"Faleceu aquele a que eu chamo o Rei dos Reis. Tudo é muito discutível, porque cada um tem a sua opinião, mas, felizmente, pertenci não só à geração dele, como de outras que vieram até hoje, e não consigo descortinar nenhum outro jogador que fosse capaz de fazer uma coisa que eu vi: que foi fazer tabela com o adversário", lembrou o antigo jogador do Benfica.
António Simões, que coincidiu enquanto futebolista quase a par de Pelé, sublinhou que o brasileiro é o único jogador a quem viu ao longo destes anos todos ‘usar’ um adversário para tabelar dentro do próprio jogo.
"Vi todos os outros grandes jogadores a fazerem o que o Pelé fez, o Pelé a fazer tudo o que os outros fizeram, mas não vi ninguém a fazer o que ele fez, fazer tabela com o adversário, a coisa mais estranha, até parece bizarra, mas só está ao alcance de quem é génio, de quem tem o dom, e ele teve, ele teve tudo", reafirmou.
Na memória de Simões, que fez quase toda a carreira no Benfica, com breve passagem pelo Estoril Praia e União de Tomar, está também a ligação de amizade que reforçou com Pelé, quando ambos jogaram nos Estados Unidos.
"Tornámo-nos amigos. Como bom homem, foi para mim um privilégio estar próximo dele durante muito tempo. Quando nos encontrámos nos Estados Unidos, fortalecemos imenso a amizade do convívio anterior e ele teve uma expressão muito bonita para comigo: meteu a mão por cima de mim e disse-me ‘baixinho você jogava bem’. Fiquei com esta frase gravada, dita por alguém que percebe o jogo, teve uma relação fantástica com o jogo e a quem o jogo adorava", lembrou.
A finalizar, o antigo ‘magriço’, nome dado aos jogadores da seleção portuguesa que obteve a melhor classificação na história dos Mundiais, com o terceiro lugar em 1966, Simões expressou sentimentos à família, mas também ao futebol, cada vez mais órfão de reis humildes, uma virtude que considera dos inteligentes.
"As minhas condolências à família e ao próprio futebol, porque se perdeu um rei, nós não podemos perder reis, tantos em tão pouco tempo. O futebol precisa deles, e precisa, sobretudo, de homens com esta arte e este talento. Que foram extremamente inteligentes porque foram humildes. A humildade só está ao alcance de quem tem inteligência e coragem para a assumir, e Pelé fez isso. Nunca mostrou aquilo que foi, a estrela com a sua obrigação moral e até cultural perante uma sociedade mundial que o reconheceu como o melhor", justificou
Pelé, que morreu hoje, aos 82 anos, estava internado desde o dia 29 de novembro no Hospital Albert Einstein para tratamento de quimioterapia para tumor de cólon e tratamento de infeção respiratória, e o seu estado de saúde agravou-se na última semana.
Foi o único futebolista três vezes campeão do mundo, em 1958, 1962 e 1970, assinou 77 golos nas 92 internacionalizações pela seleção brasileira, tendo vestido as camisolas de Santos e dos norte-americanos do Cosmos.
A antiga ‘estrela’ do futebol mundial foi ainda ministro do Desporto no governo de Fernando Henrique Cardoso, entre 1995 e 1998.