“Neste momento, o que se está a promover com esta lei é a concorrência desleal com os outros mercados. Se um atleta tiver de optar, vai escolher outro país, porque já sabe que não conseguirá trabalhar imediatamente em Portugal. Este é um problema estrutural e é preciso olhá-lo com dignidade”, lamentou à agência Lusa o advogado Emanuel Calçada.
Em 03 de junho, o Governo pôs termo à manifestação de interesse na regularização dos estrangeiros em Portugal, um recurso legal que resultou de uma alteração legislativa em 2017 e permitia normalizar os processos de quem chegasse com visto de turista ao país.
“Esta atividade reúne características específicas, é escrutinada pelas autoridades e paga impostos bem acima da média. Da mesma forma que se exige dela, parece-nos que será merecedora, no mínimo, de um olhar sensível de quem legisla. Face à sua especificidade em vários níveis, é preciso gerar uma solução que não ponha em causa os interesses do Estado, mas também – e não menos importante – os interesses desta atividade”, desejou.
Emanuel Calçada sugere um “critério diferenciador” para salvaguardar os clubes no novo decreto-lei aprovado em Conselho de Ministros pelo Executivo de Luís Montenegro, que passará a exigir aos imigrantes que iniciem o processo de regularização da permanência em Portugal nos consulados ou embaixadas nacionais antes da própria chegada ao país.
“O conjunto de leis deste género não é compatível com a execução diária desta atividade. Estamos a falar de algo que seja aplicado exclusivamente ao futebol e por um período de três meses (em consonância com o funcionamento das duas janelas de transferências na mesma época). Não estaremos a criar um regime de exceção durante 365 dias”, ilustrou.
Na quarta-feira, a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) reuniu de emergência com os clubes e revelou “profunda preocupação” pelas consequências das mudanças da legislação sobre a imigração, insistindo na necessidade de ser encontrada uma “solução urgente” em plena janela de transferências de verão, que se estende até 02 de setembro.
“Há prejuízos financeiros, na medida em que, se não formos buscar o talento mais rápido do que os outros (países), podem ser gerados danos futuros em todo o circuito associado ao futebol. Vemos ainda impactos de natureza administrativa, uma vez que os processos deixam de ter correspondência prática com a realidade. O registo de um atleta fica quase como que pendurado em função de uma lei nacional, quando deve estar amparado numa legislação que facilite uma inscrição imediata e por via digital”, avaliou Emanuel Calçada.
Praticamente um mês antes, em 15 de junho, a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) tinha questionado a hipótese de “ser utilizado um regime de exceção já previsto”, numa carta dirigida ao secretário de Estado do Desporto e ex-dirigente federativo, Pedro Dias.
“Depois, existe um impacto global muito maior, que não se consegue mensurar à data de hoje, mas é resultante de uma atividade que gera um valor de mercado acima da média, tem circuitos financeiros bastante relevantes e paga muitos impostos. Se atentarmos nos últimos cinco anos e imaginarmos que todos os jogadores extracomunitários não teriam entrado em Portugal ou gerado receitas aquando das respetivas saídas, falamos de uma quantia significativa de milhões de euros que os clubes deixariam de arrecadar”, admitiu.
Conhecedor de “algumas movimentações que estão suspensas”, Emanuel Calçada está com “curiosidade e uma certa impaciência para ver até que ponto” a nova legislação vai afetar os procedimentos junto da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) e deixar em risco a concretização de negócios em plena janela de transferências de verão.