O tema da corrupção voltou a ganhar destaque quando o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque (PSD), foi constituído arguido numa investigação envolvendo este e outros crimes, em janeiro de 2024. Três secretários do seu executivo são também arguidos em diferentes processos judiciais.
Esta foi a justificação do Chega para apresentar uma moção de censura aprovada na Assembleia Legislativa em dezembro e que acabou por motivar as eleições do próximo dia 23.
No âmbito do processo que envolve Albuquerque foram detidos o então presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado (PSD), além de dois empresários ligados ao setor da construção civil, entretanto libertados e sujeitos a termo de identidade e residência.
Mas, ao longo dos anos, em processos relacionados com corrupção, quatro presidentes de municípios madeirenses foram julgados e condenados. Luis Gabriel Rodrigues, de Santa Cruz (2000), e António Lobo, da Ponta de Sol (2007), cumpriram mesmo penas de prisão efetivas de cinco anos e meio e seis anos, respetivamente.
Foram sentenciados a penas suspensas de três anos os presidentes José Alberto Gonçalves (2017), de Santa Cruz, e Carlos Pereira (2012), de Santana.
As candidaturas às regionais deste mês manifestam-se, numa resposta escrita enviada à agência Lusa, contra qualquer ato de corrupção. Entre outras medidas de combate ao problema, são defendidos um regime de incompatibilidades e impedimentos, um código de conduta para os membros do Governo Regional e a extensão à Madeira da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção.
O cabeça de lista social-democrata, Miguel Albuquerque, realça que apresentou no final de 2023, no parlamento da Madeira, “uma recomendação para a criação de um Gabinete de Integridade, Transparência e Prevenção da Corrupção”, visando “dotar a governação regional e as instituições públicas de uma estrutura que promovesse a transparência na Administração Pública” e fomentar a confiança nas instituições.
Albuquerque também considera “fundamental, além de incrementar a celeridade na justiça, garantir a separação de poderes” para evitar que “a política seja campo para batalhas judiciais” ou que se possa “utilizar a justiça para fazer política, o que infelizmente tem acontecido”.
Para o cabeça de lista da CDU (PCP/PEV), Edgar Silva, há “uma corrupção estrutural, sistémica, que já faz parte da natureza do regime cristalizado na governação PSD na Madeira”, traduzida na “mais profunda promiscuidade entre o mundo dos negócios e a governação”.
“A sucessão de casos que, ao longo de décadas, têm alimentado um sentimento de alargada suspeição e uma perceção pública de práticas de corrupção, tráfico de influências e de criminalidade económico-financeira”, comenta.
O comunista defende um regime de incompatibilidades e impedimentos para detentores de cargos políticos, legislação que impeça o trânsito de detentores de cargos políticos para empresas privadas de setores anteriormente tutelados em funções de governo e o combate às situações opacas de financiamento dos partidos políticos.
Quanto ao socialista Paulo Cafôfo, afirma que “o combate à corrupção deveria ser um imperativo ético e moral de cada um”, enfatizando que a sua inobservância por parte dos governantes madeirenses provocou a instabilidade política na região, e que a constituição como arguidos de membros do executivo “lançou o nome da região no descrédito e envergonha os madeirenses”.
Cafôfo insiste na necessidade de um código de conduta aplicável aos membros do executivo, aos seus gabinetes e às entidades da Administração Pública e do setor público empresarial.
Para o primeiro candidato do Chega, “a corrupção é um dos maiores cancros da Madeira, alimentado por um sistema político viciado, favorecendo os seus próximos e garantindo que os mesmos grupos económicos controlam a economia da região”.
Miguel Castro quer “uma reforma profunda” que passa por “valorizar o mérito profissional, a experiência laboral e a qualidade curricular no acesso aos quadros da Administração Pública, em detrimento da cunha e do compadrio”, além de “penas mais severas para crimes de corrupção, incluindo a inibição definitiva de cargos públicos para condenados, acabando com os políticos reincidentes que saltam de cargo em cargo”.
Também propõe auditorias financeiras obrigatórias a todas as Sociedades de Desenvolvimento, à Empresa de Eletricidade da Madeira, à GESBA (gestora do setor da banana), à empresa de transportes de passageiros Horários do Funchal e à gestão do Serviço Regional de Saúde.
O cabeça de lista do JPP, Élvio Sousa, realça que a corrupção se combate “sem medo e com coragem, utilizando as ferramentas disponíveis”. Assume que o partido “é o que mais fiscaliza” o executivo, mas que é preciso “ir mais longe”.
Na sua opinião, “é urgente um regime de incompatibilidades e impedimentos”, que “o PSD sempre rejeitou”, para o poder público atuar com transparência e “para proteger o parlamento do compadrio e da promiscuidade entre política e negócios”.
Pelo CDS-PP, José Manuel Rodrigues, que preside ao parlamento regional desde 2019 e celebrou acordos com o PSD para assegurar a governação, sustenta que “o combate à corrupção deve começar na prevenção”, o que passa pela introdução de medidas regionais “que ajudem a dar mais transparência e ética à vida pública”.
