“A situação é muito complexa, porque vive-se uma volatilidade de preços todos os dias e não há expectativas de que a guerra na Ucrânia tenha um fim, pelo menos, nos próximos meses”, afirmou à agência Lusa o secretário-geral da IACA, Jaime Piçarra.
Segundo o responsável, o setor português das rações para animais importava da Ucrânia “cerca de 40% dos cereais” necessários para a sua produção, mas, com o início do conflito, voltou-se para outros mercados internacionais.
“Podemos estar a pensar agora na América do Sul e na América do Norte, mas era importante que a Europa e, neste caso, Portugal fossem autossuficientes, até por uma questão da soberania alimentar, que, já todos percebemos, é estratégica”, considerou.
Por outro lado, vincou Jaime Piçarra, esta indústria precisa “cada vez mais” de adquirir “matérias-primas de proximidade” para se tornar “menos dependente” do exterior e até para diminuir “a pegada ambiental”.
“Era importante uma ligação entre os produtores agrícolas e a produção de matérias-primas, de acordo com necessidades da nossa indústria, quer de cereais, oleaginosas e proteaginosas”, apontou.
O secretário-geral da IACA falava à agência Lusa a propósito das conclusões de um estudo elaborado por uma empresa de consultoria e apresentado na reunião geral da indústria, realizada hoje na Faculdade de Medicina Veterinária, em Lisboa.
De acordo com o responsável, o estudo dá pistas para a definição de “políticas públicas mais adaptadas ao desenvolvimento do Alentejo”, pois esta região, apesar de ter a albufeira do Alqueva, “não é só água”.
“O Alqueva é muito importante e criou novas potencialidades e novas valências, nomeadamente em termos de produção de milho, mas temos que pensar que a maior parte do Alentejo é de sequeiro”, salientou.
Sublinhando que “o Alentejo deixou há muito tempo de ser o celeiro de Portugal”, Jaime Piçarra adiantou que o setor tem vindo a reduzir a sua “capacidade de auto-aprovisionamento” e a “recorrer, cada vez mais, às importações”.
“A Ucrânia, infelizmente, agora, neste contexto de guerra, era o grande celeiro”, realçou, referindo que os mercados alternativos do continente americano apresentam “preços extremamente elevados”.
O secretário-geral da IACA disse que a subida dos custos de produção está a afetar, desde 2021, “todas as indústrias”, mas a das rações para animais “sofreu extraordinariamente” com os aumentos dos preços.
“Em 2020, os preços do milho no mercado mundial eram na ordem dos 170 euros por tonelada, mas, em 2021, subiram para 250 euros e, agora, com a guerra, chegámos a ter o pico na ordem dos 410 euros e o trigo seguiu uma tendência muito semelhante”, contou.
Jaime Piçarra assinalou que, incluindo os custos com a energia e os combustíveis, “os aumentos em relação ao ano passado foram na ordem dos 50%”, o que “cria condições muito complicadas de competitividade” para esta indústria e para a produção animal.
“É necessário repensar este modelo de desenvolvimento”, insistiu, indicando que, agora, é preciso saber “se o Alentejo tem área suficiente e condições para ser atrativo na produção de cereais”.
Nesse sentido, acrescentou, o estudo propõe a criação de um órgão de consulta, incluindo empresas, universidades, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional e a sociedade civil, para repensar “o modelo de desenvolvimento” do Alentejo.