"Um pequeno passo para o homem, um salto gigantesco para a humanidade" – quando o astronauta americano Neil Armstrong se tornou na primeira pessoa a pisar na superfície lunar em 21 de julho de 1969, eram 22h56 em Houston, 05h56 em Paris, 07h56 em Moscovo e 13h56 em Tóquio. Mas que horas eram na Lua?
Mais de cinco décadas depois, a Agência Espacial Europeia (ESA no acrónimo em inglês) procura responder a esta questão. Esta semana, anunciou que organizações espaciais de todo o mundo estão a estudar a melhor maneira de estabelecer "uma hora de referência lunar comum", uma ideia já tinha sido avançada em novembro de 2022 numa reunião nos Países Baixos.
"Agora, lançou-se um esforço internacional conjunto para conseguir isso mesmo", disse Pietro Giordano, engenheiro de sistemas de navegação da Agência Espacial Europeia. Mas o tempo definido pelos relógios na Terra não pode ser aplicado fora do planeta.
A Euronews entrevistou Francisco Diego, astrónomo da University College em Londres, para perceber melhor como é que se pode medir o tempo no espaço.
Qual é o equivalente a uma hora na Lua?
Na Terra, o tempo é medido em relação às rotações que definem o que conhecemos como noite e dia. Uma rotação completa da Terra sobre o seu eixo dura 24 horas, um dia, e o circuito à volta do Sol, 365 dias, define um ano.
Mas o ciclo lunar não funciona da mesma maneira.
"Como a lua gira ao mesmo tempo que descreve a sua órbita, o dia lunar dura 29 dias e meio Terra. Por isso, na Lua, observamos o nascer e o pôr-do-sol num período de 14 dias", explica Francisco Diego.
"Definir esse tempo também será importante, e será feito de acordo com a altura do sol acima do horizonte", acrescenta este astrónomo.
E a questão não se coloca apenas em definir a duração dos dias. Os relógios são outro desafio.
De acordo com a Agência Espacial Europeia, os relógios andam mais rápido na Lua: ganham cerca de 56 microssegundos ou milionésimos de segundo por dia. Isso acontece porque correm mais devagar em campos gravitacionais mais fortes, como o da Terra.
Como é que o tempo pode ser medido na Lua?
A Agência Espacial Europeia está a propor um acordo internacional sobre um quadro de referência “semelhante ao papel desempenhado na Terra pelo Quadro de Referência Terrestre Internacional, que permite a medição consistente de distâncias precisas entre pontos em todo o nosso planeta.”
Francisco Diego acredita que se deve seguir um tipo de medição semelhante à dos meridianos ou fuso horários da Terra.
“Teria de se basear no meridiano central da Lua, que penso ser a latitude zero, que é a latitude que corresponde à linha vertical que aparece quando a Lua está em fase de quarto minguante ou crescente”, explicou o astrónomo. "A partir daí o fuso horário seria medido em graus, mas com base na altitude do Sol, para que as pessoas pudessem descobrir qual é a hora solar naquele momento," explica.
Que horas são na Estação Espacial Internacional?
Quem já sabe o que é ter de olhar para o relógio e calcular e organizar o tempo no Espaço são os astronautas da Estação Espacial Internacional.
No entanto, apesar de estarem em órbita 354 quilómetros acima da superfície da Terra, seguem um fuso horário terrestre, nomeadamente o Tempo Universal Coordenado (UTC) ou o Meridiano de Greenwich, a meio caminho entre Houston e Moscovo.
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Isso tem desvantagens. "A Estação Espacial Internacional tem um dia de 90 minutos", ressalta Diego. "Eles veem o nascer e o pôr-do-sol 16 vezes por dia, durante 24 horas."
Mas, até ao momento, é a medida mais prática encontrada para manter as comunicações com a Terra.
Quem vai decidir o tempo lunar?
Em 1884, por insistência dos EUA, realizou-se uma conferência internacional em Washington DC, para discutir e decidir "um meridiano como o zero comum de longitude e padrão de contagem do tempo em todo o globo."
O resultado foi o Meridiano de Greenwich, que passa no Real Observatório de Londres, no Reino Unido. Tornou-se o padrão internacional para zero graus de longitude.
A Agência Espacial Europeia também quer um acordo internacional para definir a forma como o tempo lunar é medido.
“São missões muito perigosas que exigem muita ajuda de todos os países e temos de ir como uma humanidade unificada, explorando o espaço com as mesmas regras”, diz Francisco Diego.
O astrónomo acredita que este tipo de acordo deve ser enquadrado no Tratado Espacial de 1967 assinado pelos Estados-membros da ONU. Inclui disposições sobre como se deve realizar a exploração da Lua.
Por que é que é urgente acertar a hora na Lua agora?
A Lua está mais uma vez no centro dos esforços de exploração espacial da Agência Espacial Europeia que planeia dezenas de missões na próxima década, incluindo a construção de bases na superfície lunar.
Há uma "necessidade de manter a comunicação entre a Lua e a Terra em todas essas missões […] Haverá uma necessidade de chegar a um acordo sobre o Tempo Médio de Greenwich", explica Diego.
"Mas, por outro lado, quando já tivermos muitas missões de vários países em órbita à volta da Lua, a comunicação com a Terra ficará em segundo plano e torna-se torna mais independente. É aí que o tempo lunar será muito importante."
“Depois de estabelecermos um sistema de tempo operacional para a Lua, podemos continuar a fazer o mesmo para outros destinos planetários”, afirmou a Agência Espacial Europeia.