwan, a ilha autónoma que Pequim reclama ser sua e ameaça tomar pela força se os taiwaneses declararem a independência.
Taiwan é o maior produtor de circuitos integrados, e os mais sofisticados, que são fundamentais para a tecnologia do dia a dia no mundo.
Hála disse que para muitas pessoas, Taiwan é o local mais perigoso do mundo, onde se joga um confronto entre a China e o resto do mundo.
Defendeu tratar-se de um conflito “que tem realmente de ser gerido com o maior cuidado”, porque tem o potencial de ser mais prejudicial do que a guerra na Ucrânia.
Considerou, por isso, que o mais importante será tentar manter o ‘status quo’ por mais 50 anos, em que a China e Taiwan possam coexistir como até agora.
Jorge Tavares da Silva colocou a relação da UE-Taiwan no meio do conflito tecnológico entre a RPC e os EUA, que afeta o modo como os europeus lidam com a questão.
Considerou também que a China está numa situação de ‘low-profile’ diplomático, na expectativa das eleições em Taiwan em janeiro e também nas presidenciais norte-americanas, agendadas para novembro de 2024.
“A dinâmica política é muito importante para a China e os chineses estão à espera do novo ano. Os desenvolvimentos futuros dependerão destas questões”, disse.
Sobre o futuro das relações UE-RPC, Martin Hála disse que, após um período de otimismo que durou 15 anos, a pandemia e o apoio chinês à Rússia deixaram marcas.
“Toda a relação está ainda à procura de um chão”, afirmou, defendendo que os europeus devem ser mais realistas em relação à China.
Jorge Tavares da Silva disse que a maior parte da relação UE-China se baseia no comércio e investimento bilateral, temas a que “estão associadas as questões geopolíticas e de segurança, e a política externa”.
Destacou a cooperação nas alterações climáticas, mas referiu as grandes divergências em matéria de direitos humanos.
Lembrou que a Comissão Europeia criticou países como a Itália “por se alinharem demasiado estreitamente” com a iniciativa chinesa “Uma Cintura e uma Rota”.
A iniciativa “promove o comércio chinês através de infraestruturas que atravessam a Ásia e chegam à Europa, mas tem também interesses geopolíticos muito importantes”, afirmou.
Referiu, tal como Hála, que a cimeira UE-China da semana passada não teve resultados e admitiu “as relações dominantes da China são, de facto, com os Estados Unidos e com o Sul global”.
Considerou ainda que um dos problemas da UE é a multiplicidade de vozes e admitiu que Alemanha e França “são mais importantes para a China do que a UE em geral”.