“Desde há muito que o CDS defende um novo regime de incompatibilidades dos titulares de cargos públicos na região, semelhante ao nacional, a criação de um registo de interesses para os detentores de cargos políticos, como governantes e deputados, e a uniformização com o sistema nacional da declaração de rendimentos e património”, enfatiza.
Para Gonçalo Camelo, cabeça de lista da IL, “os melhores remédios contra a corrupção são o aumento da transparência e a redução da burocracia”. Preconiza uma “administração pública eficiente, aberta e acessível, a criação de mecanismos que permitam aos cidadãos acompanhar e escrutinar a gestão dos recursos públicos e os processos de nomeação e de decisão”.
Defende, por isso, que os membros do Governo Regional, os gestores públicos e os diretores regionais devem ser sujeitos a códigos de conduta e obrigados a “preencher um questionário de verificação prévia de incompatibilidades, conflitos de interesses e probidade”. A “redução drástica do número de assessores, consultores políticos e outros cargos de confiança” é outra medida.
Para a cabeça de lista do PAN, é “crucial a criação de mecanismos para garantir igualdade no acesso aos serviços e de oportunidades, combatendo assim os favoritismos e os ‘atropelos’ que ocorrem em muitos concursos”.
Segundo Mónica Freitas, a estratégia nacional anticorrupção deve ser adaptada às especificidades do arquipélago e é preciso definir um “regime de exclusividade e a regulamentação de ‘lobbying’ dos deputados”, tal como aumentar “o ‘período de nojo’ para quem exerça cargos públicos poder passar para o setor privado conexo com essas funções”.
É ainda necessário, explica, proteger os denunciantes, criar uma taxa extraordinária de 15% para as transferências para ‘paraísos fiscais’, e constituir um gabinete de transparência e combate à corrupção e um código de conduta para o Governo Regional.
Para a cabeça de lista da coligação Força Madeira (PTP/MPT/RIR), “o Governo Regional tem sido perdulário” e o arquipélago apresenta um grande investimento em obras públicas “precisamente porque é o passaporte para a corrupção na política”.
No entender de Raquel Coelho, a corrupção é só “a ponta do icebergue”, porque a falta de alternância política gerou um “regime de impunidade e banalização da corrupção, com a conivência do próprio aparelho judicial regional e da comunicação social”.
“Saímos de uma liderança intolerante com Jardim [presidente por quatro décadas] e passámos a ter uma liderança assombrada pela corrupção com Miguel Albuquerque”, opinou.
Para o cabeça de lista do BE, é “tempo de quebrar as amarras do clientelismo e da subserviência aos poderes económicos” e acabar com “a elite cada vez mais rica, com lucros fabulosos e todos os privilégios”.
Roberta Almada argumenta que têm sido gastos muitos milhões em “elefantes brancos das Sociedades de Desenvolvimento, contratos milionários sem escrutínio, dinheiro público deitado ao lixo”.
“É preciso travar esta sangria”, sustenta, insistindo na alteração do regime de impedimentos e incompatibilidades para todos os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos regionais, e na promoção de maior transparência da Administração Pública e das empresas públicas, nos concursos e adjudicações de empreitadas.
Paulo Ricardo Azevedo, o primeiro candidato da Nova Direita, diz que “a melhor forma de combater este grave problema – que não é de agora – será criar uma comissão de fiscalização na Assembleia Regional com elementos das forças partidária com representação parlamentar, para fiscalizar todas as obras públicas e os seus gastos”. Essa fiscalização “terá que ser feita durante a construção da obra e durante todos os concursos públicos”.
Para Marta Sofia, do Livre, deve ser “obrigatória a formação em ética e transparência para o exercício de um cargo público”. Estender à Madeira a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção é outra prioridade, bem como “fazer aprovar princípios rigorosos sobre conflitos de interesse, para acabar com a promiscuidade entre o setor público e o privado”.
“Mais transparência, mais prestação de contas, mais fiscalização e responsabilização dos infratores”, sublinha.
Paulo Brito, que encabeça a candidatura do PPM, afirma que os madeirenses são “um povo íntegro” e recusa “deixar que a sua honorabilidade seja colocada em causa”, mas reforça que “não acompanha o populismo atroz de quem condena na praça pública, promove linchamentos coletivos nas redes sociais e na opinião publicada”, já que cabe aos tribunais provar a culpabilidade dos suspeitos.
Quanto a propostas, enuncia o fim da imunidade dos membros do Governo da Madeira, como já sucede com os membros dos governos de Portugal e dos Açores; o estabelecimento em 30 dias do tempo de resposta máximo aos requerimentos dos deputados da Assembleia Legislativa, tal como nos Açores; a criação de um Gabinete de Prevenção da Corrupção e da Transparência; e o desenvolvimento de uma vertente preventiva da corrupção no sistema educativo.
Lusa