As primeiras medidas para conter a covid-19 foram anunciadas em março de 2020 e levaram ao encerramento temporário de várias empresas, nomeadamente no comércio, restauração e turismo, e ao fecho das escolas, o que fez com que muitos pais tivessem de ficar em casa com os filhos.
A livre circulação de pessoas foi restringida e o teletrabalho foi adotado como uma das principais medidas, tendo sido imposto pelo Governo durante os confinamentos gerais.
Um milhão de pessoas esteve em teletrabalho no primeiro confinamento, que ocorreu no segundo trimestre de 2020, o equivalente a 23,1% da população empregada, enquanto mais de 600 mil não trabalharam nem no emprego nem em casa, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE).
Nos dois anos de pandemia, os números do teletrabalho foram oscilando à medida que as restrições aliviavam ou retomavam, mas os dados mais recentes dão conta de que no final de 2021 ainda estavam em teletrabalho 455 mil trabalhadores, ou 9,3% da população empregada.
"Se somarmos a estes dados os trabalhadores que passaram a trabalhar alguns dias em teletrabalho, vemos que a pandemia trouxe de facto uma mudança muito grande", diz à Lusa Paulo Marques, professor do Departamento de Economia Política do ISCTE e coordenador do Observatório do Emprego Jovem da faculdade.
A generalização do teletrabalho chamou a atenção para a necessidade de se avançar com a sua regulamentação e o parlamento aprovou em 2021 novas regras que entraram em vigor em janeiro deste ano e que preveem o pagamento das despesas adicionais aos trabalhadores em teletrabalho e o alargamento deste regime a mais situações, como é o caso dos pais com filhos até aos 8 anos, em determinadas situações.
Ao mesmo tempo, foram implementadas medidas de proteção do emprego, como o ‘lay-off’ simplificado, o apoio à redução da atividade para trabalhadores independentes, a que se seguiu o apoio à retoma progressiva da atividade, entre outras.
Estas medidas conseguiram, de uma forma global, travar os níveis de desemprego, mas não nas camadas mais desprotegidas, sobretudo nos mais jovens e precários.
O ‘lay-off’ simplificado, que abrangeu mais de 945 mil trabalhadores e mais de 120 mil entidades empregadoras nos dois anos de pandemia, tinha como condição a proibição de as empresas despedirem trabalhadores durante um determinado período, o que explica em grande parte a manutenção dos níveis de emprego.
Por outro lado, muitos trabalhadores a prazo acabaram por não ver os seus contratos renovados.
"O país conseguiu segurar o emprego total, muito por causa de medidas como o ‘lay-off’ simplificado, mas não conseguiu que acontecesse o mesmo relativamente ao desemprego jovem" e no desemprego de longa duração, sublinha o professor do ISCTE.
O desemprego total registado no quarto trimestre 2021 já recuperou relativamente àquilo que era o desemprego antes da pandemia, situando-se no final de 2021 em 6,6%, segundo o INE, mas a taxa de desemprego jovem passou de 18,3% em 2019, para 22,6% em 2020, atingindo 23,4% em 2021.
Segundo Paulo Marques, a pandemia levou "a uma grande destruição do emprego nos vínculos precários, que não tem paralelo até em relação à crise anterior" uma vez que os setores mais afetados, como a restauração e a hotelaria, são os que usam mais esse tipo de contratos.
Também a dificuldade da transição da escola para o mercado de trabalho foi agravada com a pandemia, pelo que, para o futuro, o professor do ISCTE defende que as políticas de emprego públicas devem ter "um papel mais ambicioso" nesta área.
Apesar da "evolução extraordinária das qualificações" em Portugal, diz Paulo Marques "a economia não está propriamente em expansão e as empresas enfrentam aqui dificuldades" pelo que é preciso "ajudar os jovens nesta transição", sublinha o especialista.
A pandemia veio acelerar o crescimento de profissões ligadas à digitalização, que têm cada vez um peso maior no emprego, como é o caso da consultoria e programação informática que, segundo o coordenador do observatório, passou de 79 mil trabalhadores em 2019 para 93 mil em 2020.
"Este processo também está a gerar muito emprego em áreas novas que não tinham uma relevância tão grande e o caso dos programadores informáticos é impressionante", refere.
Para o professor, é fundamental para o futuro que haja políticas ativas de emprego que protejam os jovens e as relações contratuais atípicas "que colocam as pessoas perante uma grande vulnerabilidade".
Neste campo, foram dados alguns passos com a Agenda do Trabalho Digno aprovada em Conselho de Ministros, mas que ficou entretanto parada devido à dissolução do parlamento.
As medidas foram discutidas numa altura em que também se verificou um crescimento de trabalhadores das plataformas ‘online’ relacionadas com entregas ao domicílio, uma questão que também chegou a ser discutida na Concertação Social no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, mas que não avançou.
Lusa