Para o responsável pelo departamento de ciências de dados do Benfica, Sudarshan Gopaladesikan, esta área multidisciplinar que combina computadorização, estatística ou matemática, aplicada no desporto, permite "ganhar escala e eficiência" que resulta em "mais tempo para fazer a interpretação do jogo".
"Não fazemos nada de novo, porque muitas pessoas já o fazem com a análise de vídeos, onde treinadores passam muitas horas a ver vídeos e manualmente a recolher esta informação, mas com o constrangimento de que o vídeo-analista apenas pode visualizar normalmente até cinco jogos", explicou, durante o webinar ‘The Data Journals’, organizado pela Nova SBE e a Le Wagon.
Por outro lado, apontou, este departamento tem a capacidade de analisar uma época inteira de determinado adversário num parâmetro específico como os pontapés de canto.
Sudarshan Gopaladesikan exemplificou ainda que no futebol português há muitas mudanças de treinadores e que a ciência de dados permite olhar para todos os pontapés de canto de um determinado treinador, para além do clube que está.
"Treinadores são treinadores por uma razão e percebem o jogo de uma maneira que os computadores ainda não percebem. Mas, podemos ajudar a interpretar o jogo e a ter mais tempo para essa interpretação", sustentou.
Sudarshan Gopaladesikan abordou em específico o seu trabalho na análise de pontapés de canto em jogos de futebol.
De forma geral, 82% dos cantos são batidos diretamente para a grande área, enquanto 18% são jogados à maneira curta, havendo por média 10 por jogo, cinco por cada equipa.
Quanto à eficácia, na edição 2019/20 da I Liga portuguesa a taxa de conversão de cantos em golo era de 1,5%, face, por exemplo, à Liga alemã, que teve uma taxa de 1,9%.
A ciência de dados permite perceber qual o tipo de defesa ou rotina de ataque é melhor nos pontapés de canto frente a um determinado adversário.
Na análise de dados divulgada na apresentação que resultam do estudo de vários jogos de futebol, Sudarshan Gopaladesikan mostrou que a marcação mista com quatro jogadores à zona permitiu uma maior percentagem de remates à baliza (33%) mas menos golos (7%), face a uma marcação à zona com dois jogadores apenas, que permitiu menos remates (27%) mas resultou em mais golos (13%).
"Atualmente, os treinadores têm um melhor entendimento e olham para estes dados. Por exemplo, se o local para onde a bola vai não tem resultados, podemos aprender como reconstruir novas rotinas através da ciência de dados", salientou.
Sobre a relação e o ‘feedback’ com as equipas técnicas, o responsável pela ciência de dados do Benfica destacou que as pausas para os jogos das seleções são boas porque permitem duas semanas de trabalho sem jogos nos clubes e dão tempo para melhorar.
"Há momentos importantes de feedback, como quando por exemplo dizem que gostaram do trabalho realizado sobre os ‘passes’ e agora pretendem saber todos os momentos em que os jogadores podiam ter feito um passe, mas não fizeram. Isso obriga a trabalhar e alterar os parâmetros, o que envolve tempo", disse ainda.
Como exemplos da utilização da ciência de dados no futebol, Sudarshan Gopaladesikan explicou que a tecnologia permite perceber "se o jogador está a ser exposto no treino ao que é exposto no jogo".
"Seguindo aquele conceito de que jogamos da forma que treinamos, podemos perceber o que os jogadores precisam durante o jogo, em termos de intensidade, para poder atingir esses objetivos nos treinos", sublinhou.
E revelou que a sua equipa de ciência de dados está a realizar um estudo para perceber de que forma é eficiente a posse de bola, qual o seu valor e se aumenta ou não a probabilidade de marcar golo.